• Samy Dana
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Não há no mundo quem se case já imaginando o dia de assinar a papelada do divórcio. Assim como poderia parecer estranho fazer planos para os próximos 20 anos incluindo uma doença grave no percurso. Do mesmo modo, ninguém abre uma empresa pensando no dia da falência. Tudo isso parece bem óbvio e até soa positivo, afinal, que mal há em ser otimista? Não enxergar o tamanho do poço, esse é o grande risco.

O intuito aqui não é ensinar que o caminho do pessimismo é mais seguro, mas lembrar que certa cautela com a postura otimista pode evitar prejuízos. É o que defende Tali Sharot, neurocientista cognitiva da University College London e pesquisadora do “viés de otimismo”. De um modo sucinto, o conceito diz respeito à tendência que temos de superestimar eventos positivos que vamos experimentar – e subestimar as situações negativas. O viés otimista explica, por exemplo, por que em um dos experimentos de Tali pessoas recém-casadas acreditavam que a chance de divórcio seria praticamente zero, mesmo diante do dado de que no mundo ocidental dois em cada cinco casais se divorciam. Mais: pessoas que passaram pela experiência do divórcio e casaram novamente continuavam com a mesma perspectiva otimista do início do primeiro casamento. 

No Brasil, esse viés está em alta. O último levantamento global feito pela consultoria Gallup – com 138 países – apontou que o Brasil lidera o ranking de otimismo em relação ao futuro. Em uma escala de 0 a 10, teve pontuação de 8,8. A despeito de crises econômicas e políticas, nossa confiança no futuro é grande. No entanto, vale ressaltar outro ponto: somos positivos em relação a nós mesmos, mas pessimistas quanto ao que nos cerca. Você crê que a falência do vizinho era fácil de prever, por exemplo, mas não imagina que o mesmo possa acontecer com o seu caixa. 

O economista Marcelo Neri, ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), reforça essa tese. Ele mostra que o brasileiro tende a ser otimista em relação ao futuro individual, ao passo que se mostra pessimista quanto aos rumos da nação – resultado apontado em seu estudo O futuro social do Brasil: imaginado pelos brasileiros. A consequência direta deste comportamento, segundo ele, é a baixa taxa de poupança. A confiança em seu futuro faz com que o brasileiro não se prepare para o amanhã.

Partindo desse princípio, o excesso de otimismo precisa ser ponderado, por exemplo, na hora de planejar um empreendimento. Sabemos o quanto uma ideia criativa é sedutora, sobretudo se vier acompanhada de dados estatísticos que reforcem aquilo que acreditamos. Se você, por exemplo, encontra nos jornais a notícia sobre um expressivo aumento de abertura de startups, a informação pode te incentivar ainda mais a investir em sua ideia. Mas é o suficiente? Não seria mais prudente buscar estatísticas sobre a taxa de sobrevivência dessas startups?

Sabemos que o otimismo tem efeitos benéficos, especialmente em termos de motivação. Sem as perspectivas de resultados positivos, não temos motivo para agir. E basta observar a economia: quando o pessimismo contamina o mercado, a circulação de dinheiro diminui e tudo caminha para trás. Sendo assim, o melhor conselho é sonhar com os pés no chão. Moldar o futuro com base no que há de sólido neste momento, em vez de se amparar tão somente em expectativas.

Samy Dana é economista, doutor em administração e Ph.D. em Negócios. Professor na Eaesp/FGV, autor de livros e consultor, é também comentarista dos programas Conta Corrente, da Globo News, e Hora 1, na Globo. É colunista da Rádio Globo e do G1