Por Memória Globo

Frame de vídeo / Globo

Durante a apresentação da banda Gurizada Fandangueira, na madrugada do domingo, 27 de janeiro de 2013, foram utilizados artefatos pirotécnicos que, em contato com o isolamento acústico da boate Kiss, iniciaram um incêndio. A casa, que estava lotada, não possuía ventilação, saídas de emergência suficientes e nem brigada de incêndio, foi tomada pela fumaça tóxica que levou 242 jovens a óbito, a maioria em poucos minutos.

Os sobreviventes ajudaram a retirar os corpos das vítimas e a quebrar a fachada da boate para permitir o escoamento da fumaça. Muitos deles, entretanto, inalaram essa fumaça e tiveram que ser hospitalizados. Foram atendidos 382 feridos nas emergências dos hospitais da região e também de Porto Alegre.

Santa Maria é uma cidade universitária localizada no centro do Rio Grande do Sul. Os frequentadores da boate Kiss, naquela noite, eram principalmente estudantes que comemoravam a volta às aulas dos cursos de agronomia, medicina veterinária, pedagogia, zootecnia, técnicos em alimentos e agronegócios. A faixa etária dos mortos, entre 18 e 24 anos, e as condições do incêndio chocaram o país, que teve luto oficial de três dias declarado pela então presidente Dilma Rousseff. O incêndio foi o segundo pior da história do Brasil.

A cobertura rendeu ao 'Jornal Nacional' a indicação ao prêmio Emmy Internacional, na categoria Notícia, em 2014.

Após 10 dias de julgamento e quase nove anos de espera, o Tribunal do Júri do Foro Central de Porto Alegre condenou, no dia 10 de dezembro de 2021, pela morte de 242 pessoas, os quatro réus acusados do incêndio da boate Kiss: Elissandro Callegaro Spohr, Mauro Lodeiro Hoffmann, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Augusto Bonilha Leão.

No entanto, em 03 de agosto de 2022, a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) acolheu parte dos recursos das defesas, anulou o júri que condenou os quatro réus e determinou a realização de um novo julgamento.

EXCLUSIVO MEMÓRIA GLOBO

Em depoimento exclusivo ao Memória Globo, Silvia Faria, diretora da Central Globo de Jornalismo, comenta o incêndio na boate Kiss, ocorrido em 27/01/2013, em Santa Maria (RS). A cobertura rendeu ao JN a indicação para o Prêmio Emmy Internacional na categoria “Notícia”.

Em depoimento exclusivo ao Memória Globo, Silvia Faria, diretora da Central Globo de Jornalismo, comenta o incêndio na boate Kiss, ocorrido em 27/01/2013, em Santa Maria (RS). A cobertura rendeu ao JN a indicação para o Prêmio Emmy Internacional na categoria “Notícia”.

EQUIPE E ESTRUTURA

RBS TV

A Globo trabalhou em parceria com sua afiliada RBS TV, Rede Brasil Sul de Televisão, desde o primeiro momento. Vários repórteres foram deslocados para o local, com destaque para José Roberto Burnier e César Menezes, que cobriram todos os aspectos da tragédia durante a primeira semana.

“Fui acordado naquele domingo pela manhã com um telefonema do chefe de redação de São Paulo, Ricardo Villela. Contou-me o que estava acontecendo e disse que precisava de mim lá porque o caso era muito grave. Pulei da cama, fiz uma mala expressa e fui direto para o aeroporto”, recorda Burnier.

O 'Fantástico' do dia do incêndio foi uma edição especial, com diversas matérias e entrevistas exclusivas. Na semana seguinte, o dominical montou uma maquete em tamanho real no Projac, atual Estúdios Globo, para a matéria de Felipe Santana, que explicava aos telespectadores o que havia de fato acontecido durante a madrugada. 

Quatro bancadas ao vivo

A cobertura continuou no dia seguinte, quando os apresentadores dos telejornais de rede voaram a bordo do avião 'JN no Ar' e ancoraram de Santa Maria: Ana Luiza Guimarães para o 'Bom Dia Brasil'; Sandra Annenberg para o 'Jornal Hoje'; William Bonner para o Jornal Nacional; e Christiane Pelajo para o Jornal da Globo.

