Dirigente de Educação do Estado de SP mandou professores roçarem mato das escolas
Em reunião virtual com equipes pedagógicas, o dirigente regional de Ensino da Secretaria da Educação de São Paulo, João Bosco Arantes Braga Guimarães, sugeriu que os professores pegassem roçadeiras para capinar as escolas enquanto não começasse o ano letivo, para que os pais e responsáveis não reclamassem do "mato alto". Em nota, a pasta estadual afirmou que o dirigente se "expressou de maneira inadequada". Guimarães, por sua vez, diz que a fala foi no sentido figurado e foi retirada de contexto.
João Bosco Arantes Braga Guimarães é o dirigente regional responsável pelos municípios de Bertioga, Guarujá, Cubatão e Santos, na Baixada Santista. A declaração, que repercutiu negativamente entre os professores estaduais, por sugerir desvio de função, foi dada durante uma reunião remota sobre o planejamento escolar para 2021, realizada no último dia 21 de janeiro.
A transmissão foi compartilhada ao vivo nas redes sociais e ficou salva no perfil do Núcleo Pedagógico de Santos até esta sexta-feira (5). No entanto, foi removida do canal no início da noite, logo após o G1 entrar em contato com o dirigente para obter um posicionamento (leia mais abaixo).
Após 1h10 de reunião, o dirigente entra no assunto do retorno às aulas nas escolas estaduais da região, e afirma que os professores devem "roçar o mato".
“Pega lá uma roçadeira. Às vezes, foram três supervisoras na escola. Dá uma roçadeira para cada uma, e vamos roçar o mato [...]. Aí, os PCNPs [professores coordenadores de núcleo pedagógico] deram uma chegada na escola, dois ou três PCNPs, a roçadeira está lá, parada, já pega a roçadeira e vai lá limpar”, afirmou.
Dirigente regional de Ensino sugeriu que professores estaduais 'capinassem' antes de retorno às aulas — Foto: Reprodução
O dirigente encerra essa parte do discurso afirmando que as medidas deveriam ser tomadas para que os pais não reclamem. "O que nós não podemos ter é a população na televisão, ou dizendo para nós 'olha, vocês estão obrigando meu filho a ir para a escola, porém, a escola X está com mato alto'", disse.
Procurado pelo G1 para comentar o episódio, o professor Bruno Messias, que atua há quatro anos na rede estadual de ensino, avaliou que a fala traduz a concepção de que o professor só trabalha quando está dentro da sala de aula.
"Se não estiver dentro da sala de aula, o professor não está trabalhando, então, tem tempo para pegar uma roçadeira e carpir o roçado da escola, uma vez que a semana será, nas palavras do dirigente, 'apenas de planejamento'", disse o professor.
O Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), em nota enviada ao G1, afirma que o dirigente regional está propondo desvio de função. Levanta, ainda, a questão do tempo que a pasta teve para providenciar que as escolas estivessem em condições adequadas ao retorno dos alunos, "pois, em diversas ocasiões, a Seduc-SP fez investidas para o retorno presencial das aulas".
Além disso, a categoria afirma que as escolas receberam verba diretamente pelo Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), para que os serviços de capinagem fossem realizados, e diz que, caso o dirigente estivesse exemplificando projeto de trabalho, só teria cabimento caso estivesse diretamente direcionado aos alunos.
Secretaria da Educação
Procurada pelo G1, a Secretaria da Educação de São Paulo afirmou que o dirigente regional se expressou "de maneira inadequada durante a reunião". Leia, abaixo, a nota na íntegra:
"A Secretaria da Educação do Estado de São Paulo [Seduc-SP] esclarece que o dirigente regional de Santos se expressou de maneira inadequada durante a reunião. As escolas da rede estadual possuem contratos com empresas de limpeza para a realização deste tipo de trabalho, inclusive através de investimentos como o Programa Dinheiro Direto na Escola [PDDE]. Em 2020, as 5,1 mil escolas estaduais receberam R$ 700 milhões pelo Programa Dinheiro Direto na Escola de SP. A verba foi destinada para manutenção e conservação das unidades para a volta segura das aulas presenciais. Outros R$ 700 milhões já foram liberados para os preparativos do ano letivo de 2021. O dirigente será reorientado e está à disposição para esclarecimentos".
Diretor regional
O G1 também procurou o dirigente regional João Bosco Arantes. Ele afirmou, por texto, que "houve um desvirtuamento" na fala dele durante a reunião. Segundo ele, a fala foi "retirada de um contexto totalmente diferente".
João explicou que a reunião tinha como objetivo orientar as equipes escolares sobre inúmeros pontos de atenção, entre eles transporte escolar, alimentação, reforças, equipamentos de proteção individuais, limpeza escolar, currículo, materiais escolares e outros assuntos.
Ele diz que, quando se refere ao trabalho realizado pelos supervisores e coordenadores, pede o empenho máximo de todos. "Quando falamos em trabalho com as roçadeiras, utilizamos no sentido figurado, e não propriamente ao equipamento real", disse.
"Nossa orientação foi, e continua sendo, a mesma: todos com um só foco - recebermos os alunos no retorno presencial com as escolas limpas e organizadas", finalizou.