Por g1 RR — Boa Vista


Crianças Yanomami resgatadas neste domingo, 22 de janeiro de 2023 — Foto: Weibe Tapeba/Sesai/Divulgação

Mais de mil indígenas em estado grave de saúde foram resgatados da Terra Indígena Yanomami nos últimos dias por equipes do Ministério da Saúde que atuam de forma emergencial em comunidades dentro da reserva. A estimativa foi divulgada nesta terça-feira (23) pelo secretário de Saúde Indígena (Sesai) do ministério, Weibe Tapeba, durante coletiva de imprensa em Boa Vista.

As equipes estão na reserva desde o dia 16 de janeiro para atuar frente à desassistência sanitária no território. Os indígenas sofrem, principalmente, com malária e com desnutrição grave, afirma Tapeba.

"Nós acreditamos que mais de mil indígenas foram resgatados nesses últimos dias do território para não morrer", afirmou. Em uma semana, o único hospital infantil do estado recebeu 29 crianças Yanomami doentes.

Mais de mil Yanomami já receberam tratamento emergencial

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Os indígenas são resgatados das comunidades onde vivem e levados ao posto de Surucucu – uma unidade considerada de referência na região, mas que se resume a um barracão de madeira de chão batido e com estrutura precária. De lá, os quadros gravíssimos são encaminhados para Boa Vista.

O Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye'kuana (Condisi-YY) disse que, só no domingo (22), foram resgatados 26 crianças e dois adultos durante a missão. O trabalho tem o apoio da Força Aérea Brasileira (FAB).

O número de indígenas resgatados muda conforme os dias e, provavelmente, deve aumentar, já que há regiões do território que ainda não receberam os agentes de saúde.

O secretário Weibe Tapeba voltou a falar que os indígenas vivem em "situação de guerra".

"É uma operação que envolve uma complexidade muito grande, uma estrutura, uma logística, e nós precisamos cobrir todo o território, principalmente aquelas comunidades que estão muitas vezes reféns das ações dos garimpeiros", disse o secretário.

Na coletiva, Tapeba também falou em realizar uma auditoria interna para investigar os contratos de medicamentos e de realização de voos feitos pelo Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (DSEI-Y), responsável pelo atendimento direto aos indígenas.

"Pretendemos implantar aqui uma auditoria interna pra acompanhar essas questões dos contratos. É um absurdo a gente pensar nessa possibilidade, de desvio de recursos para medicamentos, por exemplo. Estamos acompanhando um cenário bem complicado também no contrato de horas-voos, que é o principal aqui do Distrito. A gente não pode pensar desse serviço ser paralisado", destacou.

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Crianças yanomami sofrem com desnutrição — Foto: Júnior Hekurari/Arquivo Pessoal

Clima de guerra

O secretário relatou ao g1 que chegou a ver garimpeiros armados enquanto participava do resgate de pacientes em estado grave de saúde na comunidade de Cachoeira, na Terra Indígena Yanomami.

Tapeba afirmou que, naquele dia, o resgate na comunidade dominada pelo garimpo só foi possível por conta do apoio de segurança da Força Área Brasileira.

O secretário comparou a operação de resgate dos indígenas a uma guerra. Agora, ele planeja instalar um hospital de campanha dentro da reserva para atender dezenas de pessoas doentes, principalmente com malária e desnutrição.

Tapeba passou um dia na região de Surucucu. Ele retornou a Boa Vista nesta segunda-feira (23). No domingo (22), acompanhou de perto a situação de indígenas com quadro grave de desnutrição em comunidades dominadas pelo garimpo – a atividade ilegal é a principal causa da crise sanitária no território.

"Tudo essa crise é reflexo do garimpo e do garimpeiro, não tem como não ser. Nós temos cerca de 30 mil indígenas Yanomami e mais de 20 mil garimpeiros. Se não fosse os garimpeiros, os indígenas Yanomami certamente viveriam livres e autossuficientes como viviam antes."

Secretário de Saúde Indígena, Weibe Tapeba acompanhou um dia de resgates na Terra Yanomami — Foto: Caíque Rodrigues/g1 RR

Visita de Lula

Tapeba chegou a Roraima no sábado (21). Ele estava na comitiva de Lula (PT), que viajou ao estado para ver de perto a desassistência aos Yanomami. O presidente se surpreendeu com o que encontrou.

"Se alguém me contasse que em Roraima tinham pessoas sendo tratadas dessa forma desumana, como vi o povo Yanomami aqui, eu não acreditaria. O que vi me abalou. Vim aqui para dizer que vamos tratar nossos indígenas como seres humanos", disse Lula.

"É um cenário de muita guerra. O que a gente viu ontem é de partir o coração", reforçou Tabepa sobre a grave crise sanitária enfrentada pelo povo Yanomami.

Para buscar solução à crise sanitária Yanomami, o Ministério da Saúde declarou emergência de saúde pública. Lula também criou o Comitê de Coordenação Nacional para discutir e adotar medidas em articulação entre os poderes para prestar atendimento a essa população.

O plano de ação deve ser apresentado no prazo de 45 dias, e o comitê trabalhará por 90 dias – prazo que pode ser prorrogado.

Com a visita de Lula a Roraima para tratar sobre a crise sanitária, a dramática situação do povo Yanomami se tornou um dos assuntos mais comentados do país no Twitter. Muitas pessoas, ao verem as imagens das vítimas, chamaram de "barbárie" e "descaso".

Presidente Lula esteve em Roraima e falou das ações para enfrentar crise sanitária na sáude Yanomami: 'desumano o que vi' — Foto: Caíque Rodrigues/g1 RR

Saúde dos indígenas

Maior reserva indígena do Brasil, a Terra Yanomami registra nos últimos anos agravamento na saúde dos indígenas, com casos graves de crianças e adultos com desnutrição severa, verminose e malária, em meio ao avanço do garimpo ilegal.

Só em 2022, segundo o governo federal, 99 crianças Yanomami morreram – a maioria por desnutrição, pneumonia e diarreia, que doenças evitáveis. A estimativa é que, ao todo no território, 570 crianças morreram nos últimos quatro anos, na gestão de Jair Bolsonaro.

Em 2021, o g1 e o Fantástico já tinham registrado cenas inéditas e exclusivas – semelhantes às divulgadas recentemente – de crianças extremamente magras, com quadros aparentes de desnutrição e de verminose, além de dezenas de indígenas doentes com sintomas de malária em comunidades Yanomami.

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