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Por Cláudio Marques — Para o Prática ESG, de São Paulo

Uma deficiência define uma pessoa? No mundo corporativo, empresas cada vez mais acreditam que não e criam programas não apenas para contratar profissionais com essa característica, incluindo pessoas com autismo, por exemplo, como também para desenvolver suas carreiras. Duas iniciativas marcadas para esta semana, em que se celebra o Dia Nacional da Luta da Pessoa com Deficiência nesta quarta-feira, 21, demonstram que o tema está na pauta das organizações: a terceira edição da Inclui PCD, feira online gratuita de empregabilidade para Pessoas com Deficiência (PCDs), realizada pela Egalite, e o lançamento, pelo Instituto Olga Kos, da Ecok – ferramenta com métricas para certificar empresas com políticas sociais inclusivas.

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Estima-se, com base em dados do último censo, que há no Brasil cerca de 45 milhões de pessoas com deficiência. Quando se faz o recorte de pessoas em idade de trabalho, esse número cai e pode chegar a 20 milhões. “Os últimos dados da RAIS falam em 489 mil pessoas incluídas no mercado de trabalho, e a Lei de Cotas gera cerca de 1 milhão de vagas. Então, estamos abaixo de 50% do que se poderia ter com base na legislação”, afirma Guilherme Braga, CEO da Egalite e da Inclui PCD, que acontece até esta quinta-feira (22). Neste ano, a feira oferece 9 mil vagas para PCDs. Segundo Braga, o objetivo do evento é colocar foco no protagonismo e na carreira das pessoas com deficiência. “É virar a página da lei de cotas”, acrescenta.

Trata-se, portanto, de se instalar uma mudança de cultura nas corporações, para que se passe a discutir talentos, competências e habilidades em vez de se pensar apenas no cumprimento de metas.

Fundador da Empodera, startup com 65 mil usuários inscritos que faz a conexão entre profissionais e empresas e possibilitou a contratação de dois mil profissionais, Leizer Pereira avalia que muitas vezes o responsável pela contratação vê nas pessoas apenas as limitações. “Ele não consegue enxergar onde está o potencial do profissional, os talentos que a pessoa possa trazer para a companhia”, afirma.

Autista, Geovana Pascarelli é estagiária na SAP — Foto: Arquivo Pessoal
Autista, Geovana Pascarelli é estagiária na SAP — Foto: Arquivo Pessoal

Há, entretanto, empresas mais avançadas nessa jornada pela inclusão de PCDs e já têm até programas para a inserção de pessoas com neurodiversidade, principalmente aquelas que se enquadram no transtorno do espectro autista (TEA). A ideia de neurodiversidade é a de que são as barreiras sociais as responsáveis por impor restrições às pessoas com deficiência. Rejeita, portanto, a visão patológica dessa condição, na qual estão incluídos vários transtornos: de desenvolvimento intelectual, de comunicação, de déficit de atenção, de dificuldade de aprendizagem, além do TEA, entre outros.

“Existem muitas pessoas autistas sendo incluídas no mercado de trabalho e entregando resultados fantásticos”, diz o CEO da Egalite. “Por outro lado, há necessidade de preparação da empresa, que precisa entender como lidar, por exemplo, com uma pessoa com autismo, como essa pessoa vai reagir em determinadas situações. Então, o conhecimento e a informação para o time que vai receber e incluir o profissional é fundamental para haver sucesso”, afirma Braga.

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E esse preparo deve começar justamente pelo time de seleção e pelo gestor da área onde está a vaga. Adriano Bandini, especialista em diversidade do Itaú, cujo grupo conta 56 pessoas com autismo em seus quadros, diz que a entrevista tem de ser feita de forma objetiva, sem grandes abstrações, porque uma pessoa com TEA pode não compreender o que se quer transmitir. “Se você quer algo mais complexo, é preciso dizer, por exemplo, que deseja que ela faça uma análise de um problema!”, afirma. Para ele, a objetividade na comunicação é a primeira e principal chave para que o processo ocorra de maneira positiva.

