Economia Previdência

'Vocês estiveram 18 anos no poder e não tiveram coragem de mudar', diz Guedes a deputados

Ministro da Economia se irritou com interrupções à sua fala na Câmara
O ministro da Economia, Paulo Guedes, durante audiência pública no plenário da CCJ da Câmara Foto: Jorge William / Agência O Globo
O ministro da Economia, Paulo Guedes, durante audiência pública no plenário da CCJ da Câmara Foto: Jorge William / Agência O Globo

BRASÍLIA - Após mais de quatro horas de audiência na Câmara, o ministro da Economia Paulo Guedes irritou-se com as interrupções de deputados que o questionavam durante sua fala na noite desta quarta-feira. O ministro contra-atacou, acusando os parlamentares de serem "especialistas em fake news" e não terem agido nas últimas décadas para corrigir injustiças tributárias e previdenciárias.

- Vocês estão há quatro mandatos (no poder)! Por que não cobraram impostos sobre dividendos? Vocês estiveram 18 anos no poder e não tiveram coragem de mudar, não cortaram nada? Eu respeitei a Casa, mas a casa não está me respeitando! A Casa não me dá o direito de falar! - gritou Guedes, classificando deputados da oposição de "especialistas em criar bagunça" por promover o que ele chamou de "fake news" sobre a reforma.

Os deputados do PT haviam questionado Guedes sobre os gastos com juros no Orçamento.

Guedes jogou para os deputados a responsabilidade de avaliar a proposta de mudanças na Previdência, dizendo que "a escolha é totalmente de vocês, quem vota são vocês, não sou eu".

- Por que vocês não cortaram a aposentadoria dos militares? Cortem vocês. Vocês são o Congresso Nacional. Vocês tem medo? - indagou o ministro., respondendo às críticas de que o projeto de mudança nas aposentadorias dos militares seriam brandas em comparação à reforma da Previdência.

'É caso de internar'

Após a audiência ser interrompida para Guedes ir ao banheiro, o ministro voltou a bater boca com deputados, depois dizer que quem não reconhece a necessidade da reforma da Previdência precisa ser internado.

— Quem acha que não é necessária (a reforma)? É caso de internação, é caso de internar — disse Guedes, sendo interrompido por deputados da oposição.

O deputado Henrique Fontana (PT-RS) cobrou respeito a outras opiniões, e o ministro tentou se explicar:

— Eu não estou dizendo que tem que internar que não aprovar essa reforma. Eu estou dizendo que tem que internar que não reconhecer que precisa haver uma reforma. Eu jamais diria que tem que internar alguém que discorda da de mim. Quem não reconhecer (a necessidade da reforma), seria um caso de internação. O que estou dizendo é o diagnóstico.

Antes, Guedes disse que o Brasil nunca terá uma Previdência igual a do Chile. O país adota o regime de capitalização semelhante ao proposto pelo governo.

— O Brasil jamais terá a Previdência como a do Chile. O Brasil jamais deixará de ser um país solidário. O Brasil jamais deixará de ser assim. Ainda bem. Nós somos fraternos, generosos. Mas não podemos ser contra a aritmética — disse.

Aliados

Sob fogo de deputados da oposição, que foram imensa maioria entre os inscritos para perguntas nas primeiras horas de audiência, Guedes também contou com a ajuda de parlamentares mais alinhados com o governo. Em alguns momentos chegou a ser aplaudido por apoiadores. Isso ocorreu, por exemplo, quando Guedes disse que não fazer a reforma da Previdência condenaria as futuras gerações.

Entre os mais entusiastas, estava o deputado Darcício Perondi (MDB-RS), que era um dos que puxava as palmas de apoio ao ministro, assim como Kim Kataguiri (DEM-SP). Kataguiri chegou a destacar que o ministro tinha aliados na comissão, e atribuiu à ordem de inscritos a impressão de que havia mais parlamentares de oposição.

— O senhor ministro não está sozinho nesta casa. O senhor tem diversos parlamentares que atuaram desde o início a favor da reforma da Previdência, diversos apoiando Vossa Excelência. É fácil jogar com mentira e dizer que não se inscreveram para defender a reforma — disse o deputado.

Já Coronel Crisósthomo (PSL-RO) se definiu como um “soldado de Bolsonaro”. Sempre de pé ao lado das primeiras bancadas, o deputado era um dos que mandava os colegas se calarem nas tentativas de interrupção de Guedes e pedia para “deixar o ministro falar”.

Outro momento de alívio de tensão foi durante a fala do líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), que dedicou a maior parte de sua fala para parabenizar o ministro da Economia.

— Quero parabenizar o senhor pela articulação política que tem feito, conversando com diversos parlamentares — pontuou Vitor Hugo.

Clima esquentou já no início da sessão

No início da sessão, o clima já havia ficado tenso quando o ministro fez uma comparação entre o sistema de aposentadorias no Brasil, a crise econômica da Venezuela e a situação crítica das contas públicas de alguns estados brasileiros.

Guedes afirmou que, sem a reforma da Previdência, o país teria destino parecido com o de estados como Rio de Janeiro, Minas Gerais e Goiás, que enfrentam dificuldade financeira. Enquanto Guedes enumerava esses estados, um parlamentar mencionou: “e o Chile!”.

A referência é ao modelo de Previdência chileno, baseado no sistema de capitalização, defendido por Guedes e criticado por opositores à proposta. A crítica recorrente é que neste sistema o valor da aposentadoria acaba sendo menor que o esperado pelo trabalhador.

Depois da menção ao Chile, Guedes rebateu:

— Acho que a Venezuela está melhor, viu?.

Enquanto os deputados subiam o tom da discussão, o ministro ironizou a confusão:

— A palavra é dos senhores. Eu não estou ouvindo. Fala mais alto. Falou todo mundo junto eu não consegui ouvir.

O presidente da CCJ, Felipe Francischini (PSL-PR), precisou intervir e pediu calma aos colegas.

— Isso aqui não é briga de rua! Mantenham o decoro, mantenham a tranquilidade — pediu o parlamentar.

No fim da confusão, Guedes pediu desculpas.