Política

'Amigos de longa data me lançaram no vale dos leprosos', diz Geddel em depoimento

Acusado de tentar impedir delação, ex-ministro tinha dito em julho de 2017 que foram mais de dez telefonemas ao longo do ano
O ex-ministro Geddel Vieira Lima em 02/06/2016 Foto: Jorge William / Agência O Globo
O ex-ministro Geddel Vieira Lima em 02/06/2016 Foto: Jorge William / Agência O Globo

BRASÍLIA - Após afirmar em julho de 2017 que teria ligado mais de dez vezes ao longo de um ano para Raquel Pitta, mulher do delator Lúcio Bolonha Funaro , o ex-ministro Geddel Vieira Lima disse nesta terça-feira não se recordar exatamente de quantos telefonemas foram feitos. Geddel, que está preso desde setembro do ano passado, é réu por obstrução de justiça. Ele é acusado de ter tentado impedir que Funaro, apontado como operador de políticos do PMDB em esquemas de corrupção, firmasse um acordo de delação.

— O senhor me perguntou se eu tinha certeza do número de ligações. Eu não tenho esse número. Está feita a retificação — disse Geddel.

Em julho de 2017, ao ser preso pela primeira vez e ao responder questionamento do procurador da República Anselmo Lopes, o ex-ministro afirmou que falou mais de dez vezes com Raquel ao longo do último ano. Nesta terça-feira, ele também voltou a negar que tenha tentado impedir a delação de Lúcio Bolonha Funaro. Geddel citou uma mensagem de Funaro, segundo a qual ele teria dito: "diga ao Geddel se não resolver isso eu vou f... ele com o Michel". Seria uma prova de que não é verdade a declaração do operador de que sentia receio do primeiro escalão do governo do presidente Michel Temer.

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— Fico eu a perguntar: como alguém que tinha o poder de me f... com o Michel poderia ter algum receio ou o constrangimento de que eu pudesse, junto a Michel, lhe causar algum tipo de dano? — questionou.

Preso desde setembro do ano passado, ele reclamou do abandono dos amigos:

— Amigos de longa data me lançaram no vale dos leprosos.

Os investigadores do caso afirmam que, entre maio e junho de 2017, Geddel enviou mensagens à esposa de Lúcio Funaro, Raquel Pitta Funaro. Ela entregou cópias da tela do aplicativo. Nas mensagens, Geddel é identificado como "Carainho". Para o MPF, "os novos elementos deixam claro que Geddel continua agindo para obstruir a apuração dos crimes e ainda reforçam o perfil de alguém que reitera na prática criminosa".

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Também negou ter oferecido vantagem a Funaro, que foi preso em julho de 2016, ou a sua mulher. Geddel disse ainda que nunca tratou de negócios com o operador, nem se lembra exatamente de como o conheceu.

— Essa memória fantástica só vejo em elefante ou delator — ironizou Geddel.

Em audiências realizadas em novembro do ano passado, Funaro e Raquel relataram que Geddel fazia ligações constantes para ela. Ao ser questionado, porém, se Raquel chegou a lhe reportar se Geddel havia feito alguma ameaça, ele disse que não. Também negou ter recebido promessa de dinheiro do ex-ministro.

Raquel disse que até quis parar de atender os telefonemas, mas Lúcio alertou que isso poderia levantar suspeitas e fazer com que Geddel desconfiasse de que ele estaria tentando fazer uma delação. Por outro lado, Raquel afirmou que o ex-ministro sempre foi gentil e não cravou que as ligações representassem um tipo de ameaça ou intimidação.

Nesta terça-feira, Geddel disse se tratar de conversas "humanitárias".

— Era "como vai", "isso vai passar" — contou o ex-ministro.

Durante a audiência, por orientação da defesa, Geddel se recusou a responder as perguntas do Ministério Público Federal (MPF). Agora, o MPF tem cinco dias para apresentar suas alegações finais. Segundo o procurador da República Anselmo Lopes, responsável pelo caso, a intenção é apresentar esse documento até sexta-feira, antes do Carnaval. Depois disso, a defesa tem mais cinco dias para se manifestar. O crime de obstrução de investigação dá pena de três a oito anos de prisão.

— Pelo papel na organização criminosa, deve ser uma pena mais alta.