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Por Nabil Ghorayeb

Médico cardiologista do HCor, doutor em Cardiologia (FMUSP), fundador do CardioEsporte do Instituto Dante Pazzanese, Prêmio Jabuti (Literatura, Ciência e Saúde)

São Paulo


Vários dispositivos cardiológicos, como smartwatches e smartbands, estão sendo colocados à disposição dos atletas e nós, como cardiologistas, temos algumas restrições ao seu valor clínico. Alertamos para considerar com muita calma as possíveis alterações que surgirem nos relógios e frequencímetros existentes. Podem tanto gerar um alarme indevido ao registrar alterações falsas, levando a pânico desnecessário; quanto podem não registrar algumas alterações importantes, fazendo com que a pessoa descarte sintomas reais que está sentindo e que exigem uma busca de orientação médica.

Relógios inteligentes não são, em sua maioria, dispositivos médicos, e sim simples registradores da pulsação — Foto: Istock Getty Images

E explicamos o porquê com um exemplo: imaginem que o pulso esteja falhando devido a extrassístoles, aquelas falhas que um paciente, seja atleta ou não, descreve como um nó na garganta seguido de tosse seca, ou então como um vazio na boca do estômago. Os dispositivos digitais podem errar os valores registrando muito menos do que a realidade da pulsação, porque a extrassístole não consegue ser captada, por não produzir a contração do coração.

Esses relógios inteligentes, chamados de “smartwatches”, e as “smartbands” (pulseiras inteligentes) utilizam tecnologia de raios infravermelhos, que são radiações eletromagnéticas com comprimentos de onda entre 700 e 50.000 nm. Como explica a Dra. Susimeire Buglia, do HCor, "o relógio fica no dorso do punho. Com muito movimento, a acurácia de FC e Sat O2 caem muito. Muitos pacientes pedem para comparar o relógio com o teste ergométrico. Observamos que enquanto caminham, é perfeito; depois que começam a correr, a precisão diminui e quando começam a transpirar desaparece a precisão".

Ultimamente, nestes tempos de pandemia pelo Covid-19, muitas pessoas aprenderam a ver a pulsação no oxímetro, dispositivo para medir a saturação de oxigênio pelo dedo e que utiliza essa tecnologia dos raios infravermelhos. Quando ocorre uma ou várias extrassístoles, no mostrador aparecem registros de 40 ou 45 batimentos por minuto.

Nos eventos de aceleração do coração, a maioria dos dispositivos que não mostram o registro da linha e dos ciclos cardíacos (como uma linha do eletrocardiograma), apenas os valores da pulsação, teve falhas registrando pulsos elevados sem haver real aceleração, e sim uma variação pela movimentação do punho ou do braço do atleta, segundo uma pesquisa feita em voluntários que usaram o aparelho de HOLTER e um frequencímetro a base de raios infravermelhos.

De acordo com alguns estudos recentes, os melhores frequencímetros que registram os batimentos cardíacos são os que usam cinta no peito e que captam a energia elétrica do coração. Evidente que logo teremos novidades eletrônicas e quando você notar que seu relógio inteligente está mostrando acelerações elevadas e você não está sentindo nada, provavelmente tem grande chance de ser um erro de leitura do relógio.

A Associação americana do Coração (AHA) validou os dispositivos apenas quando registrarem gráfica e visualmente a arritmia do tipo Fibrilação Atrial, o que indica a necessidade de consulta cardiológica imediata.

Ao escolher seu relógio “smart”, lembre-se de que a maioria não é um dispositivo médico, e sim um simples registrador da pulsação (frequencímetros). Converse com seu cardiologista caso perceba ou sinta a arritmia ou algo parecido. O fato do registro nem sempre acertar se estamos com uma arritmia (na verdade erra em mais de 60%) mostra que o que vale são as queixas clínicas de palpitações e acelerações do coração.

No futuro, devem chegar aparelhos mais sofisticados, que registrarão os batimentos cardíacos e até quem sabe farão um eletrocardiograma, como faz o HOLTER. Mas sempre tire suas dúvidas com o cardiologista para não se tornar um hipocondríaco cardiológico.

* As informações e opiniões emitidas neste texto são de inteira responsabilidade do autor, não correspondendo, necessariamente, ao ponto de vista do GE / EuAtleta.com.