Durante a semana e nos meses seguintes, as notícias foram acompanhadas de perto pela equipe de telejornalismo da Globo. Entre eles estavam os repórteres André Azeredo, Bernardo Bortolotto, Daniela Ungaretti, Flávio Fachel, Giovani Grizotti, Guacira Merlin, Isabel Ferrari, Ivani Scütz, Juliana Motta, Kíria Meurer, Patrícia Cavalheiro, Raphael Faraco, Rosane Marchetti, Veruska Donato e Walace Lara, além dos correspondentes Jorge Pontual, Júlio Mosquéra, Renato Machado. 

Reportagem de César Menezes e José Roberto Burnier sobre o incêndio na boate Kiss e a tentativa de resgate de sobreviventes, além do acompanhamento da primeira perícia feita no local, Bom Dia Brasil, 28/01/2013.

Reportagem de César Menezes e José Roberto Burnier sobre o incêndio na boate Kiss e a tentativa de resgate de sobreviventes, além do acompanhamento da primeira perícia feita no local, Bom Dia Brasil, 28/01/2013.

PRIMEIRAS NOTÍCIAS

'Esporte Espetacular' e 'Domingão do Faustão'

Os primeiros detalhes sobre a tragédia foram ao ar no 'Esporte Espetacular' de 27 de janeiro de 2013, na voz da apresentadora Glenda Kozlowski: “O Esporte Espetacular começa com uma notícia triste, pelo menos 90 pessoas morreram em um acidente numa boate de Santa Maria”.

Glenda informou que a causa provável do incêndio seria fogo na espuma de isolamento acústico da boate e que haveria, no mínimo, 200 feridos. O programa teve três horas e meia de duração e contou com entrevistas, por telefone, de sobreviventes da tragédia.

“Começa o 'Domingão', o país está em choque, e uma cidade gaúcha, em comoção.” Foi assim que Fausto Silva abriu seu programa, que teve flashes e atualizações da tragédia. As informações de que o incêndio teria começado durante a apresentação da banda Gurizada Fandangueira, por ocasião de uma faísca causada por um fogo de artifício, e de que a boate não teria bombeiros civis e possuía apenas uma porta de saída, foram passadas pelo apresentador. Naquele momento já se contabilizavam 232 mortos e mais de 170 feridos.

''Fantástico

O 'Fantástico' do dia 27 começou com a tela preta onde foram projetadas as palavras “Santa Maria, RS – madrugada de hoje”. O som das ambulâncias tomou o áudio do programa que mostrou, na sequência, testemunhos chocantes de vítimas e imagens dos primeiros socorros, prestados pelos próprios jovens que haviam conseguido escapar. “Um domingo de luto para os brasileiros”, anunciou em seguida Zeca Camargo, atualizando o número de mortos para 234. Era o segundo pior incêndio da história do Brasil e o terceiro do mundo em casas noturnas. Renata Ceribelli completou dizendo que o assunto dominaria o 'Fantástico' daquela noite.

Quanto mais eu me informava com os bombeiros e policiais sobre o que tinha ocorrido, mais eu me certificava de que estava diante de um dos maiores horrores que eu já havia coberto em 30 anos de Globo.
— José Roberto Burnier

O repórter José Roberto Burnier entrou, ao vivo, do ginásio do Centro Desportivo Municipal de Santa Maria, para onde parte dos corpos estava sendo levada. Todos os 234 mortos já haviam sido identificados. Em seguida, foi ao ar a matéria feita na mesma tarde, dentro da boate e com imagens de internautas. Burnier explicou que calculava-se que havia cerca de 1,5 mil pessoas no local, que suportava apenas mil, e entrevistou um dos seguranças da casa, Rodrigo Moura. Os feridos haviam sido levados para os seis hospitais da cidade. As imagens de voluntários quebrando as paredes da boate com picaretas, ainda durante a madrugada, também foram ao ar, junto com uma declaração por telefone da delegada de plantão, Elizabete Shimomura. Burnier explicou que a maioria dos jovens correu para os banheiros e lá faleceu por falta de circulação de oxigênio.

