Série ASérie BEuropa

- Atualizado em

Lenny diz que 'faltou proteção' do Flu e admite dívida com o Palmeiras

'Nunca vi rato no Fluminense, mas já vi gambá', revela o atacante, que vem
de uma sequência de lesões e ainda não fez sua estreia pelo Figueirense

Por Rio de Janeiro

lenny família (Foto: Arquivo Pessoal)Lenny foi criado pelos avós, Zino e Eneida. Força
para superar a maré ruim (Foto: Arquivo Pessoal)

A palavra superação já se tornou comum dentro do meio esportivo, mas nem por isso pode deixar de ser valorizada. Ronaldo é o caso mais clássico. O Fenômeno precisou vencer graves lesões, a desconfiança da maioria e as perspectivas de que jamais voltaria a render bons frutos no futebol. É nele que se espelha o atacante Lenny, que aos 23 anos passa por problema similar. Há tempos enfrentando uma sequência de lesões, o jogador chegou ao Figueirense no terceiro dia do ano e ainda não conseguiu fazer sua estreia oficial. No último sábado, ele esteve em campo durante 60 minutos em um jogo-treino contra o Americana-SP e marcou seu primeiro gol com a camisa alvinegra no empate por 2 a 2.

Em entrevista ao GLOBOESPORTE.COM, Lenny falou sobre o início no Fluminense, a passagem devedora no Palmeiras, a experiência no futebol português e a expectativa para o recomeço no Figueira, clube com o qual tem contrato até o fim do ano. O atacante, cujos direitos estão vinculados à Traffic, revelou que precisou superar até uma depressão por causa das seguidas contusões e confirmou a estreia pela equipe catarinense, enfim, para a primeira rodada do Campeonato Brasileiro, contra o Cruzeiro, no dia 22.

- Se até lá não acontecer nada - faz a ressalva.

Confira abaixo a entrevista completa:

Qual a sua expectativa para a estreia pelo Figueirense? Vai ser contra o Cruzeiro mesmo?

Sim, se até lá não acontecer nada, vai ser contra o Cruzeiro. Eles vinham atropelando todo mundo, mas agora tiveram essa infelicidade contra o Once Caldas na Libertadores. Espero que continuem assim pelo menos até a primeira rodada do Brasileiro (risos).

Em relações às lesões, está totalmente recuperado? Como está a questão física?
Totalmente. Para mim está sendo muito bom. Já estou conseguindo fazer a jogada que é característica minha, de arranque. O pessoal da comissão técnica até brinca comigo: "Tem jogador novo aí?".

Quantas lesões você sofreu? Você se sente azarado por causa disso?
Minhas lesões foram todas juntas. Operei o pé e o joelho recentemente. A última foi na parte muscular. Não me sinto azarado, pelo contrário. E não sei se posso falar que foram falhas do departamento médico. Foram coisas muito seguidas, por isso fiquei tanto tempo sem jogar.

Em algum momento pensou em desistir? Ficou depressivo? Como fez para superar?
Fiquei depressivo, sim. Mas minha vontade maior é estar em campo. Na hora (da lesão) tem aquele baque, mas a vontade supera tudo.

lenny figueirense (Foto: Divulgação/Site Oficial)Sob os olhares do técnico Jorginho, Lenny mostra disposição no treino (Foto: Divulgação/Site Oficial)

Como foi sua rotina nesse tempo parado? Passou a fazer alguma coisa diferente?
A cidade é pequena, não tem tanto o que fazer. Não tem tantas opções como no Rio de Janeiro e em São Paulo. Como existe uma expectativa grande em torno da minha estreia, eu ia a algum lugar e ouvia sempre as mesmas perguntas. Já estava chato. Não tenho dado entrevista para cá (Santa Catarina) porque os repórteres daqui estavam falando muita besteira. Tinha um cara só, que é o que vai lá sempre, está de manhã e à tarde. Os outros não estão lá sempre e querem falar besteira. O jornalista tem o poder da palavra. Às vezes se fala mentira e as pessoas acreditam. Têm que ter mais cuidado com o que falam. Disseram que saí aqui na noite, mas é mentira.

