Eleições 2022
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Por Cristiane Agostine e João Valadares — De São Paulo


Lula e Alckmin em evento em Belo Horizonte (MG): campanha de petista viveu crise no começo do segundo turno, mas recobrou ânimo na semana final — Foto: Ricardo Stuckert
Lula e Alckmin em evento em Belo Horizonte (MG): campanha de petista viveu crise no começo do segundo turno, mas recobrou ânimo na semana final — Foto: Ricardo Stuckert

Em uma sala pequena do comitê de campanha, em São Paulo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) divide o espaço com três frades franciscanos e três cachorros para uma bênção no dia de São Francisco de Assis, santo padroeiro dos pobres e protetor dos animais. No único evento da candidatura dois dias depois do primeiro turno, Lula exalta a integrantes da ONG Educafro, dirigida por um dos religiosos presentes, realizações do passado, como o acesso de jovens pobres e negros às universidades em sua gestão, e deixa de mencionar no discurso o apoio do PDT e do ex-presidenciável Ciro Gomes, recebido horas antes.

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Na mesma tarde, o presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) desembarca na capital paulista para dois cultos com milhares de evangélicos da Assembleia de Deus, depois de ter recebido o apoio dos governadores de São Paulo, Rodrigo Garcia (PSDB); de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), e do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL). A adesão imediata de Garcia e Zema à campanha de Bolsonaro frustrou Lula, que tinha a expectativa de acordo com os governadores dos dois maiores colégios eleitorais do país.

O contraste das agendas de Lula e Bolsonaro no início do segundo turno reflete o baque enfrentado pela campanha do petista depois do resultado apertado, de 48,4% dos votos válidos ante 43,2% do presidente. A equipe trabalhava com o cenário de vitória no primeiro turno ou em uma margem mais confortável para enfrentar a segunda etapa contra Bolsonaro. Além da surpresa das urnas, com o avanço do bolsonarismo no Congresso e a força da direita nas disputas estaduais, a campanha de Lula ficou na defensiva por quase três semanas diante dos apoios recebidos pelo presidente, de anúncios bilionários de benesses pelo governo, da pauta de costumes levantada por Bolsonaro e da ampla disseminação de notícias falsas, vinculando Lula até a “satanismo”.

Ao responder os ataques com polêmicas, a equipe de Lula embarcou em temas como maçonaria e canibalismo nas redes sociais e viu a pauta econômica, usada pelo petista no primeiro turno, ficar em segundo plano. O deputado André Janones (Avante-MG) ganhou ainda mais protagonismo e foi usado como uma das principais peças para consolidar o contra-ataque no campo da pauta de costumes. Houve incômodo de alguns aliados por entenderem que Lula teria sido atraído para um terreno escolhido por Bolsonaro. Integrante da campanha, o senador Humberto Costa (PT-PE) diz que a coordenação ficou “desnorteada” depois do resultado, que teve impacto também no ânimo da militância no início do segundo turno.

Outro ex-ministro de Lula disse em reserva ao Valor que, em determinado momento, a campanha do ex-presidente no segundo turno parecia presa num atoleiro. De acordo com a mesma fonte, o próprio Bolsonaro tratou de empurrar o carro petista para a estrada novamente. “Depois da ressaca natural por não termos vencido no primeiro turno, houve momentos de tensão porque o adversário, apesar dos erros, subia lentamente. Semana passada, o clima estava realmente diferente”, diz.

A terceira semana do segundo turno foi considerada a mais crítica para Lula. “O clima não está bom”, repetiam fontes próximas ao petista. A preocupação aumentou quando, mesmo após episódios considerados desastrosos para Bolsonaro, o presidente oscilou positivamente nas pesquisas.

Houve uma expectativa frustrada no núcleo petista de que, após o episódio ocorrido no dia 12 de outubro em Aparecida (SP), quando bolsonaristas tumultuaram a missa pelo Dia de Nossa Senhora Aparecida, o presidente poderia perder pontos. Não aconteceu. Pesquisa Ipec divulgadas dias depois mostrava o contrário. Entre os católicos, o presidente havia subido dois pontos percentuais.

Ao mesmo tempo em que Bolsonaro diminuía a distância para Lula, a campanha custava a sair da defensiva, embora tivesse obtido apoios de peso no segundo turno, como o da terceira colocada na disputa presidencial, a senadora Simone Tebet (MDB), do PDT de Ciro Gomes, do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de formuladores do Plano Real, ex-presidentes nacionais do PSDB e até de ex-bolsonaristas como o empresário Paulo Marinho.

