Por Roberta Oliveira, G1 Zona da Mata


Casa d'Itália em Juiz de Fora completa 80 anos em novembro de 2019 — Foto: Rafael Moreira Teixeira/Divulgação

Os 169 anos de Juiz de Fora foram escritos por pessoas de várias origens. Entre elas, estão os imigrantes italianos que optaram em se estabelecer na região a partir do século 19. E quando se pensa neles, a primeira referência é um prédio histórico que fez parte de quase metade da jornada de Juiz de Fora como município: a Casa d'Itália.

No aniversário de Juiz de Fora, neste 31 de maio, o G1 foi conhecer um pouco sobre a origem do imóvel de características Art Decó que completa 80 anos em novembro e as diferentes narrativas, culturas e projetos que convergem nele atualmente.

E especialmente, a inspiração de quem convive e mantém o espaço vivo - com aulas, cultura, dança, música e pesquisas - em reverter o ponto de partida ligado ao governo fascista e torná-lo um espaço de convivência e de aprendizado democrático e sem fronteiras.

Prédio da Casa d'Itália em 1939, quando foi inaugurado em Juiz de Fora — Foto: Márcio Arcuri/Arquivo Pessoal

Italianos em Juiz de Fora

Os imigrantes italianos começaram a chegar no Brasil no fim do século 19. Juiz de Fora era ponto de passagem obrigatória, de acordo com o mestre em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Rafael Bertante.

"Em 1888, construiu-se na cidade uma hospedaria que recebia os imigrantes que chegavam no porto no Rio de Janeiro, desciam até Juiz de Fora, eram registrados. A partir dessa hospedaria seguiam para outros destinos. A maioria foi trabalhar no interior de Minas ou voltava para o Rio de Janeiro e São Paulo", contou.

Alguns optaram por ficar. Rafael Bertante destacou que muitos tinham ofícios específicos e se adaptaram às circunstâncias encontradas no novo lar.

"Uma parte significativa de imigrantes permaneceu na cidade e no meio urbano. Diferente da colonização alemã, que tinha uma colônia para onde iam direto, não tem um bairro específico de imigrantes italianos, eles acabaram se difundindo pela cidade. Iam onde tinha oportunidade de trabalho, de crescer e construir sua residência", explicou.

Por isso surgiram as associações, como um caminho para manter uma ligação não apenas afetiva com a pátria, segundo o mestre em História pela UFJF.

"Uma forma foi criar grupos associativos, nem sempre exclusivos de italianos, onde poderiam relembrar as danças, as culinárias e até mesmo o idioma italiano, passar para as novas gerações. Mais que a memória, era um local onde recebiam também informações da Itália, que tinha se unificado poucas décadas antes. Tudo que acontecia chegava através das associações para os imigrantes", contou.

Solenidade de inauguração da Casa d'Itália em Juiz de Fora em novembro de 1939 — Foto: Márcio Arcuri/Arquivo Pessoal

"Domvs Italica", a Casa d'Itália

O ponto de partida para ter um prédio referência em Juiz de Fora foi o interesse do governo fascista de Mussolini em ter este contato com os italianos espalhados em outros países.

Segundo informações que constam no histórico de bens tombados da Prefeitura, o terreno na Avenida Rio Branco foi adquirido pelos italianos em outubro de 1933. A construção começou em 1936 e a inauguração ocorreu em 4 de novembro de 1939.

Atualmente, a Associação Ítalo-Brasileira San Francesco di Paola é a mantenedora do espaço que abriga, além do Departamento de Cultura, biblioteca e acervo, espaço para exposições de fotos, pinturas, desenhos: a capela de San Francesco di Paola; a agência consular, vinculada ao Consulado da Itália de Belo Horizonte; curso de língua italiana "Cultura Italiana", grupo de dança folclórica italiana Tarantolato; Coral Itália Tra Noi; grupo de bordadeiras; time de bocha "Casa D'Italia JF" (confira nesta matéria do GloboEsporte); centro de Yoga; Wa Dojo (Aulas de aikido); Vigilantes do Peso e recebe os ensaios da Orquestra Juiz de Fora.