“As pessoas com autismo, por exemplo, não entendem muitas das nossas falas nas entrelinhas ou uma piada e, às vezes, até alguns contextos do que falamos”, diz Eliane de MItry, gerente de RH da SAP. Por isso, a inclusão envolve reconhecer e saber lidar com as peculiaridades desse público, para que ele se sinta acolhido e consiga desenvolver seu trabalho – o que ressalta a necessidade de se treinar o time com quem a pessoa vai lidar.

Acolhimento

Aos 21 anos e portadora de uma forma leve de autismo, Geovana Pascarelli é estagiária há um ano na SAP, multinacional de origem alemã de softwares e soluções em nuvem. Estudante de computação, ela trabalha na área de pré-vendas, das 10h às 17h, e diz que espera ser contratada. "Minhas funções incluem auxiliar outros membros do meu time com seus projetos e tarefas. No momento, trabalho mais em desenvolvimento, criando aplicativos e processos que possam ajudar os nossos clientes e a SAP", diz a jovem.

Ela conta que pretende ter experiências no desenvolvimento de softwares, em chat bots, processos automáticos e também na área de análise de dados. Afirma que sua experiência está sendo “incrível”. “O time me acolheu de braços abertos. Quando tenho dificuldades de aprender, o grupo me lembra que sou parte do time e que eu faço diferença”, relata. Ela já trabalhou antes como caixa de uma pizzaria.

De MItry, da SAP, conta que o processo de contratação começa com um trabalho de sensibilização com o gestor da área, para prepará-lo para a convivência com as necessidades e peculiaridades de uma pessoa com autismo. Também é avaliado quais atividades a pessoa poderia desenvolver e, definido o perfil, a Fundação Specialisterne, organização sem fins lucrativos que oferece treinamento em tecnologia e em habilidades sociolaborais para portadores de autismo, apresenta uma pessoa com as características desejadas já treinada e que considera em condições de preencher o posto.

No Itaú, depois que uma pessoa é contratada, há acompanhamento todo o tempo – é o que se chama de Emprego Apoiado. “É para acompanhar como a pessoa e a gestão estão se adaptando, e quando há o ciclo de performance, temos esse canal de apoio, que vai ser a base para a pessoa com autismo dizer se ela está confortável, se tem alguma angústia e ela consegue trabalhar e resolver isso”, afirma Bandini.

Ele lembra que há pessoas com autismo que são mais introspectivas e vão querer ficar num lugar sozinhas, outras precisam estar em um lugar sem ruídos porque muitas delas se sentem incomodadas num lugar com ruídos. “Cada um é um, então a gestão tem de conhecer essa pessoa, para conseguir adequar o trabalho ao melhor método para ela”, declara Bandini.

 André Marinho, assistente de Supervisão de Operações do Command Center da EY América Latina Sul. — Foto: Arquivo Pessoal
André Marinho, assistente de Supervisão de Operações do Command Center da EY América Latina Sul. — Foto: Arquivo Pessoal

Por trás de todos esses cuidados está a percepção de ainda não sabemos lidar com uma pessoa com autismo. E, às vezes, nem mesmo a pessoa com TEA tem conhecimento de sua condição e só a descobre quando já adulto. É o caso de André Marinho, de 46 anos, que somente em 2019 soube que tinha autismo – depois de ter casado, se tornado pai (tem uma filha de 15 anos), se separado e ter exercido diversas atividades, como office boy na empresa do pai, fazer inventário de estoque na Americanas, em Fortaleza, e até ser frentista.

Quando o relacionamento com a esposa começou a ficar difícil, voltou para São Paulo e arranjou emprego em uma indústria de alimentos. Mas ficou pouco tempo nessa empresa, porque foi descoberto pela EY, onde hoje é assistente de Supervisão de Operações do Command Center da EY América Latina Sul. Ele diz que agora descobriu o que queria em termos profissionais. “Pretendo chegar ao topo e ajudar outras pessoas”, afirma.

