Em vários lugares do Brasil, há agricultores que passaram quase uma vida inteira sem energia em casa. No município de Paulistana, no Piauí, algumas pessoas ainda continuam nessa situação. A luz faz diferença na vida do campo tanto de dia quanto de noite.
Na noite, o candeiro é a iluminação que acompanha os agricultores Apolônio Abel de Alencar, de 75 anos, e Perpétua Francisca de Alencar, de 68 anos, até a hora de dormir. A cena se repete nas 745 famílias de Paulistana que não têm energia. A vida do casal sempre dependeu das lamparinas para romper a escuridão.
Mas a noite é bem mais agitada na casa que conta com energia elétrica, onde moram os agricultores João de Sousa e Osvaldiria Ana de Sousa; o filho do casal, Ariel João de Sousa, a esposa, Valdire Zilme Rodrigues Souza, e a pequena Thauany. “A energia foi ligada dia 17 de março de 2007. É tão importante que a gente nem esquece essa data”, diz Ariel Sousa.
Para quem criou os filhos na base da lamparina, Osvaldiria deseja que todo mundo tenha energia. “Ter essa luz, que é muito importante”, diz.
Desde quando o Programa Luz para Todos foi criado, há 13 anos, Paulistana sempre figurou entre os locais a serem beneficiados com energia elétrica. Em 2010, o município até chegou a ser declarado como 100% eletrificado. Mas, não estava. As constantes promessas de que a luz chegaria ao lugar geraram tamanha expectativa que os agricultores se anteciparam para correr atrás do que para eles seria um sonho.
Eles conseguiram R$ 94 mil para dar início a dois projetos na comunidade: um de plantio de palma irrigada, junto com um aprisco para transferência de tecnologia de caprinos e ovinos; e outro que equipou a cooperativa de mel com a centrífuga, o compressor e a máquina de embalar sachê. Os recursos vieram da Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco – Codevasf, que liberou a verba mesmo sem a instalação da energia elétrica.
“Foi um prazer receber os equipamentos todos, mas é uma frustração a gente não poder usar. Nossa perspectiva, quando começamos a trabalhar em parceria com a Codevasf, é que iria abrir caminho para a chegada da energia por conta de ser uma instituição que vem recursos do Ministério da Integração Nacional, direto do governo federal. Mas, até o momento não chegou”, diz o presidente do Conselho de Desenvolvimento Rural Sustentável de Paulistana, Osvaldo Mamédio.
Em nota, a Codevasf se defende dizendo que os equipamentos para a manipulação do mel deveriam funcionar com energia solar. Mas, segundo os agricultores, as instalações da cooperativa só dão conta de acender as lâmpadas. Sobre a unidade de transferência de tecnologia, a companhia viabilizou uma forrageira à combustão. Só que os produtores afirmam que, diante dessa seca e sem a irrigação prometida, falta comida para fazer a máquina funcionar.
A apicultura é uma das principais atividades rurais de Paulistana. O município chegou a coletar 28,5 toneladas de mel no ano passado, mas a seca tem feito despencar a produção. O apicultor Osvaldo Antônio de Carvalho só atingiu metade do que esperava para 2016. “Todo mundo perdeu. As abelhas não se dão com muito calor”, diz.
A falta de chuva regular na região já se acumula pelo quarto ano seguido. O pé de umbu protege as caixas do apicultor. Até a árvore, um dos símbolos de resistência à seca, parece agonizar com a falta de água. As abelhas abandonaram 23 das 49 caixas. “Em uma das caixas, elas estão tão fracas que nem colou a cera. Todas com fome. Comeram o próprio mel que fizeram”, lamenta.
A mesma seca atinge a propriedade do agricultor Manoel Vila Nova, mas de uma maneira diferente. A luz que ilumina a noite e que dá conforto dentro de casa também transforma a dura realidade no campo. A energia que puxa a água do poço garante a sobrevivência da lavoura. “Vamos dizer que a manchinha verde é o socorro da seca. Essa palma mantém os meus bichos e o reforço pra renda familiar”, diz.
Fora a palma, a irrigação carregou o pé de manga, fez a cana produzir e garantiu a produção do capim elefante. Além de levar a água, a rede de energia também permite o uso da forrageira que tritura o alimento dos animais.
O plantio da palma irrigada veio da ideia do agrônomo Éder Jofry, formado no início de novembro. Ainda em 2015, ele iniciou o projeto como parte do trabalho de conclusão de curso. Jofry fez os cálculos e o investimento de R$ 4,5 mil usados na plantação era praticamente o que o agricultor gastava por ano para comprar a ração dos animais no período da seca.
“Eu fico muito satisfeito porque é minha região. Estou fazendo o que eu gosto. E o que dá prazer é ver o produtor satisfeito. A grande importância da palma é porque ela se torna uma reserva hídrica para os animais. Em torno de 85% a 90% da composição da palma é de água. Tendo água no corpo ele vai ter disposição, ele vai ter interesse de procurar outra forragem, seja um capim, seja uma vegetação nativa”, explica Jofry.
A palma também contém carboidrato, fibra e algumas vitaminas e minerais. Cada vez que a irrigação é ligada, o agricultor gasta em torno de 1,5 mil litros de água.
O Programa Luz para Todos beneficiou mais de 3,3 milhões famílias. Nos próximos dois anos, a promessa é iluminar mais 190 mil casas, principalmente nas regiões mais distantes da Amazônia e do Nordeste.
Com relação ao município de Paulistana, o Ministério de Minas e Energia afirmou que ainda irá lançar uma nova licitação para atender as pessoas que não têm luz.