No vídeo abaixo, Rafael Bertante, Paola Frizeiro e Thaiana Fernandes Pinto Gomes, as integrantes do Departamento de Cultura da Associação Ítalo-Brasileira San Francesco di Paola, falam sobre as origens que remontam ao projeto do governo fascista de Mussolini, as histórias ainda a serem contadas sobre o prédio e a meta de ser um espaço com portas abertas para todos.

Da origem fascista ao presente democrático: saiba mais sobre a história da Casa d'Itália em Juiz de Fora

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O imóvel foi tombado pelo município em um decreto de 19 de outubro de 1985, "considerando a significação histórica da Casa D'Itália, como marco da presença e da relevante contribuição da colônia italiana para o desenvolvimento do Município e o valor artístico que apresenta o edifício em que tem sede a Casa D'Itália, pelas suas linhas arquitetônicas características de uma época".

O decreto 3.359 determina a preservação da volumetria do edifício e a organização formal das quatro fachadas e a manutenção da divisão do espaço interno, segundo a a concepção originária.

"A gente recebe estudantes de Arquitetura, estudantes de História. Como temos feito muitas atividades, por exemplo, exposição e cinema, a gente tem notado um interesse maior agora das universidades, dos cursos em redescobrir a Casa d'Itália e isso reflete na produção de artigos", explicou Paola Frizeiro.

As redes sociais também são uma ponte com a comunidade; as atividades, projetos e eventos estão nos perfis oficiais do Instagram e Facebook. "Tem que estar na internet, ter esse contato com a população, estar neste meio para se aproximar das pessoas. Quem viaja para fora ou mora na Itália, segue em contato com a gente e fica por dentro de tudo que é feito aqui", ressaltou Thaiana Fernandes Pinto Gomes.

Grupo de dança folclórica Tarantolato surgiu no aniversário de 150 anos de Juiz de Fora e completa 19 anos nesta sexta (31) — Foto: Grupo Tarantolato/Divulgação

Cultura em dança e música

A dança é a manifestação das raízes italianas divulgada pelo grupo Tarantolato, que completa nesta sexta-feira (31) 19 anos de fundação. E mais que isso: surgiu por causa da celebração do 150º aniversário de Juiz de Fora.

Em entrevista ao G1, a presidente Mariza Fernandes Gomes Pinto contou um pouco desta história e destacou que a mistura entre Minas e Itália aumenta o aspecto afetivo das apresentações do grupo em vários palcos do país.

Grupo Tarantolato, de Juiz de Fora, comemora 19 anos de divulgação da dança italiana

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A Orquestra Juiz de Fora, que aparece no vídeo anterior tocando na apresentação do Tarantolato, também tem como endereço a Casa d'Itália. Surgiu há pouco mais de um ano, do desejo de 18 músicos amigos que queriam tocar juntos e também em homenagear o maestro Nelson Nilo Hack, que foi uma inspiração para todos eles.

Músicos da Orquestra Juiz de Fora ensaiam na Casa d'Itália — Foto: Rafael Moreira Teixeira/Divulgação

O repertório é variado: do clássico e erudito, aos temas de filmes e seriados. O G1 conversou com dois integrantes: o spalla Ladislau Brun e o líder de naipes João Paulo Faria sobre a influência da cultura italiana na música e a importância de canções como manifestação cultural, a origem e a proposta de aproximar a música, sem fronteiras, do público.

Além do bate-papo, o vídeo abaixo traz a interpretação dos violinistas da canção Bella Ciao e também as imagens da versão da Orquestra para o Hino de Juiz de Fora, com arranjo da violoncelista Ana Vieira.

Integrantes da Orquestra Juiz de Fora destacam importância da cultura italiana na música

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Memória: origens do juiz-forano

O G1 buscou no Centro de Documentação (Cedoc) da TV Integração uma reportagem especial de Érica Salazar e imagens de Humberto Campos sobre as diferentes origens da população que contribuíram para formar a "identidade juiz-forana".

Confira a matéria exibida em 31 de maio de 2009 na edição especial do MG1 pelo aniversário de 159 anos, apresentada direto do parque do Museu Mariano Procópio.

Memória MGTV no G1 recupera matéria exibida em 31 de maio de 2009 sobre os povos que formaram Juiz de Fora

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