O clima, porém, mudou nesta semana, com a repercussão negativa de casos envolvendo Bolsonaro e aliados, que se refletiram nas pesquisas internas da campanha de Lula. Na produtora onde o petista grava o programa eleitoral, funcionários brincavam no início da semana dizendo que “o sol havia aparecido novamente”.

Entre os problemas da campanha de Bolsonaro que têm favorecido o petista, segundo pesquisas internas, estão o debate sobre pedofilia depois que o presidente disse ter “pintado um clima” com adolescentes venezuelanas; os ataques do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB) com granadas e tiros de fuzil a policiais federais ao resistir a uma ordem de prisão no domingo (23) e a garantia de 116 inserções como direito de resposta na propaganda eleitoral na semana final da disputa. Teve ainda o “fogo amigo” da equipe econômica de Bolsonaro, que divulgou propostas de parar de reajustar o salário mínimo pela inflação e de acabar com a dedução de gastos com saúde e educação no Imposto de Renda.

Com os deslizes nas propostas em relação ao salário mínimo, que afetam diretamente os aposentados e pensionistas, e do IR, que atingem a classe média, Lula direcionou sua propaganda na TV para a economia. Mesmo assim, não deixou de martelar em discursos e entrevistas o caso do “pintou um clima” com adolescentes venezuelanas. No primeiro debate do segundo turno usou um broche em homenagem à campanha nacional de mobilização de combate à violência sexual contra crianças e adolescentes. No início desta semana, com a presença da socióloga Rosângela da Silva, a Janja, esposa de Lula, integrantes da campanha, parlamentares e entidades da sociedade civil divulgaram manifesto para pedir a investigação e responsabilização de Bolsonaro.

No campo econômico, o petista apresentou três bandeiras com apelo popular: o reajuste do salário mínimo acima da inflação, a renegociação de dívidas da população e o crédito a juros baixos. O candidato, no entanto, passou o segundo turno sem aprofundar suas propostas econômicas nem apresentar uma âncora fiscal para substituir o teto de gastos. A três dias das eleições, divulgou uma carta para garantir o compromisso com uma “política fiscal responsável”, com “regras claras e realistas”. O texto, no entanto, também não detalha a política econômica.

Duas semanas depois do início do segundo turno, Simone Tebet cobrou uma guinada. A senadora disse, em “live” com Lula, que a candidatura deveria sair da defensiva e não só combater o “conteúdo que gera medo no voto a Lula e no PT”, mas também divulgar propostas. E mostrar o governo Bolsonaro como “desumano e desonesto”. A ex-presidenciável destacou o peso das “fake news”, sobretudo entre os eleitores indecisos, e destacou a importância de “convencer quem pensa diferente”. “Não é hora de pregar para convertidos” e que “não há margem para erro” foram recados dados pela senadora.

A candidatura avançou na construção de uma frente ampla, com adesões de economistas, empresários e políticos refratários ao PT, mas que se uniram em torno da defesa da democracia. Simone Tebet, a deputada federal eleita Marina Silva (Rede-SP) e o vice na chapa, Geraldo Alckmin (PSB), foram escalados para conversar com empresários e investidores, e fizeram agendas com Lula e sem o petista nos Estados. Ciro, que declarou um apoio tímido sem citar o nome do ex-presidente, ausentou-se.

Em seu primeiro evento depois do primeiro turno, Lula disse que a busca por apoios não deveria ser ideológica. Depois, reforçou que não se pode “falar para nós mesmos” e que é necessário atrair novas forças políticas, todos contra Bolsonaro. Aos aliados, Lula tem reforçado que, se eleito, fará um governo para além do PT e que não tentará a reeleição em 2026. O petista resiste a apresentar nomes para o governo, mas já indicou que Tebet terá um lugar garantido.

Tebet cobrou uma campanha menos “vermelha”, para ajudar a enfrentar o antipetismo, e adotar o “branco”, para representar a amplitude dos apoiadores. Lula aceitou a ideia e o grande ato final do segundo turno, realizado no Tuca, em São Paulo, nesta segunda-feira (24) foi um retrato disso. Com o predomínio do branco nas roupas, o palco exibia representantes do MST e do movimento negro ao lado de economistas liberais. Entre os presentes, estavam os economistas Persio Arida e Henrique Meirelles, os ex-ministros José Gregori e Marta Suplicy e o dirigente do MST João Paulo Rodrigues.

