Blog da Andréia Sadi

Por Andréia Sadi

Apresentadora do Estúdio I, na GloboNews, comentarista de política da CBN e escrevo sobre os bastidores da política no g1


Secretário da Atenção Primária à Saúde, Raphael Câmara — Foto: Paula Bittar/MS

O secretário de Atenção Primária do Ministério da Saúde, Raphael Câmara, convocou uma audiência pública para semana que vem em que o objetivo oficial seria discutir uma nova cartilha com novas orientações sobre o aborto legal. O blog já havia antecipado a intenção do ministro Marcelo Queiroga de debater a cartilha atual – que ignora o estatuto legal da interrupção da gravidez no Brasil.

No Brasil, o procedimento não é considerado crime, pela lei, em três situações: estupro, risco de vida à mãe e, desde 2012, o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que a interrupção da gravidez é permitida para casos em que há má formação do cérebro em fetos.

O secretário do ministério, militante antiaborto, quer restringir no guia o acesso ao direito da mulher, ao estabelecer, por exemplo, o que seria o “rol de doenças que representam risco de vida para a mãe”, além de praticamente querer comprovar, com uma investigação policial, que a mulher foi estuprada antes de conceder seu direito a interromper à gestão.

Outro ponto é a desculpa do governo de querer discutir a “epidemiologia do aborto”: quais são, segundo o ministério, as principais causas de abortamento para tratar a causa.

Mas, no caso de estupro, as novas regras visam intimidar ainda mais as vítimas. Além da portaria de 2020, que orienta hospitais a avisarem autoridades policiais sobre o estupro – o que não prevê a lei – a discussão interna para a nova cartilha no ministério ainda coloca em dúvida a palavra da mulher sobre o abuso, segundo o blog apurou.

Por exemplo, o novo guia quer endurecer o procedimento para quando receber uma vítima de estupro, na prática, priorizando a investigação policial ao atendimento imediato, ao acolhimento à mulher violentada.

A audiência pública, como o blog revelou há um mês, já vinha sendo planejada como uma das medidas do governo parte de uma agenda ideológica.

Procurado pelo blog, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, disse que o governo não mexerá em questões previstas em lei, que isso não é é uma questão de saúde – mas que o secretário Câmara quer debater os critérios do aborto legal para, por exemplo, orientar hospitais.

“Queremos ajudar os hospitais a como procederem, em casos de aborto legal, e estudar a epidemiologia do aborto, para tratar as causas”.

Sobre submeter à vítima a um calvário para que ela explique, em detalhes, que foi estuprada e praticamente tenha que passar por uma nova violência para provar que foi estuprada antes de ter acesso ao seu direito, como explicam especialistas, Queiroga diz que “se uma mulher foi estuprada, esse estuprador precisa ser preso e o hospital precisa informar à polícia."

Além disso, Queiroga admite que o MS pretende colocar em debate “o que é o risco à saúde da mãe”, no aborto legal. “Por exemplo, podemos debater um rol de doenças. Se o médico sair do rol, ele vai ter de justificar o motivo para não ser punido”.

Para especialistas, essa eventual mudança vai ser mais uma barreira e intimidação ao trabalho médico, para cumprir a lei.

Por fim, Queiroga diz que o “aborto não pode ser método de planejamento familiar” no Brasil, que existem outros anticoncepcionais.

Como explicam estudiosos dos direitos das mulheres: a discussão é sobre perder direitos para aborto legal. Não há, por óbvio, como saber de antemão, prever que acontecerá um estupro.

O blog perguntou se, na audiência pública, haverá mulheres debatendo o tema. O ministro disse não saber mas que já participou de debates sobre partos no conselho de medicina em que só havia homens.

Veja também

Mais lidas

Mais do G1
Deseja receber as notícias mais importantes em tempo real? Ative as notificações do G1!