20/10/2016 14h40 - Atualizado em 20/10/2016 21h45

MPF denuncia 22 pessoas e quatro empresas por desastre em Mariana

Dentre as denúncias, 21 são por homicídio qualificado com dolo eventual.
Rompimento de barragem é o maior desastre ambiental da história do país.

Thaís PimentelDo G1 MG

O Ministério Público Federal em Minas Gerais denunciou 22 pessoas e as empresas Samarco, Vale, BHP Billiton e VogBR pelo rompimento da Barragem de Fundão, da Samarco, em Mariana, na Região Central do estado. Dentre as denúncias, 21 pessoas são acusadas de homicídio qualificado com dolo eventual - quando se assume o risco de matar. Os procuradores da República José Adércio Leite Sampaio, Eduardo Aguiar, Jorge Munhós e Eduardo Santos de Oliveira, apresentaram a conclusão das investigações nesta quinta-feira (20), em Belo Horizonte. (Veja parte da entrevista coletiva no fim desta reportagem)

A barragem se rompeu no dia 5 de novembro de 2015, destruindo o distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, e atingindo várias outras localidades. Os rejeitos também atingiram mais de 40 cidades do Leste de Minas Gerais e do Espírito Santo. O desastre ambiental, considerado o maior e sem precedentes no Brasil, deixou 19 mortos.

Das 22 pessoas denunciadas, apenas o engenheiro da VogBR Samuel Paes Loures não foi acusado de homicídio com dolo eventual. Ele vai responder, juntamente com a VogBR, pelo crime de apresentação de laudo ambiental falso. Os demais, além de homicídio, vão responder ainda por crimes de inundação, desabamento, lesão corporal e crimes ambientais. A Samarco, a Vale e a BHP Billiton são acusadas de nove crimes ambientais.

Segundo o MPF, os acusados podem ir a júri popular e, se condenados, terem penas de prisão de até 54 anos, além de pagamento de multa, de reparação dos danos ao meio ambiente e daqueles causados às vítimas.

Segundo o procurador da República Eduardo Santos de Oliveira, o homicídio é qualificado por motivo torpe, que foi a ganância da empresa, e por impossibilidade de defesa por parte das vítimas.

Veja a lista de denunciados, todos ligados à Samarco

- Ricardo Vescovi de Aragão, diretor-presidente licenciado
- Kléber Terra, diretor-geral de operações
- Germano Lopes, gerente-geral de projetos
- Wagner Milagres Alves, gerente de operações
- Daviely Ridrogues Silva, gerente de geotencia e hidrogeologia
- Stephen Michael Potter, integrante do Conselho de Administração por indicação da Vale
- Gerd Peter Poppinga, integrante do Conselho de Administração por indicação da Vale
- Pedro José Rodrigues, integrante do Conselho de Administração por indicação da Vale
- Hélio Cabral Moreira, integrante do Conselho de Administração por indicação da Vale
- José Carlos Martins, integrante do Conselho de Administração por indicação da Vale
- Paulo Roberto Bandeira, representante da Vale na Governança da Samarco
 - Luciano Torres Sequeira, representante da Vale na Governança da Samarco
- Maria Inês Gardonyi Carvalheiro, representante da Vale na Governança da Samarco
- James John Wilson, integrante do Conselho de Administração por indicação da BHP
- Antonio Ottaviano, integrante do Conselho de Administração por indicação da BHP
- Margaret MC Mahon Beck, integrante do Conselho de Administração por indicação da BHP
- Jeffery Mark Zweig, integrante do Conselho de Administração por indicação da BHP
- Marcus Philip Randolph, integrante do Conselho de Administração por indicação da BHP
 - Sérgio Consoli Fernandes, integrante do Conselho de Administração por indicação da BHP
- Guilherme Campos Ferreira, representante da BHP na Governança da Samarco
- André Ferreira Gavinho Cardoso, representante da BHP na Governança da Samarco
-  Samuel Santana Paes Loures, engenheiro sênior da Consultoria VogBR

Procurador da República em Minas Gerais José Adércio Leite Sampaio, em coletiva sobre a denúncia de 26 pessoas e empresas pelo desastre de Mariana (Foto: Reprodução/TV Globo)Procurador da República em Minas Gerais José Adércio Leite Sampaio (Foto: Reprodução/TV Globo)

O procurador da República José Adércio Leite Sampaio disse que o MPF pediu a reparação dos danos causados às vítimas. O valor será apurado durante a instrução processual, que deve ser feito pela Justiça.

"Havia sempre a busca pela exploração de mais minério, sempre em busca de aumentar os lucros e dividendos para a Samarco e suas detentoras", disse o procurador. "Houve um sequestro da segurança em busca do lucro", acrescentou.

 

De acordo com José Adércio, funcionários da Samarco notaram trincas no maciço da barragem de Fundão em 2014. Engenheiros disseram que eram sinais de pré-ruptura. Diante do cenário, segundo o procurador, a mineradora cumpriu parte das recomendações. "A empresa [Samarco] usava de 'esparadrapos estruturais' ao invés de dar respostas contundentes aos problemas da barragem", disse o procurador.

