Mãe lésbica perde direitos parentais de criança para doador de esperma e sua ex-esposa
"Por que deveríamos ter que adotar nossos próprios filhos?", questiona a norte-americana Kris Williams. Mesmo tendo participado da criação e tendo seu nome na certidão de nascimento da criança — que hoje tem 2 anos —, ela perdeu os direitos parentais para sua ex-parceira, que é a mãe biológica, e o doador de esperma, que é o novo companheiro dela
Por Crescer Online
No dia 13 de fevereiro, um juiz de Oklahoma, nos Estados Unidos, decidiu que uma mãe lésbica não teria mais direitos parentais sobre a criança que ela criou por dois anos. Em vez disso, o tribunal decidiu que o doador de esperma é o "pai legal", junto com a ex-esposa dela, a mãe biológica da criança. Kris Williams, 51, que já é mãe de um menino de 16 anos, disse ao TODAY.com que sua ex-parceira, Rebekah Wilson, queria muito ser mãe. "Então começamos a planejar e procurar diferentes caminhos para fazer isso acontecer. Queríamos essa bioconexão, então encontramos um site e achamos que era o doador perfeito", lembrou.
Em setembro de 2018, o casal firmou um contrato com o doador de esperma, Harlan Vaughn, na esperança de conceber um filho, de acordo com documentos judiciais. No fim do ano, Rebeka já estava grávida. Ela e Kris se casaram legalmente em junho e o bebê nasceu em agosto. "Nós conversamos sobre diferentes cenários, que se eu não adotasse [a criança] como as coisas poderiam dar errado. Mas nós duas nos sentimos seguras", disse Kris.
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Depois de criarem o filho juntas por dois anos, Kris e Rebeka se separaram em novembro de 2021. No entanto, no mês seguinte, Rebekah obteve uma Ordem de Proteção à Vítima contra Kris, alegando abuso. Kris nega essas acusações. No mesmo mês, Rebeka e a criança foram morar com o dorador de esperma, que entrou com uma Petição para Adjudicação de Paternidade e Estabelecimento de Custódia e Visitação em janeiro de 2022. Depois disso, eles ainda tiveram outro filho juntos.
De acordo com os documentos do tribunal, Kris não vê a criança desde 23 de novembro de 2021, quando ela diz que o deixou na creche. “Se alguma coisa pode abrir um buraco em sua alma, eu diria que é isso”, lamentou ao TODAY.com, chorando. O nome de Kris está na certidão de nascimento da criança, de acordo com os documentos judiciais, e o bebê recebeu o sobrenome dela.
Decisão judicial
A juíza distrital do condado de Oklahoma, Lynne McGuire, escreveu em sua decisão que, como Kris não chegou a adotar a criança antes da separação, não tem direitos parentais. "A realidade é que a lei fornece um recurso legal disponível para Williams", escreveu McGuire. "Ela conscientemente optou por não persegui-lo", completou.
Além disso, a juíza também determinou que a lei de Oklahoma, que dá aos casais casados direitos automáticos dos pais sobre qualquer criança nascida durante a união, não se aplica a Kris, porque a proteção foi promulgada antes da legalização do casamento entre casais homoafetivos no estado. “(O ato) não leva em consideração o casamento entre pessoas do mesmo sexo, e não há presunção de que a esposa da mãe seja automaticamente considerada a mãe de uma criança nascida durante o casamento”, decidiu.
"Por que deveríamos ter que adotar nossos próprios filhos?", questionou Kris ao TODAY. "Se quisermos ter filhos, você vai nos colocar em mais brechas para ter nossos filhos legalmente? Por que você colocaria esse fardo financeiro nas pessoas?", continuou.
O que dizem os envolvidos
Rachel Morris, advogada do doador de esperma, afirmou ao TODAY.com, em uma declaração por escrito, que seu cliente está "emocionado com o resultado do caso". “De uma perspectiva legal, este caso é altamente específico em relação a contratos, tempo e inseminação artificial caseira”, escreveu Rachel. A advogada disse que é “injusto com o tribunal generalizar este caso como uma decisão contra os pais LGBTQ+”, observando que Vaughn também se identifica como LGBTQ. O TODAY.com também procurou Rebeka e seu advogado para comentar o caso, mas não obteve resposta.
Robyn Hopkins, advogada de Kris, está apelando da decisão e disse ao portal que a "Suprema Corte dos Estados Unidos declarou que é inconstitucional manter casais do mesmo sexo em padrões diferentes dos casais do sexo oposto". "Meus pensamentos iniciais sempre foram sobre a criança", destacou Robyn. "Kris criou esta criança. Ela foi sua mãe por toda a vida. A família foi planejada com sua esposa e um vínculo foi formado. A lei protege os casais que têm filhos. A criança, neste caso, também merece essa proteção", completou.
"Se essas duas pessoas fossem um casal [formado por pessoas] de sexos diferentes, seus direitos parentais seriam protegidos, independentemente da biologia", acrescentou a advogada. "O mesmo deve se aplicar a casais do mesmo sexo", enfatizou. Kris disse que continuará lutando pela custódia e continua pensando no dia em que se reencontrará com seu filho. "Tive a sorte de ser a mãe do meu filho adolescente e de trazer meu filho a este mundo", declarou. "A primeira coisa é estar ciente de suas emoções [do filho] e abordá-lo o mais gentilmente possível. A última coisa que quero fazer é perturbá-lo e sei que [o reencontro] será confuso para ele. Não é sobre os adultos, é sobre as crianças", finalizou.
Repercussão
Kris e sua advogada dizem que também estão preocupadas com o que a decisão pode significar para outros casais LGBTQ+ em Oklahoma. "Estamos lutando pelos direitos queer, mas este é outro nível de ataque", lamentou Kris. Alguns especialistas jurídicos e ativistas LGBTQ+ concordam. "Há um esforço para estabelecer os casamentos entre pessoas do mesmo sexo como de segunda classe e sem todos os direitos e benefícios concedidos aos casamentos heterossexuais", afirmou Brian K. Esser, advogado com prática de adoção e reprodução assistida no Brooklyn, Nova York, em entrevista ao TODAY.com.
“Seria um alerta para todos os casais do mesmo sexo, especialmente casais femininos em Oklahoma, se eles não tiverem firmado seus direitos parentais com a adoção", acrescentou Esser. "Existem reviravoltas factuais que são únicas (neste caso), mas acho que poderia ser expandido para todos os casais do mesmo sexo e, na minha opinião, coloca em risco pais não genéticos cujos filhos são concebidos com doadores", completou.
Em uma declaração fornecida ao TODAY.com, Stacey Stevenson, CEO da Family Equality, uma organização nacional sem fins lucrativos que trabalha pelos direitos e liberdades das famílias LGBTQ+, disse que a decisão é "incrivelmente decepcionante" e acrescenta "outra camada de preocupação e medo para famílias LGBTQ+". “Está acontecendo em um momento em que vemos um nível sem precedentes de ataques contra nossas famílias”, escreveu Stevenson.
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