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Fux estuda levar ao plenário do STF o caso do traficante André do Rap

Fux estuda levar ao plenário do STF o caso do traficante André do Rap

O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux, estuda levar ao plenário o caso do traficante André do Rap. A libertação de um dos chefes de uma facção criminosa foi determinada pelo ministro Marco Aurélio Mello, com base em um artigo incluído pelo Congresso no pacote anticrime. O dispositivo foi mantido pelo presidente Jair Bolsonaro, apesar de manifestação contrária do Ministério da Justiça.

No pedido feito ao Supremo Tribunal Federal, a defesa de André do Rap alegou que a prisão era ilegal, que o juiz da 5ª Vara Federal de Santos não reavaliou a necessidade de manter a prisão.

A reavaliação é uma nova exigência da lei, está no artigo 316 do Código de Processo Penal. A regra determina que cabe ao "órgão emissor da decisão" revisar a cada 90 dias a prisão preventiva.

No documento, a defesa de André do Rap destacou que até o dia 23 de setembro de 2020 “o tribunal de origem, de ofício, deveria ter revisado a necessidade da manutenção da custódia, o que, não tendo ocorrido, torna a prisão ilegal”.

O Jornal Nacional procurou novamente o ministro do STF Marco Aurélio, que concedeu a liberdade ao traficante na semana passada. O ministro disse que a prisão teria de ser reavaliada pelo juiz da primeira instância, que condenou o réu, e que sua decisão não poderia ser suspensa por um colega da Corte, como ocorreu.

“O preceito é explícito. A atribuição é do juiz do processo-crime. Pouco importa que o processo esteja no TJ, no STJ ou no Supremo. O juiz da primeira instância é que tem que estar vigilante. A atribuição para julgar o habeas corpus é da turma. Agora, o que fica no ar e gere uma insegurança muito grande é o problema da autofagia, a possibilidade de o presidente cassar uma decisão de um colega”, disse o ministro Marco Aurélio.

Ao aceitar o habeas corpus para soltar André do Rap, Marco Aurélio afirmou que o traficante, com duas condenações, estava preso, sem culpa formada, desde o fim de 2019, e que não houve, em um período de 90 dias, um ato sobre a indispensabilidade da medida.

No pedido ao presidente do Supremo, ministro Luiz Fux, para suspender a liminar de Marco Aurélio que soltou o traficante André do Rap, a Procuradoria-Geral da República solicitou que a 5ª Vara Federal de Santos - a primeira instância - reavaliasse os motivos da prisão.

Ainda no sábado (10), Fux suspendeu a liminar e determinou a imediata prisão de André do Rap. A interlocutores, o presidente indicou que vai levar o caso para julgamento no plenário.

A nova redação do artigo 316 do Código de Processo Penal - que prevê a revisão da prisão preventiva a cada 90 dias - foi incluída pelos parlamentares na discussão do pacote anticrime, aprovado pelo Congresso em 2019.

O trecho não estava no texto original do pacote anticrime. Os deputados analisaram esse ponto em uma reunião no fim de outubro. O pacote já estava quase pronto para ir a plenário. E o deputado Lafayette de Andrada, do Republicanos, sugeriu a inclusão desse trecho. O relator do projeto, deputado Capitão Augusto, do PL, hesitou e chegou a se posicionar contra, mas o item acabou aprovado no relatório pela maioria do grupo.

“Conversando com meu assessor e a gente, e eu não estou concordando muito, na minha visão. “O parágrafo único. Porque imagina o juiz, 90 dias, de 90 em 90 dias... O que você acha?”, disse na época o deputado Coronel Chrisóstomo (PSL-RO).

“Se ele não atualizar, a prisão vai ficar ilegal”, disse a deputada Margarete Coelho (PP-PI).

“Se a lei fala que o procedimento encerra em 90 dias, mas o juiz, ele acha, pelos elementos que ele tem do processo, que o cara deva continuar, ele de ofício renova”, disse o deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG).

