Política

José Serra pede exoneração do Ministério das Relações Exteriores

Político apresentou laudo de problema na coluna ao presidente Temer

José Serra, ainda como ministro das Relações Exteriores, José Serra, durante evento na CNI em novembro Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo/09-11-2016
José Serra, ainda como ministro das Relações Exteriores, José Serra, durante evento na CNI em novembro Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo/09-11-2016

BRASÍLIA — O senador José Serra (PSDB-SP) pediu demissão do cargo de Ministro das Relações Exteriores na noite desta quarta-feira. Em uma conversa pessoal com o presidente Michel Temer, no Palácio do Planalto, o tucano explicou que precisará passar por um tratamento de saúde de pelo menos quatro meses, período no qual não poderia fazer as viagens internacionais que fazem parte do dia a dia do posto de chanceler. Durante o encontro, Serra também entregou uma carta na qual detalha a situação.

O ministro Antonio Imbassahy, da Secretaria de Governo, contou ao GLOBO que esteve com os dois no Planalto, instantes depois do pedido de demissão. Imbassahy disse que Serra levou um laudo da coluna para mostrar ao presidente. O ministro contou ainda que ouviu de Serra que ele já voltará nesta quinta-feira ao Senado e que a última viagem que fez para a Alemanha foi "um sofrimento"

— Não dá para insistir para ele ficar, ele levou um laudo e há uma recomendação médica muito forte para que ele evite esse tipo de deslocamento. A viagem que ele fez agora para a Alemanha foi um sofrimento. Serra preza muito pelo cargo, mas ele não tem mais condições de viajar — disse Imbassahy.

TEMER INSISTIU PARA PERMANÊNCIA

Segundo auxiliares do presidente, durante o encontro, Temer insistiu para que o chanceler permanecesse no posto, mas ele declinou. Em dezembro, Serra foi submetido a uma cirurgia na coluna vertebral, no Hospital Sírio-Libanês, e a recuperação vem sendo dolorosa. Na carta, ele justifica o pedido de demissão.

“Faço-o com tristeza, mas em razão de problemas de saúde que são de conhecimento de Vossa Excelência, os quais me impedem de manter o ritmo de viagens internacionais inerentes à função de Chanceler. Isto sem mencionar as dificuldades para o trabalho do dia a dia. Segundo os médicos, o tempo para restabelecimento adequado é de pelo menos quatro meses”, explicou.

Ainda na carta, Serra agradeceu a Temer e pelo apoio e prometeu ajudá-lo no Congresso:

“Para mim foi motivo de orgulho integrar sua equipe. No Congresso, honrarei meu mandato de senador trabalhando pela aprovação de projetos que visem à recuperação da economia, ao desenvolvimento social e à consolidação democrática do Brasil”, disse.

TUCANOS COTADOS PARA VAGA

A saída dele do Itamaraty deixa vagas agora duas das principais pastas do governo Michel Temer — uma vez que o presidente já vinha enfrentando dificuldades para preencher o comando do Ministério da Justiça — e, na avaliação de parlamentares, pode levar o presidente a fazer um rearranjo na Esplanada.

No PSDB, os dois principais nomes para o cargo, tidos como de perfil semelhante ao de Serra e que podem ocupar a vaga são os dos senadores Aloysio Nunes Ferreira (SP) e Tasso Jereissati (CE). Apesar disso, os tucanos admitem que, diante do apetite do PMDB por mais espaço no governo, Temer pode usar a circunstância para alterar os espaços dos partidos. Ministros do PSDB acreditam, no entanto, que a legenda de Temer não tem quadros que preencheriam o perfil desejado para a chancelaria.

— Se houver decisão do presidente do PSDB de manter o mesmo tamanho do partido no governo, tem todo o desenho favorável para assumir o Aloysio ou o Tasso, sem dúvidas os nomes com mais perfil para substituir Serra. Pode ser que o PMDB queira reivindicar, mas eles não têm perfil para o Itamaraty — disse um ministro tucano.

Além de Aloysio e Tasso, as especulações incluem o senador José Aníbal (PSDB-SP), hoje suplente de Serra no Senado, e do secretário-geral do Itamaraty, Marcos Galvão. Galvão é bastante ligado ao senador Aécio Neves, presidente nacional do PSDB, e visto no Itamaraty como um bom nome para a função.

