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Fiscal da obra indicou empresa que combinou divisão de verba na Arena

Em e-mail, arquiteto Jorge Borja defendeu que Corinthians contratasse a Temon Instalações, cuja proposta era R$ 2 milhões mais cara do que a concorrente

Por São Paulo

 


O arquiteto Jorge Borja, contratado pelo Corinthians para fiscalizar a execução das obras da Arena, em Itaquera, indicou a contratação da Temon para a realização dos serviços de instalações hidráulica e elétrica no estádio. Havia uma empresa concorrente com uma proposta R$ 2.263.913,50 mais barata.

e-mail jorge borja arena corinthians (Foto: Reprodução)Em e-mail, arquiteto Jorge Borja indica ao ex-vice do Corinthians, Luis Paulo Rosenberg, contratação da empresa Temon
(Foto: Reprodução)

Embora fosse o fiscal do Corinthians, Borja também recebeu por serviços prestados à Odebrecht durante a obra, conforme revelou o GloboEsporte.com.

A sugestão foi feita num e-mail enviado ao então vice-presidente de marketing do Corinthians, Luis Paulo Rosenberg, em 7 de maio de 2012.

Uma semana depois, a Temon assinou com a Odebrecht um contrato de R$ 31,5 milhões, que posteriormente seria ampliado para R$ 36,6 milhões por meio de aditivo.

O contrato tinha uma cláusula que previa a divisão de eventuais recursos economizados durante a execução das obras na proporção de 55% para a Odebrecht e 45% para a Temon.

Docs-arena-corinthians_montagem-doc_02 (Foto: EDITORIA DE ARTE)Contrato entre Odebrecht e Temon prevê divisão dos ganhos. No canto direito, abaixo, a assinatura do arquiteto contratado pelo Corinthians para atuar como fiscal da obra (Foto: reprodução)

Tal relação contraria o contrato de construção do estádio, cujo primeiro aditivo, assinado em 2011, determinava que o dinheiro que sobrasse na contratação de itens específicos, deveria ser devolvido ao clube para ser reutilizado no pagamento de outros custos da obra.

Cyro de Albuquerque Miller, diretor operacional da Temon, afirmou que não houve sobras neste contrato – portanto não poderia haver divisão com a construtora – e que o relacionamento de sua empresa se dava apenas com a Odebrecht, não com o Corinthians.

– Esse e-mail eu até desconhecia. Jorge Borja é uma pessoa do mercado, a gente conhece, mas a relação era apenas com a Odebrecht. Não temos nenhum conhecimento do contrato entre Corinthians e a Odebrecht.

Em e-mail enviado à reportagem, o arquiteto Jorge Borja declarou que suas posições "são baseadas em critérios técnicos e comerciais". Ele afirma ainda que a cláusula que prevê a divisão de eventuais recursos economizados na obra é "prática usual no mercado". 

O diretor de contrato da Odebrecht, Ricardo Corrégio, diz que o Corinthians tinha conhecimento de tudo. E afirma que a cláusula de divisão do dinheiro economizado só estava presente em dois dos "mais de 350" contratos da obra.

– São mais de 350 contratos, e nesses dois especificamente ficou essa cláusula porque o Corinthians queria. Tanto tinha conhecimento, que as ordens de serviço têm a assinatura do preposto do clube. Ou seja, todo processo de cotação, de equalização de preço, até determinar quem seriam os fornecedores, todo esse processo foi feito a quatro mãos entre Corinthians e Odebrecht – declarou.

O preposto do clube, no caso, é Jorge Borja. O Corinthians contesta a versão da empreiteira e do arquiteto que o próprio clube havia contratado para atuar na obra.

Ex-vice-presidente do Corinthians na época e diretamente envolvido com a construção do estádio, Rosenberg afirmou que "dirigentes do clube na época não foram informados de que a verba de reengenharia seria dividida entre a Odebrecht e as subcontratadas". O dirigente disse ainda que Jorge Borja não consultou a direção do Corinthians ao autorizar a partilha de eventuais verbas.

O atual presidente do Corinthians, Roberto de Andrade, enviou uma nota na qual afirma que os fatos "são graves".

– O fato de um fiscal contratado pelo clube concordar com algo tão absurdo afasta exatamente o objetivo principal do seu trabalho, ou seja, fazer com que a construção da Arena fosse de acordo com o contratado e os princípios de boa-fé.

A construção da Arena Corinthians é alvo de uma disputa entre o clube e a Odebrecht. Inicialmente orçado em R$ 820 milhões, o estádio custou mais de R$ 1,2 bilhão. O Corinthians contratou uma auditoria para analisar as contas da obra. O ex-presidente do clube e deputado federal Andrés Sanchez (PT-SP) é investigado pela Lava Jato.

Arena Corinthians Atlético (Foto: Marcos Ribolli)Arena Corinthians tem sido ponto de discórdia entre o clube e a Odebrecht (Foto: Marcos Ribolli)



Conheça detalhes do caso

A concorrência para contratação de Instalações Elétricas e Hidráulicas teve inicialmente 11 empresas participantes, e terminou com duas: Cegelec e Temon, cuja proposta, segundo Borja, era R$ 2,263 milhões mais alta que a da concorrente. 

No e-mail enviado a Rosenberg, a que o GloboEsporte.com teve acesso, o arquiteto escreve que as duas finalistas têm "qualidade técnica, preços competitivos e histórico para uma empreitada do porto da nossa obra".

Para reforçar sua preferência pela Temon, Borja argumenta na mensagem que seria possível conseguir "uma redução nos valores finais". Ocorreu o oposto: o serviço ficaria pelo menos R$ 5 milhões mais caro, por meio de aditivos.

– A gente executou a obra. Fomos contratados por um projeto inicial, que ao longo do tempo, vai tendo modificações. E aí faz comparação entre o inicial e o de fato executado. No final gerou essa diferença de R$ 5 milhões – explicou Miller, diretor da Temon.

Na mensagem, Borja ainda escreve:

– E principalmente ser uma empresa que, por já ter participado de outras obras com o Frederico (Gerente de Produção) e comigo, o representante do Corinthians, tendo tido sempre uma atitude de proatividade, rapidez e decisão nas horas necessárias, nos traz mais confiabilidade em possíveis negociações e solicitações que devemos ter no desenvolvimento dos serviços.

O Frederico citado por Borja é Frederico Barbosa, gerente de produção da Odebrecht, engenheiro que atuou na reforma do sítio em Atibaia frequentado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, alvo da Operação Lava Jato.