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Brasil lamenta pior resultado recente na Olimpíada de Matemática

País caiu em colocação, mas medalhistas comemoram desempenho individual; Filho de Bashar al-Assad, que integrava a delegação da Síria, recusou-se a dar entrevistas
O mineiro João César Campos Vargas recebeu uma medalha de prata e foi o brasileiro com a melhor colocação individual no evento: 82ª posição entre 623 participantes Foto: Clarissa Pains
O mineiro João César Campos Vargas recebeu uma medalha de prata e foi o brasileiro com a melhor colocação individual no evento: 82ª posição entre 623 participantes Foto: Clarissa Pains

RIO — A primeira Olimpíada Internacional de Matemática (IMO, na sigla em inglês) sediada no Brasil terminou neste sábado com a consagração da Coreia do Sul como campeã. China e Vietnã, respectivamente, completaram o pódio, enquanto a equipe brasileira ficou em 37º lugar — o pior

resultado da última década. Em 2016, o Brasil teve seu melhor desempenho desde que começou a participar da IMO, em 1979: conquistou a 15ª colocação, à frente de países como Alemanha, França e Austrália. Agora, embora a colocação tenha caído consideravelmente, o Brasil se manteve em melhor posição do que nações desenvolvidas como a França, que acabou em 39º lugar, e a Suécia, em 51º.

A premiação na cerimônia de encerramento, realizada em um hotel da Barra da Tijuca, foi marcada por músicas brasileiras, como “Mais que nada”, tocada em instrumental enquanto as medalhas de bronze eram entregues, e “País tropical”, de Jorge Ben Jor.

A Olimpíada Internacional de Matemática é a mais antiga e prestigiada competição científica no nível do ensino médio, realizada desde a década de 1950. Participaram da atual edição 623 estudantes vindos de 112 países.

Os seis integrantes do time brasileiro, selecionados pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa) e pela Sociedade Brasileira de Matemática (SBM), conquistaram duas medalhas de prata, uma de bronze e três menções honrosas.

Os representantes dos EUA, que foram os campeões na última edição e estavam entre os favoritos, ficaram em quarto. Já a delegação da Síria, que chamou atenção por ter entre seus integrantes o filho do presidente Bashar al-Assad , ficou na 56ª colocação. A delegação da Coreia do Sul, no topo do ranking, abocanhou seis medalhas, todas de ouro. Os chineses ganharam cinco de ouro e uma de prata, e o Vietnã conseguiu quatro de ouro, uma de prata e uma de bronze.

Na classificação individual, três jovens ficaram empatados em primeiro lugar: Amirmojtaba Sabour (Irã), Yuta Takaya (Japão), Huu Quôc Huy Hoàng (Vietnã). No entanto, não houve sequer um “ouro perfeito”, quando um participante gabarita a prova. Somente dois estudantes conseguiram solucionar o terceiro dos seis problemas desta edição, tamanha a dificuldade.

A cerimônia de encerramento da IMO 2017 terminou com uma apresentação de samba, com passistas sambando ao lado do mascote do evento, a arara azul batizada de Aramat Foto: Agência O Globo
A cerimônia de encerramento da IMO 2017 terminou com uma apresentação de samba, com passistas sambando ao lado do mascote do evento, a arara azul batizada de Aramat Foto: Agência O Globo

O brasileiro com o melhor desempenho foi João César Campos Vargas, que ganhou uma medalha de prata e ficou na 82ª colocação. Já Hafez al-Assad, filho do ditador sírio, ficou em 528º lugar, com uma menção honrosa. Na premiação, ele tentou sambar e até improvisou um trenzinho com os amigos, mas se recusou a dar entrevista, alegando que não é mais "representante do time".

— A prova foi extremamente difícil. E não valorizou geometria, uma área em que nosso time é forte — destacou o mineiro João César, que vai iniciar graduação em Matemática em Princeton, daqui a dois meses. — Acho que isso ajuda a explicar por que não nos saímos tão bem quanto esperávamos.

Os outros dois medalhistas brasileiros foram Davi Cavalcanti Sena, que ganhou prata, e George Lucas Alencar, com o bronze.

— Fiquei feliz com minha prata, porque as questões estavam tão difíceis que eu achava que só teria como conseguir menção honrosa. Mas o resultado do grupo é mais importante do que o individual, então ficamos frustrados — disse Davi.

Diretor adjunto do Impa, Claudio Landim creditou o resultado “decepcionante” do Brasil ao fato de a equipe “jogar em casa”:

— A pressão de jogar em casa provavelmente afetou. Nossa meta é ficar entre os 15 primeiros, e, nesse sentido, o resultado foi decepcionante. Mas nosso objetivo não é construir campeões na olimpíada, e sim formar matemáticos. Para resolver problemas de uma prova olímpica, é necessário macete e rapidez. Para ser um grande matemático, é preciso mais. Se dermos os problemas que esses rapazes tiveram que tentar solucionar nessa olimpíada a qualquer professor do Impa, nenhum conseguirá resolver, tenho certeza — compara Landim. — Não ir tão bem na IMO não significa falta de bons matemáticos.

Presidente da IMO e professor da Universidade de Bath, no Reino Unido, Geoff Smith não descartou que a prova desta edição tenha sido a mais difícil desde o início do evento, na década de 1950.

— Talvez isso seja verdade. Nas primeiras décadas, as questões não eram tão complicadas. Agora, a tendência é que fiquem cada vez mais difíceis — disse ele.

Dos jovens talentos brasileiros da matemática que já participaram da competição, um dos maiores destaques é Artur Ávila. Medalhista de ouro na IMO de 1995, Ávila foi o primeiro brasileiro a receber a Medalha Fields, considerada o “Nobel da matemática”, em 2014.

— É normal que os alunos tenham a mentalidade mais voltada para a competição, mas ela é só um passo, serve para atrair pessoas. O objetivo deve ser ganhar experiência, e não medalhas — comentou Ávila, que visitou o local da competição, na Barra, na sexta-feira. — O Brasil tem problemas gravíssimos para a difusão de um conhecimento minimamente qualificado na disciplina. Podemos falar de analfabetismo matemático entre pessoas que concluíram o ensino médio. Não aprenderam o básico. Por outro lado, temos instituições reconhecidas internacionalmente, como o Impa. Mas não conseguiremos resolver o problema da educação no país com poucas pessoas muito qualificadas. É mais complexo do que isso.

A próxima IMO, no ano que vem, será na Romênia.

( Colaborou Renato Grandelle )