Em nota, o líder do PSDB no Senado, Paulo Bauer (SC), disse na noite desta quarta que a decisão de Serra pegou a todos de surpresa. Ele elogiou o trabalho do ex-ministro à frente do Itamaraty e disse que, sob a batuta de Serra, "a diplomacia brasileira recuperou seu protagonismo". Bauer afirmou ainda que espera que o ex-ministro se recupere prontamente do problema de saúde.

"A decisão do Senador José Serra de deixar o comando do Itamaraty surpreendeu a todos. Serra vinha realizando um trabalho exemplar e à frente do Ministério das Relações Exteriores. Com ele, a diplomacia brasileira recuperou seu protagonismo e fortaleceu a participação do Brasil no comércio exterior e nas relações diplomáticas", escreveu o líder tucano.

"As razões expostas pelo agora ex-ministro são suficientes para justificar a tomada da decisão. Certamente o Presidente Michel Temer escolherá um substituto à altura de José Serra para continuar seu trabalho, vital para o Estado brasileiro. Os tucanos de todo Brasil ao tempo que aplaudem José Serra pelo trabalho realizado se solidarizam com ele desejando que recupere totalmente a saúde para, como Senador da República, continuar contribuindo na construção do Brasil que desejamos maior e melhor, para todos", disse Bauer.

SENADOR SE QUEIXOU DE ROTINA DESGASTANTE

Há cerca de dois meses, Serra, que tem 74 anos, já havia confidenciado a amigos que vinha se sentindo cansado para o dia-a-dia desgastante do ministério. Segundo um deles, o então chanceler chegou a dizer que, no entanto, temia que um eventual pedido de demissão fosse interpretado como uma reação de temor em relação à Operação Lava-jato. Desde a cirurgia na coluna, no fim de dezembro, Serra realizou apenas uma viagem ao exterior, semana passada, para a Alemanha.

Há duas semanas, ao encontrar com outro amigo, Serra relatou que a recuperação de sua cirurgia estava ruim, que vinha sentindo muitas dores, e que estava com muita dificuldade de viajar. O próprio presidente Michel Temer vinha sendo informado sobre o quadro de saúde. Nesta quarta-feira, no entanto, Serra ligou cedo para o presidente e pediu uma audiência. O presidente, notando o objetivo do encontro, tentou adiar. Mas Serra preparou a carta de demissão e acabou sendo recebido pessoalmente.

— Não adianta, não é só um problema físico. Ele não estava feliz, ela uma reclamação aqui, outra acolá — conta este político amigo.

Ex-prefeito e ex-governador de São Paulo, Serra chegou ao Itamaraty após uma aproximação intensa com o PMDB desde sua eleição para o Senado, em 2014. Quando o impeachment ainda se delineava no horizonte, o senador tornou-se um interlocutor privilegiado de Michel Temer e frequentemente dava sugestões para a economia, no que era visto como uma tentativa de integrar a futura equipe do governo para a área. No entanto, ao ficar claro que seria preterido para a Fazenda e o Planejamento, sinalizou seu interesse nas Relações Exteriores.

Carta com pedido de exoneração entregue de José Serra a Michel Temer Foto: Reprodução
Carta com pedido de exoneração entregue de José Serra a Michel Temer Foto: Reprodução

A ÍNTEGRA DA CARTA

"Senhor presidente

Pelo presente, venho solicitar minha exoneração do cargo de Ministro de Estado de Relações Exteriores.

Faço-o com tristeza, mas em razão de problemas de saúde que são de conhecimento de Vossa Excelência, os quais me impedem de manter o ritmo de viagens internacionais inerentes à função de Chanceler. Isto sem mencionar as dificuldades para o trabalho do  dia a dia. Segundo os médicos, o tempo para restabelecimento adequado é de pelo menos quatro meses.

Para mim foi motivo  de orgulho integrar sua equipe. No Congresso, honrarei meu mandato de senador trabalhando pela aprovação de projetos que visem á recuperação da economia, ao desenvolvimento social e à consolidação democrática do Brasil.

Respeitosamente,

José Serra"