“Estou em dúvida ainda, mas não vou me opor para gente... “, disse o deputado Capitão Augusto (PL-SP)

“Vamos tocar. Aprovar isso aí. Isso aí...”, afirmou o deputado Lafayette de Andrada.

“No plenário a gente revisa”, disse o deputado Capitão Augusto.

Mas o plenário não revisou esse ponto. A Câmara e o Senado aprovaram o pacote com o novo trecho incluído pelo grupo de trabalho em dezembro de 2019 e o texto foi para sanção presidencial.

Na época, a Procuradoria-Geral da República pediu à Casa Civil da Presidência o veto.

Em nota técnica, destacou que “a revisão da necessidade de manutenção da prisão preventiva é mecanismo excessivamente complexo e burocrático. Aliás, o referido controle sobre as prisões é possível pela via do habeas corpus, razão pela qual o dispositivo apresenta-se como desnecessário. Além disso, na prática, o dispositivo propõe mudar a natureza da prisão preventiva, tornando-a quase uma prisão temporária”.

O então ministro da Justiça, Sergio Moro, também pediu que o presidente vetasse esse trecho.

No parecer da área jurídica, o ministério defendeu o veto do parágrafo único do artigo, com o argumento de que “não se apresenta razoável imputar ao magistrado tamanha responsabilidade, especialmente quando se tem noção da realidade judicial brasileira, marcada por uma infinidade de processos. Com efeito, impor a revisão de toda e qualquer decretação de prisão preventiva, mesmo ausentes circunstâncias novas a inquinar à decisão inicial, se revela pouco factível e desproporcional. O juiz, ao invés de se dedicar a casos complexos, terá que dividir seu tempo de trabalho com a revisão de todo e qualquer caso que tenha envolvido prisão preventiva, mesmo inexistindo, frise-se, fatos novos”.

Apesar do pedido de Moro, o presidente Jair Bolsonaro sancionou o pacote anticrime sem vetar o artigo 316.

No mesmo dia, Bolsonaro escreveu em uma rede social que: “Na elaboração de leis quem dá a última palavra sempre é o Congresso, ‘derrubando’ possíveis vetos. Não posso sempre dizer não ao Parlamento, pois estaria fechando as portas para qualquer entendimento. Só avançamos também porque recuamos em alguns pontos.”

Nesta segunda (12), em entrevista à GloboNews, Sergio Moro disse que o dispositivo que exige que o juiz revise as prisões temporárias tornou urgente a aprovação da lei que determina a prisão após julgamento em segunda instancia. Ele sugeriu ao presidente Bolsonaro que trabalhe pela aprovação dessa lei, junto ao Congresso.

“O presidente hoje tem um contato mais próximo com o Parlamento, tem um controle maior, e poderia e penso que poderia, fica aqui uma sugestão, um conselho construtivo, utilizar esse poder e toda essa popularidade para tentar rever algumas dessas pautas. Inclusive nós temos aí uma pauta que é essencial para evitar esse tipo de situação que é a retomada da execução da condenação criminal em segunda instância, essa era uma pauta importantíssima. A partir do momento que você tem uma condenação criminal em segunda instância, você admitir que isso é execução da pena, não tem mais prisão preventiva, esse indivíduo nunca ia ser solto”, disse Moro.

A comissão que analisa a proposta de emenda constitucional que prevê a prisão após condenação em segunda instância vai pedir novamente ao presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, a retomada dos trabalhos. As comissões estão paralisadas por causa da pandemia. A comissão afirma que se a PEC tivesse sido aprovada pelo Congresso, casos como o de André do Rap não ocorreriam. O traficante já tem uma condenação por um tribunal de segunda instância.

Em nota, a Associação dos Juízes Federais do Brasil afirmou que a decisão do ministro Marco Aurélio de conceder o habeas corpus no caso do traficante André do Rap é isolada. A associação lembrou que a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal acabou revertendo uma outra decisão do ministro Marco Aurélio, que concedeu habeas corpus a um outro bandido preso na mesma operação. A Ajufe afirmou ainda que, depois que um caso é julgado em primeira e segunda instâncias, não há mais que se falar em reavaliar a prisão preventiva em 90 dias.

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