Cheguei a Santa Maria num jato fretado às 15h30. Quarenta minutos depois, eu já estava na porta da boate Kiss. Ao ver buracos abertos nas paredes externas percebi o tamanho da tragédia.
— José Roberto Burnier
Abertura da edição especial do Fantástico sobre o incêndio na boate Kiss, com reportagens de José Roberto Burnier e César Menezes, 27/01/2013.

Abertura da edição especial do Fantástico sobre o incêndio na boate Kiss, com reportagens de José Roberto Burnier e César Menezes, 27/01/2013.

Espuma inflamável

As imagens da boate inteiramente chamuscada foram mostradas, pela primeira vez, no 'Fantástico' daquela noite. O repórter César Menezes entrou, ao vivo, da porta da boate Santa Maria, completamente destruída, e explicou que o incêndio teria começado, provavelmente, com o show pirotécnico da banda Gurizada Fandangueira. A espuma inflamável que revestia a boate, sem tratamento anticombustão, teria se incendiado, produzindo a fumaça tóxica que tomara conta do local. A maioria das vítimas havia, portanto, morrido asfixiada.

Uma animação mostrou como o fogo havia se iniciado, a tentativa de um dos membros da banda em apagar as chamas com um extintor de incêndio vencido e a barragem, dos seguranças, à saída das vítimas. Uma entrevista com o comandante de bombeiros Major Guido Mello e trechos do pronunciamento do governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, foram ao ar. Em matéria de Walace Lara, um pneumologista do Incor (Instituto do Coração) explicou que poucos minutos de inalação daquela fumaça poderiam ser suficientes para matar uma pessoa. A repórter Rosane Marchetti entrou ao vivo da frente de um dos hospitais de Santa Maria trazendo notícias sobre os feridos e pedindo doação de sangue.

Cidade universitária

No segundo bloco, o 'Fantástico' traçou um perfil de Santa Maria, uma cidade universitária com mais de 260 mil habitantes, também habitada por muitos militares. A presidente Dilma Rousseff seguiu para o local, onde também esteve o ministro da saúde, Alexandre Padilha.

A repórter Guacira Merlin conversou com um grupo que estava dentro da boate na hora em que o incêndio começou. Patrícia Cavalheiro fez uma reportagem a respeito da banda Gurizada Fandangueira, que, durante o show, soltou os artefatos pirotécnicos que iniciaram o incêndio. O repórter Flávio Fachel relembrou os piores incêndios da história do Brasil, como o que vitimou 503 pessoas em dezembro de 1961 no Gran Circo, em Niterói, Rio de Janeiro.

De Nova York, o correspondente Júlio Mosquéra falou sobre um incêndio ocorrido dez anos antes, numa boate de Rodhe Island (EUA), e conversou, por Skype, com um especialista norte-americano sobre regras de segurança contra incêndios. Também de Nova York, Jorge Pontual mostrou o destaque que a imprensa deu para a tragédia. O programa encerrou com imagens do velório coletivo que ocorreu no ginásio de Santa Maria.

ANCORAGEM DE SANTA MARIA

A Globo acompanhou de perto a tragédia de Santa Maria levando os apresentadores de todos os telejornais de rede para o local na segunda-feira, 28. O dia começou com Ana Luiza Guimarães diretamente do ginásio do Centro Desportivo Municipal de Santa Maria, de onde ancorou a edição especial do Bom Dia Brasil. A jornalista explicou o sentimento dos moradores: “A cidade de Santa Maria está muito chocada com essa tragédia, até porque é uma cidade muito jovem, cerca de 10% dos moradores são estudantes”.

Reportagem de Rosane Marchetti mostra imagens de cinegrafistas amadores sobre o desespero dentro e fora da boate Kiss durante o incêndio em Santa Maria, Jornal Hoje, 28/01/2013.

Reportagem de Rosane Marchetti mostra imagens de cinegrafistas amadores sobre o desespero dentro e fora da boate Kiss durante o incêndio em Santa Maria, Jornal Hoje, 28/01/2013.

Ao todo, 314 vítimas do incêndio haviam sido atendidas. Os jornalistas César Menezes, Guacira Merlin, Gioconda Brasil, Giovani Grizotti, Ivani Schütz, Juliana Motta, Patrícia Cavalelheiro, Veruska Donato; e os correspondentes Jorge Pontual, de Nova York; Roberto Kovalick, de Tóquio; e Renato Machado, de Londres, reportaram a situação dos sobreviventes, das investigações, mostraram os enterros que já haviam ocorrido e falaram sobre a repercussão internacional do segundo maior incêndio no Brasil, em números de mortos.

