Política Lei da Anistia

Ex-ministro do STJ diz que lei da Anistia foi modificada e permite punição de torturador

Alteração feita em 1986 estaria passando despercebida pelo crivo de juízes e tribunais
O ex-ministro do STJ Gilson Dipp Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo
O ex-ministro do STJ Gilson Dipp Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo

BRASÍLIA - O ex-ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de  Justiça (STJ), afirmou nesta quarta-feira que uma brecha na lei da Anistia pode facilitar a investigação e a punição de agentes do Estado envolvidos em sequestro, tortura e desaparecimento forçado de militantes políticos, entre outros crimes. Segundo Dipp, a janela para a punição de crimes deste tipo foi aberta com a aprovação da emenda constitucional º 26, de 1986. A mudança, pequena, mas importante, estaria passando despercebida pelo crivo de juízes e tribunais que tem tratado do assunto.

— A abrangência da Lei de Anistia hoje não é a mesma de quando ela foi aprovada pelo Congresso Nacional — afirmou Dipp.

O ex-ministro se aposentou do STJ depois de completar 70 anos de idade, há duas semanas. Dipp se tornou uma referência sobre aspectos jurídicos da lei de Anistia no período em que participou da Comissão Nacional da Verdade. O ex-ministro já deixou a comissão, mas permanece fazendo estudos sobre a questão. A lei 6.683, a chamada lei de Anistia, previa o perdão para crimes políticos e crimes conexos "de qualquer natureza" cometidos entre 1961 a 1979. A emenda 26, aprovada sete anos depois, exclui a expressão "de qualquer natureza".

Com a exclusão deste detalhe, que dava larga abrangência à anistia, juízes e tribunais não poderiam mais suspender investigações ou barrar ações penais com o pretexto de que o perdão seria irrestrito, não importa a gravidade ou o tipo crime.

— Quem define o que seja crime conexo é o Código de Processo Penal, quando examina o instituto da conexão com aqueles requisitos : crimes praticados nos mesmos lugares, pelas mesmas pessoas pela mesma motivação. O que estiver fora, abre-se uma oportunidade para o Judiciário se manifestar com essa interpretação, que não é a interpretação que vem tendo alguns órgãos jurisdicionais inclusive, por enquanto, o Supremo Tribunal Federal — disse Dipp.

Numa decisão sobre a questão, o STF entendeu que a lei de Anistia foi contemplada pela Constituição de 1988. O resultado tem sido interpretado como reconhecimento definitivo da lei pelo STF e, por consequência, o perdão sem aos crimes cometidos pela repressão durante a ditadura. Dipp sustenta, no entanto, que o texto validado pela Constituição é aquele que sofreu emenda em 1986 e não o texto original, de 1979.