Brasil Conte algo que não sei

Ana Maria Carrascosa, especialista em mediação de conflitos

Espanhola veio ao Rio para falar no Congresso Internacional sobre Inovação e Mediação realizado pelo Instituto Justiça e Cidadania, Nupemec e Emerj
"Mediação é um sistema de gestão de conflitos que permite que as partes, auxiliadas por um especialista, o mediador, cheguem a um acordo", diz a especialista em mediação Ana Maria Carrascosa Miguel Foto: Ana Branco / Agência O Globo
"Mediação é um sistema de gestão de conflitos que permite que as partes, auxiliadas por um especialista, o mediador, cheguem a um acordo", diz a especialista em mediação Ana Maria Carrascosa Miguel Foto: Ana Branco / Agência O Globo

“Ingressei na carreira jurídica em 1988. Sou responsável pelos programas de mediação do Conselho Geral do Poder Judiciário espanhol e colaboro em cursos e mestrado sobre o tema em universidades.”

Conte algo que não sei.

Muitas pessoas ainda pensam que mediação é apenas para problemas leves. Mas, na verdade, ela pode ser usada para resolver conflitos de grande importância. Na Espanha, já fizemos mediações entre responsáveis por assassinatos e parentes de vítimas.

Mediação é justiça?

Mediação é um sistema de gestão de conflitos que permite que as partes, auxiliadas por um especialista, o mediador, cheguem a um acordo. É, sim, uma forma de justiça.

Um juiz ou um advogado pode fazer a mediação?

Apenas um mediador pode fazer uma mediação. No geral, quase todas as legislações regulam quais os requisitos de formação necessários a um mediador. Normalmente, é preciso ter uma formação universitária e cursos específicos. A função do juiz é julgar, muito diferente de fazer as partes chegarem a um acordo. Por isso, em teoria, não poderia atuar dessa maneira. Mas há experiências em países, como Alemanha e Costa Rica, com os chamados juízes conciliadores. Eles são formados em mediação e se dedicam a esse trabalho em tribunais em que não atuam como juízes. Já o advogado deve defender os interesses de uma das partes. Portanto, não pode ser mediador. A menos que, após ter adquirido a formação necessária, atue apenas como mediador.

Que características deve ter um mediador?

Uma vez escutei um profissional experiente falando sobre isso. A resposta dele foi “paciência, paciência e paciência”. Acho que o mediador deve ter muita capacidade de escutar, ser muito racional, empático e com boa imaginação para oferecer possibilidades de solução dos conflitos. Um mediador não pode impôr sua solução, mas, sim, fazer as partes chegaram a uma.

Todo conflito pode ser mediado?

Não. Nem todo conflito pode ser mediado, e nem todo conflito que pode ser mediado pode ser mediado a todo momento. Por exemplo, no âmbito da família, quando há muita animosidade, ódio e rancor, não se pode mediar. Nessas condições, mesmo com um excelente mediador, a única coisa possível a se fazer seria baixar o nível de tensão e a escalada do conflito.

A mediação faz parte da justiça restaurativa. Do que ela trata?

A justiça restaurativa pretende restaurar. Ela supõe que reparar a vítima pode servir para reabilitar o criminoso e reintegrar os dois à sociedade. Para isso, a vítima deve ser reparada e o delinquente deve estar arrependido.

A mediação pode solucionar os problemas envolvendo as comunidades separatistas da Espanha, como a Catalunha?

Alguns mediadores já se ofereceram para atuar nesses casos. Eu creio que agora esse conflito não pode ser mediado. Acho que o melhor a fazer é baixar as tensões. Espanha e Catalunha têm que querer resolvê-lo, mas, no momento, as duas partes não querem.

No Brasil, a mediação não é muito popular. Como é na Espanha?

Na Espanha a situação é parecida com a do Brasil, mas lá a mediação tem crescido nos últimos seis anos. Em parte, isso é devido a uma lei acerca da mediação, que dava às associações de profissionais a função de atuar também como instituições de mediação. Isso coincidiu com a crise econômica, e muitos viram aí um nicho para fazer negócios. Mas cada vez se conhece mais a mediação. Os próprios cidadãos têm nos procurado pedindo pelo nosso trabalho, o que não acontecia.