Sandra Annenberg também ancorou o 'Jornal Hoje' de Santa Maria, enquanto Evaristo Costa permaneceu na bancada, chamando matérias sobre os desdobramentos da tragédia. Imagens de um cinegrafista amador mostrando o socorro dos bombeiros às vítimas no interior da boate foram ao ar em matéria de Rosane Marchetti. A prisão de dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira foi destaque na edição do telejornal, em matéria de Giovani Grizotti.

'JN' direto de Santa Maria

O 'Jornal Nacional' foi ancorado por William Bonner do local da tragédia. Ele voou a bordo do avião do 'JN no Ar' até Santa Maria, enquanto Renata Vasconcellos permaneceu na bancada. Bonner ressaltou que, além da equipe do telejornal, que tinha se deslocado para o local, a afiliada RBS TV, do Rio Grande do Sul, estava prestando suporte durante a cobertura.

Os dois primeiros blocos foram inteiramente dedicados à tragédia. Dois músicos do grupo falaram com exclusividade à Globo. Logo no começo do telejornal, Bonner anunciou: “Ao longo desta edição especial do 'JN', nós vamos trazer todos os detalhes da investigação e todos os fatos ligados a esse acontecimento trágico de Santa Maria.” O jornalista explicou que tinha chegado à cidade a bordo do 'JN no Ar', avião que havia transportado também, no dia anterior, as jornalistas Ana Luiza Guimarães e Sandra Annenberg. José Roberto Burnier entrou em seguida, ao vivo, da porta do Hospital de Caridade, de onde falou sobre os enterros que havia acompanhado durante aquela tarde.

William Bonner apresenta o Jornal Nacional, ao vivo, de Santa Maria, e José Roberto Burnier relata os primeiros funerais das vítimas do incêndio na boate Kiss, 28/01/2013.

William Bonner apresenta o Jornal Nacional, ao vivo, de Santa Maria, e José Roberto Burnier relata os primeiros funerais das vítimas do incêndio na boate Kiss, 28/01/2013.

A Universidade Federal de Santa Maria havia suspendido as aulas em sinal de luto pelos 103 alunos mortos, como contou Guacira Merlin no 'Jornal Nacional'. Ela explicou ainda que festas como a da boate Kiss eram comuns em janeiro, e que aquela havia sido organizada por estudantes de agronomia, medicina veterinária, pedagogia, zootecnia, técnicos em alimentos e agronegócios. Havia também jovens de outras áreas de estudo, e a maioria das vítimas tinha entre 18 e 24 anos.

As entrevistas realizadas por William Bonner naquela manhã com parentes e amigos das vítimas, voluntários e taxistas que haviam ajudado na noite foram ao ar. O repórter César Menezes fez uma matéria com uma reconstituição animada dos acontecimentos. Ele havia entrevistado o comandante do Corpo de Bombeiros local, Guido Melo, que afirmara que os equipamentos de segurança da boate estavam em ordem. César explicou que a documentação comprovando a vistoria dos bombeiros e a autorização para funcionamento não fora apresentada. O jornalista também entrevistou o comandante geral da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, Sérgio Roberto de Abreu, sobre uma reforma recente pela qual a boate havia passado; o delegado regional da Polícia Civil do RS, Marcelo Arigony; e o delegado da Defrec (Delegacia Especializada de Furto, Roubos e Capturas) de Santa Maria, Sandro Meinrez, sobre provas e evidências, como o sumiço do computador que gravava as imagens das câmeras de segurança da boate.

A edição do 'JN' de 28 de janeiro contou com a simulação de um ambiente forrado com o mesmo tipo de espuma da boate, mostrando que o local levou apenas 12 segundos para incendiar-se. Uma maquete virtual simulou a provável movimentação dentro da casa noturna, apontando os locais para onde os jovens correram quando teve início o fogo. Barrados pelos seguranças, que acharam que se tratava de um calote, a maioria deles correu para o banheiro, onde acabou falecendo por causa da toxidade da fumaça.