Lula, no entanto, demorou para se convencer da necessidade de fazer gestos mais claros aos evangélicos, fatia do eleitorado em que Bolsonaro tem maior adesão. O ex-presidente teve um embate com o PT e com dirigentes da campanha sobre a divulgação de uma carta de compromissos aos cristãos, argumentando que não misturaria religião e política. Foi convencido ao ver em pesquisas o desgaste de campanha nesse eleitorado e ao perceber a força das “fake news” espalhadas por pastores. Entre as informações falsas, estavam a de que vai fechar igrejas, perseguir cristãos e criar banheiro unissex nas escolas, além de defender o aborto e as drogas.

“Eu não tenho nem celular”, costuma dizer Lula, ao falar sobre a divulgação de “fake news” pelo WhatsApp e outras redes sociais. “Sou analógico”. Evangélicas, a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) e Marina Silva, além do senador eleito Flávio Dino (PCdoB), ajudaram no convencimento. Lula fez um manifesto garantindo a liberdade religiosa, o respeito à família e se posicionando contra o aborto e as drogas. O petista ficou desconfortável ao prometer “não fazer aquilo que nunca fez” e não leu o manifesto, divulgado em um evento com evangélicos em São Paulo. A leitura ficou a cargo do ex-ministro Gilberto Carvalho.

A carta aos evangélicos é um exemplo de como as principais decisões da campanha foram centralizadas por Lula e incomodaram aliados pela “teimosia” do petista.

A “teimosia” do ex-presidente também é citada por aliados ao falarem sobre as dificuldades de Lula nos debates na televisão, sobretudo ao responder sobre corrupção. O tema colocou o petista na defensiva durante toda a campanha.

No primeiro turno, o petista não quis separar alguns dias para se preparar para o primeiro debate, na TV Bandeirantes, e seu desempenho foi ruim, segundo aliados, sobretudo ao responder sobre denúncias de corrupção na Petrobras e sua prisão. No segundo turno, derrapou novamente sobre corrupção ao ser confrontado por Bolsonaro no debate da mesma emissora e não conseguiu se explicar. O petista tentou intimidar o presidente ao mostrar a ele, durante o debate, uma reportagem sobre o apoio de Bolsonaro à pílula do aborto. No entanto, foi intimidado ao ser questionado sobre desvios na Petrobras e não conseguiu se desvencilhar, mesmo depois de ter se preparado.

Agora, Lula foi convencido a se preparar para o debate da TV Globo, nesta sexta-feira (28). Ontem, ao completar 77 anos, disse que não faria festa para poder continuar estudando para o confronto. Desde o início da semana o petista tem se dedicado a moldar seu discurso, sobretudo para se explicar sobre corrupção e sobre sua prisão. Foram escalados a consultora Olga Curado, os ex-ministros Franklin Martins, Edinho Silva, Aloizio Mercadante e Gleisi Hoffmann e o marqueteiro Sidônio Palmeira para treiná-lo.

Nos bastidores, aliados brincam dizendo que o petista joga pelo empate no último confronto. A expectativa é de que Bolsonaro seja agressivo e que parta para o “tudo ou nada”, novamente explorando a corrupção.

O foco da campanha de Lula no segundo turno tem sido em agendas no Sudeste, nas gravações para a propaganda eleitoral, em “lives” e entrevistas para rádios e podcasts como o “Flow”, onde bateu recorde de audiência. O petista passou até agora 17 dias em São Paulo, com apenas quatro comícios na rua, em São Bernardo do Campo, Guarulhos, Campinas e na zona leste da capital. Ficou três dias em Minas Gerais (Belo Horizonte, Juiz de Fora, Teófilo Otoni e Ribeirão das Neves); quatro dias no Rio (Baixada Fluminense e capital), contando com a presença hoje no debate da TV Globo. Na região Sul, fez no segundo turno só uma caminhada em Porto Alegre. No Nordeste, esteve em atividades em Salvador, Recife, Aracaju e Maceió. Não foi ao Norte nem ao Centro-Oeste.

O petista aposta em aumentar a diferença dos votos nos Estados nordestinos para compensar a dificuldade no Sudeste e Sul. Em pedido a governadores e parlamentares da região, Lula disse que a captação de votos é como espremer a cana-de-açúcar: “Espremendo, sempre tem um pouco mais [de votos].”

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