A análise feita por uma força-tarefa do MPF constatou problemas no maciço da barragem, vazamentos, problemas na quantidade de água na barragem e nos procedimentos adotados para que fossem feitos o alteamento e o recuo de Fundão. Um laudo feito por uma auditoria independente concordou com a conclusão do inquérito da Polícia Civil sobre a causa do rompimento da barragem, que foi a liquefação, quando há um acúmulo de água.

O procurador da República do Espírito Santo, Jorge Munhós, também participou da força-tarefa do MPF. Segundo ele, o órgão identificou um documento interno da Samarco de abril de 2015 que previa, em caso de rompimento da barragem, a possibilidade de provocar até 20 mortes, dano ambiental grave e paralisação das atividades da empresa por até dois anos.

Documento da Samarco apreendido previa de 2 a 20 mortes em caso de rompimento da barragem (Foto: Reprodução/ TV Globo)Documento da Samarco apreendido previa de 2 a 20 mortes em caso de rompimento da barragem (Foto: Reprodução/ TV Globo)

Os documentos apontavam risco de falha na implementação e na operação das barragens do Complexo Germano. Segundo Munhós, estes documentos já previam o rompimento por causa do recuo do eixo da ombreira esquerda que geraria a liquefação.

Segundo o MPF, o Conselho de Administração da Samarco e os comitês dos quais a Vale e a BHP participavam sabiam dos problemas apresentados na barragem e não se manifestaram para garantir segurança. Documentos comprovam que a situação de Fundão foi levada a reuniões do Conselho e dos comitês sem que nenhuma medida efetiva tivesse sido tomada.

A Vale, uma das donas da Samarco, repudiou "veementemente" a denúncia apresentada pelo MPF envolvendo a mineradora e seus executivos. A empresa disse que o órgão "desprezou" provas e depoimentos dados neste quase um ano de investigação que mostram que a Vale não tinha conhecimento dos problemas apresentado em Fundão.

A mineradora ainda afirmou que os executivos que participam do Conselho de Administração da Samarco jamais souberam de riscos de rompimento da barragem, sendo que a eles sempre foi assegurada segurança da estrutura.

A Vale afirmou que "adotará firmemente as medidas cabíveis perante o Poder Judiciário para comprovar sua inocência e de seus executivos e empregados e acredita, serenamente, que a verdade e a sensatez irão prevalecer, fazendo-se a devida justiça".

Por meio de nota, a Samarco refutou a denúncia dizendo que a “empresa não tinha qualquer conhecimento prévio de riscos à sua estrutura”. A mineradora disse ainda que a barragem era “regularmente fiscalizada, não só pelas autoridades como também por consultores internacionais independentes” e que a “segurança sempre foi uma prioridade” para a empresa (leia a íntegra da nota abaixo).

“A Samarco refuta  a denúncia do Ministério Público Federal, que desconsiderou as defesas e depoimentos apresentados ao longo das investigações iniciadas logo após o rompimento da barragem de Fundão e que comprovam que a empresa não tinha qualquer conhecimento prévio de riscos à sua estrutura.

A barragem de Fundão era regularmente fiscalizada, não só pelas autoridades como também por consultores internacionais independentes. Toda e qualquer medida sugerida e implantada no que diz respeito à gestão da estrutura seguia as melhores práticas de engenharia e segurança. A estabilidade da barragem de Fundão foi  atestada pela consultoria VOGBR.

Segurança sempre foi uma prioridade na estratégia de gestão da Samarco, que reitera que nunca houve redução de investimentos nesse tema por parte da empresa.”

Paulo Freitas Ribeiro, advogado de Ricardo Vescovi, informou em nota que "muito embora não tenha tido acesso aos termos completos da denúncia, a defesa tem absoluta certeza de que as acusações formuladas contra o ex-Presidente são improcedentes, o que, por certo, haverá de ser reconhecido pelo Poder Judiciário".

Por nota, a VogBR informou que não irá se pronunciar.

A mineradora BHP Billiton disse que aguarda ser notificada oficialmente. Em nota, ela informou ainda que "repudia veementemente as acusações contra a empresa e os indivíduos denunciados e irá apresentar sua defesa contra as denúncias oferecidas, prestando também todo o suporte na defesa dos indivíduos denunciados”.

Inquérito da Polícia Federal
Na conclusão do inquérito da Polícia Federal, em junho deste ano, oito pessoas e as empresas Samarco, Vale e VogBR foram indiciadas por crimes ambientais e danos contra o patrimônio histórico e cultural.

Foram indiciados: Ricardo Vescovi, diretor-presidente licenciado, Kléber Terra, diretor-geral de operações, Germano Lopes, gerente-geral de projetos, Wagner Alves, gerente de operações, Wanderson Silvério, coordenador técnico de planejamento e monitoramento e Daviely Rodrigues, gerente, todos da Samarco, Rodrigo de Melo, gerente das usinas do Complexo da Alegria, da Vale, e Samuel Paes Loures, engenheiro da VogBR.

Veja abaixo vídeo com parte da entrevista coletiva dos procuradores

 

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