A repórter Patrícia Cavalheiro falou sobre a prisão temporária de dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira. O guitarrista Rodrigo Martins e o baterista Eliel de Lima falaram com exclusividade ao repórter Giovani Grizotti. O 'JN' daquela noite contou ainda com reportagens de Kíria Meurer, de Porto Alegre; Júlio Mosquéra, de Nova York; e Delis Ortiz, de Buenos Aires. A edição terminou com um painel onde foram exibidos, em silêncio, os nomes das vítimas.

'Jornal da Globo' in loco

Na segunda-feira, 28 de janeiro, Christiane Pelajo ancorou o 'Jornal da Globo' ao vivo, de Santa Maria, enquanto William Waack permaneceu na bancada, de onde entrevistou o advogado Sergei Cobra Arbex, que apontou o governo do Rio Grande do Sul como um dos grandes culpados pela tragédia. A repórter Daniela Ungaretti falou sobre os sobreviventes que estavam internados em estado grave na cidade, e André Azeredo entrou diretamente de um hospital em Porto Alegre para onde haviam sido transferidos os feridos mais graves.

André Curvello fez uma matéria sobre a dificuldade de recuperação das vítimas do incêndio. Pequenos depoimentos de sobreviventes foram ao ar durante o telejornal, dando a dimensão da tragédia. Pelajo explicou que os bens dos donos da boate Kiss haviam sido bloqueados e chamou a matéria de César Menezes sobre essa decisão. O correspondente Jorge Pontual repercutiu, de Nova York, o impacto da notícia do incêndio no mundo.

José Roberto Burnier falou da comoção nos enterros dos primeiros corpos, e Carla Modena, mostrou que, de São Paulo, fiscalizações apontavam irregularidades em casas noturnas de todo o país. “Manter o controle diante de tanto drama, de tanta dor, foi a coisa mais difícil. Eu chorava por dentro ao ver as cenas de desespero de gente de todo tipo”, lembra Burnier.

Christiane Pelajo apresenta o Jornal da Globo, ao vivo, de Santa Maria, e José Roberto Burnier relata a comoção da cidade durante os primeiros funerais das vítimas do incêndio na boate Kiss, 28/01/2013.

Christiane Pelajo apresenta o Jornal da Globo, ao vivo, de Santa Maria, e José Roberto Burnier relata a comoção da cidade durante os primeiros funerais das vítimas do incêndio na boate Kiss, 28/01/2013.

Reportagem de Guacira Merlin sobre a caminhada realizada em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, para homenagear as vítimas do incêndio na boate Kiss, Jornal Nacional, 29/01/2013.

Reportagem de Guacira Merlin sobre a caminhada realizada em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, para homenagear as vítimas do incêndio na boate Kiss, Jornal Nacional, 29/01/2013.

A caminhada noturna que aconteceu na noite do dia 28, reunindo 35 mil pessoas nas ruas de Santa Maria, foi destaque em todos os telejornais do dia seguinte. Assim como a reza que aconteceu no ginásio do Centro Desportivo Municipal de Santa Maria, as novidades da investigações e o estado de saúde dos internados.

No 'JH' do dia 29, uma matéria de Flávia Jannuzzi falou sobre a pneumonia química, doença que pode aparecer até três dias após a inalação da fumaça tóxica. O então ministro da Saúde, Alexandre Padilha, declarou que pacientes ainda corriam risco de óbito. Patrícia Cavalheiro mostrou a procissão, Isabel Ferrari fez matéria sobre o luto das famílias das vítimas, e Juliana Motta falou sobre os casos mais graves. No término do jornal, Sandra Annenberg declarou: “O 'Jornal Hoje' termina aqui e, em nome da equipe do 'Hoje', eu gostaria de deixar os nossos sentimentos a todas as famílias que perderam seus filhos. Sintam-se abraçados por nós”.

ESTADO CRÍTICO

No 'Jornal Nacional' daquela terça-feira, 29, os repórteres mostraram a situação difícil que enfrentavam os sobreviventes internados, com graves crises respiratórias. José Roberto Burnier alertou para as vítimas que haviam sido atendidas e liberadas e entrevistou um rapaz que estava fazendo inalação respiratória em casa. Ele explicou que, dos 118 feridos, 75 estavam em estado crítico.