Você atingiu o sucesso muito rápido. Acha que isso pode ter te prejudicado?
Eu sou novo, mas já passei por muita coisa. As pessoas me veem como experiente, não acreditam que eu tenho 23 anos, porque já apareço na televisão há alguns anos. É o que eles dizem. O que aconteceu de errado, por exemplo, foi eu não ter tido uma proteção por parte da assessoria de imprensa do Fluminense. Eu estava sempre botando a cara, mesmo com Pet e Tuta no elenco. Na época eu era considerado o craquezinho do time. Só que não tinha caixa para suportar, tinha acabado de fazer 18 anos. O Fluminense não era tão estruturado. Você vê o Lucas no São Paulo, o moleque se destacou e não tinha nada falando dele. Outra coisa foi ter ido para o Braga-POR. Cheguei e estava bem demais lá, mas mudou o técnico, a comissão. O técnico que chegou era de handebol. Quando se está bem, o barco segue reto. Quando não, cai em alguém. Isso foi o que aconteceu comigo. Comigo mais ainda porque eu era novo e tive muita pressão.

Eu estava sempre botando a cara, mesmo com Pet e Tuta no elenco. Na época eu era considerado o craquezinho do time. Só que não tinha caixa para suportar, tinha acabado de fazer 18 anos"
Lenny, sobre a passagem pelo Fluminense

Acha que agora está mais maduro em relação ao início da carreira? Por quê?
Acho que já passei por muitas coisas, já aprendi muito. Sou um cara que gosto de olhar as coisas certas e erradas. Você só cresce se olha o seu erro. Só falta eu estar bom para entrar em campo e jogar. Não tem como crescer mais sem jogar. Para provar que você cresceu, tem que estar em campo. Eu chutava mal de esquerda para caramba, por exemplo. Hoje já estou bem melhor.

Como está o ambiente no Figueirense?
É tranquilo. A expectativa em torno da minha estreia é grande. Os outros jogadores me perguntam: "E aí, vai entrar para a guerra com a gente ou não?". Antes era a torcida, agora já virou coisa dos jogadores. "Vai ficar só vendo?", dizem eles. Eles já estão loucos para me ver em campo, e eu mais ainda. Os que eu tenho mais contato são o Reinaldo, o Breitner e o Maicon.

Você passou pelo Fluminense, com jogadores pagos pelo clube e outros pagos pelo patrocinador, e pelo Palmeiras, em uma época de racha político. Até que ponto o elenco se sentia afetado com essas questões?
No Fluminense eu não recebia pela Unimed, e sim pelo clube, mas no campo você não se liga nisso. A parte do Fluminense atrasava, e a da Unimed, não. No Palmeiras todo mundo recebe igual. Os caras que recebem cobram da diretoria os salários atrasados. Eles já foram moleques e ganharam pouco. Eles querem que os caras também recebam. Uma vez estava atrasado no Palmeiras, mas você entende. É muito gasto, quando acontece de atrasar um mês, dá para entender tranquilo. Se pudesse não atrasar o dos funcionários... Melhor atrasar o nosso, mas o deles não. Mas cada um faz seu contrato. Se você pedir 100 e tiver alguém para te dar, mérito seu. O jogador que se escala. Ele chega para jogar, mas se vai manter ou não é diferente.

lenny família (Foto: Arquivo Pessoal)Lenny com Daniela, com quem namora há cinco
anos (Foto: Arquivo Pessoal)

Como compara a estrutura do Figueirense às de Fluminense e Palmeiras?
A estrutura do Palmeiras é muito boa. Lá é tudo favorável. No Fluminense, pode ser melhor. O Figueirense tem CT, é grande, com muitos campos, e me falaram que querem melhorar muito ainda. Espaço necessário para isso, tem. Não é o melhor, não é igual ao do Palmeiras, mas é bom. Mas eles estavam há dois anos na Segunda Divisão, então você tem menos receita, menos torcida. Sou grato demais ao Fluminense e ao Palmeiras, quero que eles cresçam, torço por eles. Queria que o Fluminense tivesse um CT bom, no Recreio, na Barra, que é onde a maioria dos jogadores mora. Xerém é muito longe, não é uma solução. Se não tivesse a Unimed lá, o Fluminense não seria o mesmo. Os caras têm só um campo para treinar. Vão se machucar porque o campo não vai durar. Achava a aparelhagem boa, mas, quando cheguei ao Palmeiras, vi o que era aparelhagem boa mesmo. E isso ajuda, se você se machuca, volta mais rápido. O Léo Lima me falou uma vez que o refeitório do São Paulo oferecia vários tipos de carne: filé mignon, alcatra... Eu fiquei impressionado.

Muricy Ramalho fez duras críticas à estrutura do Fluminense quando saiu de lá. O que você tem a dizer? Viu rato no vestiário também?
Nunca vi rato no Fluminense. Jogava lá desde os sete anos. Lá em cima na sede, perto das quadras de futsal, tem muito gambá que fica em uma florestazinha perto. Quando treinava à noite, a gente via gambá, mas rato nunca vi.

