Saúde

Excesso de ácido fólico na gravidez aumenta risco de autismo, diz estudo

Nutriente é importante para o desenvolvimento do feto, mas apenas na dose certa
Manifestação inédita partiu de quatro representantes das Nações Unidas Foto: Divulgação
Manifestação inédita partiu de quatro representantes das Nações Unidas Foto: Divulgação

RIO — Mulheres grávidas ou que pretendem engravidar são aconselhadas a ingerir bastante folato, uma vez que a substância estimula o desenvolvimento neurológico do feto. Para isso, muitas futuras mães são orientadas a comer alimentos ricos em folato e a tomar suplemento de ácido fólico, que é a versão sintética desse nutriente. Entretanto, o consumo excessivo da substância pode aumentar o risco de autismo no bebê. É o que diz um estudo da Escola Bloomberg de Saúde Pública da Universidade John Hopkins, nos EUA.

De acordo com os cientistas que coordenaram a pesquisa, níveis de folato quatro vezes mais altos do que o considerado adequado na mãe logo após dar à luz estão associados a um risco duas vezes maior de o filho desenvolver Transtorno do Espectro Autista.

O folato é uma vitamina B, encontrada naturalmente em frutas e vegetais. Sua versão sintética, o ácido fólico, é usada para enriquecer cereais e pães, além de se constituir num suplemento vitamínico bastante popular.

Níveis altos de vitamina B12 também podem ser prejudiciais em grávidas, triplicando o risco de o feto desenvolver autismo, dizem os estudiosos. Se ambos os nutrientes — folato e vitamina B12 — estiverem em excesso, o risco de uma criança desenvolver a doença aumenta 17,6 vezes.

— A suplementação adequada é protetora: isso ainda é o caso com o ácido fólico e o folato em geral. Sabemos há muito tempo que a deficiência de folato em mulheres grávidas é prejudicial para o desenvolvimento dos filhos, mas o que esse novo estudo nos diz é que quantidades excessivas também podem causar danos. Nós devemos buscar níveis ideais deste importante nutriente — diz uma das autoras do estudo, Daniele Fallin, diretora do Centro para Autismo e Deficiências do Desenvolvimento da Escola Bloomberg.

As conclusões do estudo serão apresentadas na próxima sexta-feira, durante o Encontro Internacional para Pesquisa sobre Autismo de 2016, em Baltimore, nos EUA.

Para chegar aos resultados divulgados, os cientistas analisaram dados de 1.391 pares de mães e filhos da cidade americana de Boston. O grupo analisado era formado, principalmente, por pessoas de baixa renda. As mães foram recrutadas no momento do nascimento do filho, e acompanhadas por vários anos, entre 1998 e 2013, com seus níveis de folato no sangue verificados.

Os pesquisadores descobriram que uma em cada dez mulheres tinha o que é considerado uma quantidade excessiva de ácido fólico (mais de 59 nanomoles por litro), e 6% tinham uma quantidade excessiva de vitamina B12 (mais de 600 picomoles por litro).

ATÉ 45,3 NANOMOLES OU 400 MICROGRAMAS POR DIA

A Organização Mundial de Saúde (OMS) diz que entre 13,5 e 45,3 nanomoles por litro é uma quantidade adequada de folato — ou ácido fólico — para uma mulher em seu primeiro trimestre de gravidez. Já quanto à vitamina B12, não existem limites bem estabelecidos.

No Brasil, o Conselho Federal de Medicina (CFM) aprovou, em 2013, uma recomendação orientando as mulheres a usarem o ácido fólico antes da concepção e nos três primeiros meses da gravidez. A medida atendeu uma solicitação da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo). A ingestão dessa vitamina, segundo as entidades, pode reduzir em até 75% o risco de má formação no tubo neural do feto, o que previne casos de anencefalia, paralisia de membros inferiores, incontinência urinária e intestinal nos bebês, além de diferentes graus de retardo mental e de dificuldades de aprendizagem escolar. É recomendada a ingestão de 400 microgramas por dia.

O folato é essencial para o crescimento celular e promove o desenvolvimento neurológico. E, apesar deste esforço para garantir que as mulheres obtenham uma quantidade adequada de folato, algumas ainda não recebem o suficiente — ou o nutriente é absorvido de forma incorreta pelos seus corpos —, levando a deficiências neurológicas. Segundo os Centros para Controle e Prevenção de Doenças dos EUA, uma em cada quatro mulheres em idade reprodutiva naquele país tem níveis de folato insuficientes.

Além disso, uma em cada 68 crianças nos EUA nasce com autismo. Meninos são cinco vezes mais propensos do que meninas. As causas ainda não estão claras, mas a pesquisa sugere que os fatores são uma combinação de genes e do ambiente em que a criança está inserida. A síndrome é uma condição do desenvolvimento neurológico caracterizada por uma alteração social, de comunicação e de comportamento anormais, repetitivos ou incomuns.

No estudo da John Hopkins, a grande maioria das mães relataram ter tomado multivitaminas, o que incluía ácido fólico e vitamina B12, durante toda a gravidez. Mas os pesquisadores dizem que não sabem exatamente por que algumas das mulheres tinham níveis tão elevados no sangue. Pode ser que, além de comer muitas frutas e vegetais com folato, elas tenham consumido em exagero alimentos fortificados com ácido fólico ou suplementos. Ou, afirmam eles, pode ser que algumas mulheres sejam geneticamente predispostas a absorver maiores quantidades de folato ou metabolizá-lo de forma mais lenta, levando ao excesso. Pode ser, ainda, uma combinação dos dois fatores.

O senso comum diz que suplementos vitamínicos não são prejudiciais, mesmo em excesso, porque o organismo expulsaria o excedente. No entanto, isso não pode ser o caso com o ácido fólico e a vitamina B12, indica o estudo.

É necessária mais investigação, dizem os cientistas, para determinar o quanto de ácido fólico uma mulher deve consumir durante a gravidez para ter a melhor chance de garantir a saúde de seus bebês.

— Nós dizemos às mulheres para ter certeza de que estão ingerindo ácido fólico no início da gravidez. Mas o que precisamos descobrir agora é se deve haver recomendações adicionais sobre qual é a dose ideal desse nutriente durante toda a gestação — afirma Ramkripa Raghavan, uma das autoras da pesquisa e membro do Departamento de População, Família e Saúde Reprodutiva da Escola Bloomberg da Universidade John Hopkins.