A repórter Kíria Meurer mostrou que uma preocupação dos médicos era tratar adequadamente os sobreviventes com queimaduras com a realização de transplantes de pele. O banco de pele de Porto Alegre, apesar de ser um dos maiores do país, não possuía estoque suficiente para todas as vítimas. Bancos de outros estados brasileiros, e até do Uruguai e da Argentina, já haviam enviado ajuda.

O repórter César Menezes atualizou as notícias sobre as investigações. A polícia já havia ouvido 44 pessoas e, apesar do laudo da perícia ainda não estar pronto, os investigadores apontavam muitas irregularidades: não havia iluminação de emergência, a porta de saída era insuficiente, a espuma do forro era inflamável, os extintores estavam vencidos.

Primeiras imagens

Na quinta-feira, 31 de janeiro, o 'JN' levou ao ar as primeiras imagens do começo do incêndio, feitas com a câmera de um dos estudantes. Sete feridos haviam recebido alta, mas ainda havia 134 internados, dos quais 77 em estado grave. José Roberto Burnier contou a história de alguns jovens que começavam a ser internados depois de passar mal.

Em 4 de fevereiro, o 'JN' mostrou a Universidade Federal de Santa Maria. “Como voltar à sala de aula a partir de segunda-feira?”, indagou José Roberto Burnier em matéria sobre os preparativos para a retomada dos cursos na instituição, que tinha perdido 105 estudantes e ainda possuía 70 alunos internados. Uma reportagem de Patrícia Cavalheiro acompanhou a caminhada em silêncio pelo Campus da UFSM. No ginásio da cidade, cerca de cinco mil pessoas participaram de um culto ecumênico.

Fiscalização

A semana também foi marcada por fiscalizações em casas noturnas de todo o país. O 'Jornal da Globo' do dia 31 abordou a mobilização das casas noturnas de São Paulo por mais segurança. Um protesto na frente da boate Kiss reuniu moradores de Santa Maria. A história de Guilherme, um estudante de zootecnia de 25 anos que conseguira sair da boate, mas havia voltado para ajudar, e agora estava na UTI, foi contada pelo repórter Raphael Faraco. O repórter André Azeredo explicou que, naquele dia, novas internações haviam sido realizadas em Porto Alegre.

CONTRADIÇÕES E MAQUETE

O 'Fantástico' de 3 de fevereiro começou com uma entrevista exclusiva com um dos donos da boate Kiss, Elissandro Spohr. As perguntas foram enviadas pela produção do programa ao advogado de Elissandro, que gravou o depoimento com a câmera do celular. Elissandro estava internado por inalação da fumaça tóxica, sob custódia, e afirmou que havia apenas 700 pessoas presentes na noite do incêndio – contradizendo os números da polícia, que calculava mil pessoas. O empresário ainda disse que, assim que constatou o incêndio, abriu as portas; e que as próprias vítimas atrapalharam o resgate. Ele também afirmou que não sabia que a banda usaria fogos de artifício.

Em outra entrevista exclusiva, Márcio André Santos, percursionista e irmão do vocalista da banda Gurizada Fandangueira, contradisse Elissandro, afirmando que o dono da boate estava ciente de que a banda usava sinalizadores que produziam faísca em seu show. Ele também afirmou que havia mais de mil pessoas no local.

Entrevista exclusiva com Elissandro Sphor, dono da boate Kiss, dias depois da tragédia, Fantástico, 03/02/2013.

Entrevista exclusiva com Elissandro Sphor, dono da boate Kiss, dias depois da tragédia, Fantástico, 03/02/2013.

César Menezes entrevista, com exclusividade, o percussionista da banda Gurizada Fandangueira, e Kiria Meurer mostra o trabalho dos médicos durante a transferência dos sobreviventes do incêndio para Porto Alegre, Fantástico, 03/02/2013.

César Menezes entrevista, com exclusividade, o percussionista da banda Gurizada Fandangueira, e Kiria Meurer mostra o trabalho dos médicos durante a transferência dos sobreviventes do incêndio para Porto Alegre, Fantástico, 03/02/2013.

