Economia

TST suspende andamento de processos trabalhistas que discutem redução de direitos por acordo coletivo

Decisão da Corte afeta até 60% dos processos no país, segundo estimativa de um dos ministros
Carteiras de trabalho Foto: Leo Martins/Agência O Globo/05-05-2017
Carteiras de trabalho Foto: Leo Martins/Agência O Globo/05-05-2017

BRASÍLIA - O Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu suspender a tramitação de ações trabalhistas que tratam da validade de normas coletivas que limitam ou restringem direitos não garantidos pela Constituição. A decisão suspende, na prática, até 60% dos processos em tramitação no país, à espera de um posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) a respeito do tema, segundo estimativa de um ministro. A informação foi publicada pelo jornal “Valor Econômico” e confirmada pelo GLOBO.

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A decisão do TST ocorreu por causa de um processo que chegou ao Supremo em julho, a respeito de um acordo coletivo que reduziu o pagamento das chamadas horas in itinere , pagas em função do tempo de deslocamento do trabalhador.

Ao relatar um recurso do processo, o ministro Gilmar Mendes determinou, por liminar, que todas as ações que tratem de redução de direitos por meio de negociação coletiva fossem suspensas até uma decisão do plenário do STF.

Na sessão da última quinta-feira da subseção que trata desse tipo de tema, os ministros do TST entenderam que o entendimento do Supremo se aplicava a outra ação, em que um empregado de Brasília discutia a revisão das regras de pagamento de horas extras por meio de norma coletiva.

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O ministro do TST Cláudio Brandão apresentou questão de ordem para discutir se a matéria poderia ser abrangida pela liminar de Gilmar Mendes.

O colegiado concordou com essa tese e, por maioria, decidiu suspender todas as ações que contestam a redução de direitos por acordo. De acordo com o "Valor", o ministro Vieira de Mello, voto vencido, chamou atençao para o fato de que a medida afetaria de 40% a 60% de todas as ações em tramitação no país.

Vantuil Abdala, ex-presidente TST, calcula que, somente em instâncias superiores, são mais de duas mil ações tramitando sobre o tema. Embora concorde que o assunto precise de um entendimento geral para dar mais segurança jurídica nas relações de trabalho, Abdala lembra que muitos trabalhadores poderão ser prejudicados na medida em que a maior parte das ações trabalhistas não versam sobre um único tema. Segundo ele, verbas devidas poderão demorar mais a serem pagas.

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— Um entendimento de repercussão geral já resolve a questão como um todo e, por isso, é muito razoável aplicar a abrangência para evitar um mal maior de questionamentos futuros e para dar segurança jurídica. O tema delicado porque as ações trabalhistas não reclamam sobre um tema único, em geral elas pedem diversos direitos. Como a decisão suspende todas as ações sobre acordo coletivo, há muitos processos em que o trabalhador questiona o acordo, mas reivindica também o recebimento de verbas básicas, como pagamento de décimo terceiro salário, aviso prévio, férias. É uma lástima — explica Vantuil Abdala.

O ex-presidente do TST acrescenta, no entanto, que o grande volume de processos suspensos em todo país, o STF poderá acelerar a discussão definitiva.

— Acredito que vai estimular o Supremo a julgar esta ação para que se resolva a estas milhares de ações que não podem ficar indefinidamente suspensas. Há inúmeros trabalhadores e empresas interessados que o processo termine. Algumas empresas, por exemplo, fazem contingenciamento daquele valor que está sendo discutido em juizo — lembra Abdala.

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Aprovada em 2017, a reforma trabalhista abriu espaço para que acordos coletivos se sobreponham à legislação. As exceções a esse novo entendimento foram os dispositivos previstos na Constituição, como salário mínimo, décimo terceiro e direito a férias anuais. Outros temas, no entanto, como banco de horas, enquadramento de grau de insalubridade e participação nos lucros, foram elencados como de livre negociação.

A medida, no entanto, abriu espaço para que acordos e convenções coletivas firmem condições menos vantajosas para os trabalhadores — como o fim do pagamento de horas de deslocamento ou redução no horário de almoço, por exemplo. É esse tipo de acordo que vem sendo contestado na Justiça e, agora, aguardará uma decisão final do STF.

Luiz Guilherme Migliora, professor da FGV Direito Rio, acredita que o que está em discussão agora no Supremo é a própria validade da principal mudança proposta pela reforma trabalhista. Para ele, o colegiado deve garantir a validade da lei na medida em que ministros já analisaram casos em que havia discussão entre o legislado e o acordado:

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— A tendência do Supremo é de garantir a validade do que é negociado, que são os direitos que estão disponíveis e citados na lei, por exemplo divisor de cálculo do valor salário hora, redução para 30 minutos do intervalo entre a jornada, entre outros — exemplifica Migliora.

Na prática, até que isso ocorra, a medida pode inviabilizar a análise de grande parte das ações trabalhistas até que o STF avalie o tema, o que não tem data para acontecer já que o assunto ainda não está na pauta da corte.

— De um lado, há a questão da celeridade processual e do outro a segurança jurídica. Depois da análise haverá uma grande quantidade de processos que serão decididos e espelharão o entendimento que o STF fixar — ressalta Rodrigo Bosisio, procurador do município do Rio de Janeiro e sócio do Bosisio Advogados.