Política

Universidade do PR desviou R$ 7,5 milhões em bolsas para pessoas que não estudavam na instituição

Esquema beneficiou 27 pessoas; duas funcionárias da universidade foram presas
Coletiva para Imprensa na Superintendência da Policia Federal, em Curitiba (PR), nesta quarta-feira (15), sobre a operação que prendeu 27 pessoas em ação contra desvio de recursos públicos na UFPR Foto: Parceiro / Agência O Globo
Coletiva para Imprensa na Superintendência da Policia Federal, em Curitiba (PR), nesta quarta-feira (15), sobre a operação que prendeu 27 pessoas em ação contra desvio de recursos públicos na UFPR Foto: Parceiro / Agência O Globo

SÃO PAULO - As fraudes investigadas pela Operação Research , deflagrada nesta quarta-feira, chegaram a R$ 7,5 milhões nos cofres da Universidade Federal do Paraná (UFPR), segundo a Polícia Federal. Entre 2013 e 2016, o esquema pagou bolsas irregulares a um grupo de 27 pessoas - entre eles cabeleireiros, taxistas, donos de salão de beleza - sem qualquer vínculo com a universidade. Algumas delas não tinham sequer ensino superior.

A Polícia Federal cumpre nesta quarta-feira 29 mandados de prisão numa ação que apura prática de desvio de recursos públicos destinados à Universidade Federal do Paraná (UFPR). Batizada de
A Polícia Federal cumpre nesta quarta-feira 29 mandados de prisão numa ação que apura prática de desvio de recursos públicos destinados à Universidade Federal do Paraná (UFPR). Batizada de "Research", a ação tem como objetivo apurar repasse irregular de recursos a pessoas sem vínculos com a instituição no período entre 2013 e 2016.

Os 27 beneficiários e duas servidoras da universidade, que faziam parte do esquema, tiveram a prisão temporária decretada pelo juiz Marcos Josegrei da Silva, da 14ª Vara Federal de Curitiba.

Em entrevista coletiva, o delegado da Polícia Federal Felipe Hayashi classificou o esquema como “fraude grosseira”. Ele disse que nenhum dos 27 beneficiários irregulares estava envolvido com ensino ou pesquisa na universidade. Entre eles, havia inclusive inscritos em programas sociais do governo, como o Bolsa Família. Um cozinheiro de uma pizzaria, por exemplo, recebeu entre 2013 e 2016 R$ 318 mil. No mesmo período, um assistente administrativo, com aposentadoria por invalidez, recebeu R$ 739 mil.

Conceição Abadia de Abreu Mendonça e Tânia Marcia Catapan, chefe da Seção de Controle e Execução orçamentária, e chefe da Secretaria Administrativa do Gabinete da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da universidade, respectivamente, beneficiavam pessoas que tinham grau de parentesco ou faziam parte de seu círculo de amigos, segundo as investigações. Além de presas, elas tiveram suas atividades suspensas.

“ A partir dos elementos existentes até agora nos autos, Conceição e Tânia atuam de forma forma coordenada e estão associadas aos beneficiários diretos dos pagamentos indevidos para o desvio e apropriação de verbas públicas destinadas à educação”, diz o despacho do juiz.

Ao detalhar a operação, Hayashi disse ainda que surpreende o fato de a universidade não ter detectado as fraudes e apontou problemas no controle interno da instituição.

- Essas fraudes nos surpreenderam porque poderiam, em algum momento, ser detectadas dentro da universidade caso houvesse procedimento interno efetivo no sentido de prevenir ilícitos dentro da instituição pública - declarou.

Questionado sobre a possibilidade de haver pessoas da reitoria envolvidas no esquema, o delegado disse que nenhuma hipótese pode ser descartada, embora ainda seja prematuro falar sobre uma eventual implicação direta.

- Precisamos apurar para descobrir se essas pessoas agiram, se tomaram alguma providência, prevenção sobre algum tipo de negligência que permitiu esse desvio milionário. Não podemos descartar nenhuma hipótese, embora ainda seja precoce falarmos em um eventual envolvimento direto. No entanto, há a possibilidade de responsabilização criminal por omissão nessa situação em que o gestor poderia e deveria agir - explicou.

No despacho que autorizou a ação, o magistrado diz que caberia ao reitor da universidade evitar que as bolsas irregulares fossem concedidas.

“Segundo entendimento da Autoridade Policial, secundado pelo MPF e agora reconhecido como válido por este Juízo, também teriam responsabilidade na fiscalização da concessão das bolsas que resultaram nos pagamentos indevidos Luciane Mialik Wagnitz Linczuk (enquanto chefe de auditoria) e Zaki Akel Sobrinho (Reitor da UFPR). Esses detinham a posição de garantes no sentido de que lhes incumbia evitar o resultado criminoso”, afirmou Josegrei.

Ao todo, foram expedidos 73 mandados judiciais: além dos 29 de prisão, a PF em conjunto com a Controladoria Geral da União e o Tribunal de Contas da União, cumpre oito conduções coercitivas e 36 mandados de busca e apreensão nos estados do Paraná, Mato Grosso do Sul e Rio.

OUTRO LADO

Até a publicação desta reportagem, a defesa dos investigados não havia sido constituída no processo. Em nota, a Universidade Federal do Paraná informou que as suspeitas de irregularidades nos pagamentos de bolsas e auxílios são objeto de investigações internas desde dezembro do ano passado, “quando a própria universidade tomou a iniciativa de encaminhar o caso à Polícia Federal para investigação criminal”. Veja abaixo a nota na íntegra:

Diante da operação deflagrada nesta quarta-feira pela Polícia Federal, a Universidade Federal do Paraná informa:

1.As suspeitas de irregularidades no pagamento de bolsas e auxílios são objeto de investigações internas na UFPR desde dezembro de 2016, quando a própria universidade também tomou a iniciativa de encaminhar o caso à Polícia Federal, para investigação criminal.

2. Assim que tomou conhecimento da suspeita de desvios de verba pública, em dezembro de 2016, a administração anterior da Reitoria determinou a abertura de sindicância para apurar responsabilidades. O procedimento é conduzido por uma comissão formada por dois professores e uma servidora técnico-administrativa e, por força de lei, corre em sigilo. O prazo para conclusão do trabalho é de 60 dias, prorrogáveis por mais 60. A previsão de término dos trabalhos é meados de abril de 2017.

3. As duas servidoras suspeitas de envolvimento no caso já estavam suspensas do exercício de suas atividades funcionais, nos termos da Lei 8112/90, por determinação do atual reitor, Ricardo Marcelo Fonseca.

4. O reitor Ricardo Marcelo Fonseca também já havia determinado, ainda em janeiro, a criação do Comitê de Governança de Bolsas e Auxílios, visando aperfeiçoar os mecanismos de controle sobre esse tipo de pagamento. Também está criada, por meio de portaria, uma comissão para trabalhar no Plano de Transparência e de Dados Abertos da Universidade, instrumento para garantir que a sociedade tenha acesso a todas as informações de caráter público.

5.A Universidade Federal do Paraná tomou todas as providências cabíveis para esclarecer os fatos e responsabilizar os eventuais envolvidos. Com o resultado da investigação, a UFPR solicitará a restituição dos valores ao erário.

6. A gestão do reitor Ricardo Marcelo Fonseca reafirma seu compromisso com a transparência e a ética. Reforça ainda que condena veementemente qualquer prática ilícita e que continuará colaborando com as investigações, tanto no âmbito do Tribunal de Contas da União quanto da Polícia Federal.