Uma matéria de Kíria Meurer destacou o trabalho dos médicos de Porto Alegre. A repórter Patrícia Cavalheiro falou, da frente da boate Kiss, sobre a vigília que havia começado às 2h30 da manhã daquele sábado, marcando uma semana da tragédia.

O repórter Marcelo Canellas, formado pela Universidade Federal de Santa Maria 25 anos antes, voltou à cidade para ouvir relatos de solidariedade e heroísmo. O apresentador Tadeu Schmidt trouxe ainda a notícia de que 423 casas noturnas do país haviam sido fechadas após uma operação de fiscalização.

Ainda nesta edição, o 'Fantástico' reproduziu a boate, em tamanho real, nos estúdios da Globo, para detalhar o que aconteceu. O repórter Felipe Santana levou até o local uma funcionária da boate e dois sobreviventes para explicar o que ocorreu naquela noite, além do professor Moacir Duarte, especialista em gerenciamento de risco e planejamento de emergência. Moacir apontou falhas que pioraram a situação das vítimas: diversas grades dentro e fora da boate atrapalhavam o fluxo das pessoas, falta de sinalização de emergência e portas pequenas demais. Os depoimentos dos sobreviventes confirmavam que a boate estava acima da lotação e que os seguranças barraram, em um primeiro momento, as pessoas que tentavam deixar o local.

Em uma reprodução em tamanho real da boate Kiss nos estúdios da Globo, o repórter Felipe Santana entrevista sobreviventes do incêndio, que relembram a noite da tragédia e apontam falhas na segurança, Fantástico, 03/02/2013.

Em uma reprodução em tamanho real da boate Kiss nos estúdios da Globo, o repórter Felipe Santana entrevista sobreviventes do incêndio, que relembram a noite da tragédia e apontam falhas na segurança, Fantástico, 03/02/2013.

PRISÃO PREVENTIVA E INQUÉRITO POLICIAL

Prisão preventiva

O 'Jornal da Globo' de 1º de março noticiou que a justiça havia decretado a prisão preventiva dos donos da boate e de integrantes da banda Gurizada Fandangueira. Uma semana mais tarde, o telejornal informou, em reportagem de Bernardo Bortolotto, que 15 pessoas ainda continuavam internadas. O prefeito de Santa Maria, Cezar Schirmer, foi chamado para depor e declarou-se surpreso por ser responsabilizado pela polícia.

Inquérito policial

Conforme anunciou o 'Jornal Nacional' de 22 de março, em reportagem de Patrícia Cavalheiro, a Polícia Civil indiciou 16 pessoas criminalmente por terem assumido o risco de matar ao não cumprir ou não fiscalizar as normas de segurança. O inquérito responsabilizou, ao todo, 28 pessoas. Pelos 241 homicídios com dolo eventual qualificado e 623 tentativas de homicídio respondem cinco sócios da boate Kiss, o produtor e o vocalista da banda Gurizada Fandangueira, além de dois bombeiros que haviam vistoriado a boate. Pelos homicídios culposos das vítimas foram indiciados os secretários e o chefe de fiscalização do Meio Ambiente; o chefe de Mobilidade Urbana e um funcionário da Secretaria de Finanças que havia emitido o alvará de localização da Kiss. Também foram indiciados por fraude processual um major e um sargento dos Bombeiros que haviam adulterado a pasta de documentos onde ficava o alvará da boate após a tragédia. Por falso testemunho, um ex-sócio sofreu indiciamento.

O inquérito policial concluiu que o grande número de mortes foi devido a uma sucessão de erros cometidos pelos donos da boate, funcionários da prefeitura e oficiais do Corpo de Bombeiros. Onze pontos levaram à tragédia: o artefato pirotécnico que foi aceso no palco, atingindo a espuma do teto; o extintor de incêndio que não havia funcionado; as irregularidades nos alvarás da boate; a superlotação no dia da tragédia, que tinha mais de 864 pessoas; a espuma utilizada para o isolamento acústico, que era irregular; o fato de a casa noturna possuir apenas uma porta de entrada e saída; a presença de grades de contenção que obstruíram a saída das vítimas; a falta de rotas adequadas e sinalizadas para emergências; e a largura das portas e a falta de exaustão adequada, com obstrução de janelas.