Tecnologia

Maithê Paris, líder em Diversidade, Equidade e Inclusão e Responsabilidade Corporativa da EY para América do Sul, conta que há três anos a empresa vem participando de um hackathon chamado Autismo Tech, um movimento que reúne pessoas com transtorno do espectro autista para qualificação e empregabilidade, com foco em inovação e competências de mercado. A partir dessa experiência, no ano passado surgiu a ideia de contratar pessoas com TEA, que se materializou na criação do Analytics Hub, um centro voltado a desenvolver e tornar esses profissionais aptos a trabalhar na área de tecnologia da empresa.

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A executiva opina, com base no contato com consultorias, que existe predileção de pessoas com TEA para atuar na área de tecnologia. “Mas também pensamos em outras características que podem se repetir em pessoas com autismo como a capacidade autodidata, a facilidade com processos rotineiros e também a grande atenção a detalhes. Elas consideram essas qualidades como uma aptidão e uma área em que eles querem se desenvolver e atuar”, afirma. No entanto, Bandini alega que, na verdade, alguns graus de autismo acabam desenvolvendo na pessoa o hiperfoco, que faz com ela dedique muito tempo a estudar e praticar o que lhe interessa, que não é necessariamente a tecnologia. “A característica é o hiperfoco”, reforça.

Com a criação do Analyutics Hub, a EY fez, então, um piloto, contratando sete profissionais com o apoio de uma consultoria especializada em pessoas neuroatípicas. Com o suporte dessa empresa, são desenvolvidas ações voltadas à inclusão do profissional envolvendo o próprio colaborador, a sua família – para melhor entender suas dificuldades e potenciais – e o gestor que vai estar à frente do profissional.

A elaboração de um ambiente inclusivo também passa pela preparação da equipe que irá atuar com ele. E quando a pessoa com neurodiversidade chega à empresa, é designado um buddy, que vai ajudá-la a desenvolver sua rede de networking e conhecer os processos das empresas. Há também um conselheiro, que vai atuar como seu mentor de carreira. “Todos que contratamos no ano passado permanecem na empresa. Isso nos deixou satisfeitos e pretendemos dobrar o número de contratações ainda neste ano fiscal, que se encerra em junho de 2023”, diz a diretora da EY.

A inserção não seria completa se os colaboradores com TEA não tivessem oportunidade de crescimento profissional. Por isso, tanto EY quanto Itaú e SAP possuem programas de carreira para as pessoas com neurodiversidade. Bandini lembra dos ganhos que os neuroatípicos podem dar para uma empresa. De acordo com ele, a comunicação da área melhora, em decorrência do exercício para haver uma forma de comunicação mais objetiva para que uma pessoa neurodiversa seja capaz de entender adequadamente e executar seu trabalho.

“Quando se faz isso, a eficiência aumenta, há discussões mais adequadas, uma pessoa ouve a outra antes de falar. Eleva a equipe para um outro patamar”, defende. Ao mesmo tempo, se o gestor e a liderança entendem que o método de trabalho, ao ser aprimorado, proporciona evolução e simplificação da maneira de atuar. “O que também traz valor para a organização”, acrescenta Bandini.

Ecok

Na sexta-feira, dia 23, o Instituto Olga Kos (IOK) vai lançar oficialmente, durante o I Summit de Responsabilidade Social, a ferramenta Ecok, ou Escala Cidadã Olga Kos. Trata-se de um instrumento que tem por objetivo mensurar, a partir da identificação, monitoramento e avaliação, de como a inclusão é praticada no mercado de trabalho.

A partir de 5 variáveis (arquitetônica, atitudinal, de comunicação, metodológica e programática), 20 indicadores e 37 requisitos avalia-se o quanto uma empresa é inclusiva e a qualidade destes ambientes para todas as diferenças, sejam elas por gênero, idade, deficiência, etnia, religião, nacionalidade, orientação sexual ou qualquer outro fator de exclusão. “Os indicadores e requisitos foram definidos por meio de uma métrica binária e de uma entrevista também binária. Assim, rodamos o algoritmo e certificamos em qual grau de inclusão a empresa está”, diz Wolf Kos, fundador e presidente do IOK. Todos os processos para adesão ao selo serão divulgados durante o I Summit de Responsabilidade Social.

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