Sente saudade do assédio?
No Rio tem assédio, mas é bem menor do que em São Paulo. No Palmeiras era maior. Os caras em São Paulo respiram futebol. No Rio, não, talvez pela questão de ter muito ator, cantor, talvez o futebol não fique em primeiro plano. Aqui (em Florianópolis), o assédio também é grande, a cidade é pequena, só tem dois times, você chega de fora e é sempre reconhecido.

Como foi sua experiência lá fora, no Braga-POR?
Foi uma experiência curta, mas boa. Tive uma noção de vida lá fora, que é completamente diferente. Dá para o cara se adaptar legal, a não ser que seja muito ligado aos amigos e à família. A cobrança lá é tranquila. Aqui você tem que ganhar sempre. Aqui o jogador é tratado como máquina. Lá, não. Você é ídolo, te tratam como ser humano.

Cresci e evoluí, mas as pessoas ainda não viram. Vão ver agora quando eu começar a jogar.
Vou mostrar isso neste ano"
Lenny

Você se sente frustrado por não ter conseguido emplacar em um time grande?
Vir para cá foi uma opção minha. Poderia ter seguido no Palmeiras. Voltava de lesão no joelho. E eu tenho como característica usar muito a força e a agilidade. Quando estou arracando, breco e já arranco de novo. Uma lesão no joelho para um cara como eu é dificil por eu ter essas características. O atacante está toda hora trombando com o zagueiro. Achei que aqui seria mais tranquila essa minha volta. Vim para cá confiando em mim. Estava em um time maior, com uma mídia maior, onde você é muto mais visto. Vim para ter mais tranquilidade para meu recomeço. Aqui vou ter plenas condições para atingir de novo um nível de topo. A resposta lá (Rio e São Paulo) tem que ser mais rápida por causa da cobrança, que é maior.

Pensa em um dia voltar para Fluminense ou Palmeiras?
Penso, sim. Falei isso no Palmeiras recentemente. Sou muito grato ao Palmeiras. Tive duas lesões sérias lá, operei e fiquei bom pelo fato de os médicos de lá serem bons, por darem o amparo que deram. Saí de lá sentindo que fiquei devendo. Não aconteceu de eu não ter jogado porque não quis. Eu não pude. Se tivesse jogado lá e tivesse jogado mal, seria uma coisa. Mas outra coisa é você estar em um lugar e não poder fazer aquilo de que gosta. Do Fluminense eu saí muito novo. Hoje teria muito prazer em voltar mais adulto.

Sonha com a Seleção Brasileira?
Sonho mesmo. Acho que é uma coisa bem possível. As pessoas falam que comecei bem e caí, mas depois de cair você sobe de novo. Falta para mim subir de novo. Tenho muito a percorrer ainda. Cresci e evoluí, mas as pessoas ainda não viram. Vão ver agora quando eu começar a jogar. Vou mostrar isso neste ano.

Ainda é lembrado por aquele golaço contra o Cruzeiro (2 x 3 Fluminense, pelas quartas de final da Copa do Brasil de 2006). Mesmo em pelada, já fez um mais bonito?
Na base (do Fluminense) e no Palmeiras (veja no vídeo ao lado), já fiz alguns lances daquele. Eu jogo mais pela esquerda, tenho essa característica de vir correndo com a bola. No Palmeiras fiz umas quatro jogadas assim. Acho que os gols assim, em que o jogador conduz a bola, são os mais bonitos. Os principais gols que gosto de ver do Ronaldo (Fenômeno) são esses em que ele conduz a bola.

Imagina como seria a sua carreira se não tivesse tantas lesões?
Poderia estar na Europa. Ninguém olha para mim e diz: "Esse cara é ruim". Olham para mim e veem que tenho potencial, tenho o que mostrar. Penso que estaria bem, mas talvez não tivesse tido o aprendizado que tive enquanto estive parado, porque pensei muito. Não digo que gostei de me machucar, mas acho que poderia não ter crescido tanto. Em 2008, por exemplo, fui mal, mas em 2009 fui bem. Passei olhando o que eu errei nesse intervalo de tempo. Vi o que errei e melhorei nesses aspectos. Você tem que ver os seus erros sempre. Foi um grande aprendizado.

Se fizer um gol na estreia oficial, vai dedicar para alguém em especial?
Vou dedicar para a minha familia, meu avô, minha avó, namorada, as pessoas que merecem. É neles que acabo descontando meu estresse por não estar jogando. Quando estou jogando, estou mais tranquilo, mais calmo.