NOVA VÍTIMA: 242 MORTOS

Em 27 de abril, três meses após a tragédia, parentes e amigos das vítimas se reuniram para uma homenagem. Conforme informou Guacira Merlin para o 'JN', quatro jovens continuavam internadas em hospitais de Porto Alegre. Dos oito acusados, quatro permaneciam presos.

Em 20 de maio, mais uma sobrevivente da tragédia faleceu, Mariane Vielmo, de 24 anos, elevando o número total de vítimas para 242. O 'JN' acompanhou seu enterro.

Conforme informou William Bonner no 'JN' de 26 de junho, cerca de 200 manifestantes ocuparam a Câmara Municipal de Santa Maria contra a CPI que investigava possíveis irregularidades contra o poder público na tragédia. Os manifestantes queriam a anulação da comissão após a divulgação de uma gravação entre dois vereadores e dois relatores que integram a CPI. Eles estavam preocupados com a possibilidade das investigações alcançarem o prefeito, Cezar Schirmer. A repórter Carla Fachim mostrou que os protestos haviam interrompido os trabalhos na Câmara de Vereadores.

JULGAMENTO

Em 27 de janeiro de 2021, passados oito anos da tragédia, nada de julgamento. No processo criminal, os empresários e sócios da boate Kiss, Elissandro Calegaro Spohr e Mauro Londero Hoffmann, além do vocalista da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos, e o produtor do grupo musical, Luciano Augusto Bonilha Leão, respondem por homicídio (consumado 242 vezes, devido ao número de mortos) e por 636 tentativas de homicídio com dolo eventual – quando se assume o risco de matar -, de acordo com o número de feridos. Em 2020, Elissandro, Mauro e Marcelo conseguiram a transferência do júri popular da comarca de Santa Maria para um foro em Porto Alegre. Alegaram dúvida sobre a parcialidade dos jurados de Santa Maria, local da tragédia. Mesmo não tendo solicitado o mesmo, Luciano também conseguiu a alteração, após decisão do Ministério Público do Rio Grande do Sul. Assim, todos os réus poderiam ser julgados na mesma data e pelo mesmo júri. Em razão desses recursos judiciais e da pandemia da Covid-19, os réus seguiram sem julgamento até o final de 2021.

Sobrevivente do incêndio na boate Kiss relembra a tragédia, oito anos depois.  Bom Dia Rio Grande, 27/01/2021.

Sobrevivente do incêndio na boate Kiss relembra a tragédia, oito anos depois. Bom Dia Rio Grande, 27/01/2021.

Matéria do Jornal Hoje sobre os oito anos da tragédia na boate Kiss. Jornal Hoje, 27/01/2021.

Matéria do Jornal Hoje sobre os oito anos da tragédia na boate Kiss. Jornal Hoje, 27/01/2021.

Após 10 dias de julgamento e quase nove anos de espera, o Tribunal do Júri do Foro Central de Porto Alegre condenou, no dia 10 de dezembro de 2021, pela morte de 242 pessoas, os quatro réus acusados do incêndio da boate Kiss: Elissandro Callegaro Spohr, Mauro Lodeiro Hoffmann, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Augusto Bonilha Leão. No entanto, no dia 03 de agosto de 2022, a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) acolheu parte dos recursos das defesas, anulou as condenações e determinou a realização de um novo julgamento.

FONTES

Bom Dia Brasil (28/01/2013); Fantástico (27/01/2013; 03/02/2013); Jornal Hoje (28/01/2013); Jornal da Globo (28 a 31/01/2013 e 01/02/2013); Jornal Nacional (28 a 31/01/2013; 22/03/2013, 27/04/2013, 20/05/2013, 26/06/2013); https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2021-01/incendio-na-boate-kiss-completa-oito-anos-sem-julgamento-dos-reus e https://epoca.globo.com/brasil/familias-de-vitimas-da-boate-kiss-cobram-justica-apos-8-anos-sem-julgamento-impunidade-mata-24857172, acessados em 27/01/2021; https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2022/08/03/caso-kiss-justica-recursos-juri-quatro-reus.ghtml e https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2023/01/23/incendio-da-boate-kiss-completa-10-anos-na-sexta-relembre-cronologia-do-caso.ghtml, acessados em 26/01/2023.
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