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Vereadora Marielle Franco é assassinada a tiros no Estácio

Polícia Civil recolhe pelo menos oito cápsulas no local; motorista também é morto
Marielle Franco, vereadora eleita pelo PSOL Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo
Marielle Franco, vereadora eleita pelo PSOL Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo

RIO — A vereadora Marielle Franco (PSOL), de 38 anos, foi assassinada a tiros por volta das 21h30m desta quarta-feira, na Rua Joaquim Palhares, no Estácio, próximo à prefeitura do Rio. O motorista que estava com ela, Anderson Pedro Gomes, também foi morto na ação. Eles estavam acompanhados de uma assessora da vereadora, que foi atingida por estilhaços e levada para o Hospital Municipal Souza Aguiar, no Centro. O motorista estava como temporário, no lugar do funcionário oficial da vereadora, há dois meses . Ele tinha um filho de um ano. A principal linha de investigação é a de execução.

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Policiais militares informaram que um carro teria emparelhado com o da vereadora, e os ocupantes abriram fogo, fugindo em seguida. De acordo com a PM, a janela à direita no banco de trás, onde estava Marielle, ficou completamente destruída. Segundo investigadores da Delegacia de Homicídios (DH),  os criminosos não levaram nada de nenhum dos ocupantes do veículo. Pelo menos cinco tiros teriam atingido a cabeça da vereadora.

Amigos e eleitores de Marielle Franco se reúnem próximo ao local do crime Foto: Uanderson Fernandes
Amigos e eleitores de Marielle Franco se reúnem próximo ao local do crime Foto: Uanderson Fernandes

Marielle tinha acabado de sair de um evento chamado "Jovens Negras Movendo as Estruturas", realizado na Rua dos Inválidos, na Lapa, e seguia para a sua casa na Tijuca. Ela foi a quinta vereadora mais votada do Rio nas eleições de 2016 . O deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL) foi um dos primeiros a chegar ao local do crime. Segundo o deputado, não havia qualquer ameaça contra ela.

— Todas as características são  de execução. Evidente que vamos aguardar todas as conclusões da polícia, cabe à Polícia fazer a investigação, mas a gente, evidentemente, não vai nesse momento aliviar isso. A gente quer isso apurado. Não é por cada um de nós, é pelo Rio de Janeiro. Isso é completamente inadmissível, uma pessoa cheia de vida, cheia de gás, uma pessoa fundamental para o Rio de Janeiro, brutalmente assassinada.

Um ciclista que passava pelo local na hora dos tiros conta que, logo depois, a assessora, única sobrevivente, saiu do carro . Muito abalada, ela, segundo o ciclista, repetia que o crime não fazia sentido. Uma testemunha contou que ouviu muitos tiros:

— Eu estava subindo a escada da estação quando ouvi os tiros. Por poucos segundos não fiquei em meio ao fogo cruzado. Ouvi muito tiros e quando saí da estação três moças me disseram que viram o carro branco em que Marielle estava sendo perseguido por outro. As pessoas estavam na praça vendo em choque.No momento não tinha policiais. Eu acredito que os bandidos saíram muito rápido — disse uma testemunha que estava no local.

Reações

Marcelo Freixo no local onde a vereadora Marielle Franco do PSOL foi assassinada no Estácio Foto: Uanderson Fernandes / Uanderson Fernandes
Marcelo Freixo no local onde a vereadora Marielle Franco do PSOL foi assassinada no Estácio Foto: Uanderson Fernandes / Uanderson Fernandes

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A ativista e escritora Ana Paula Lisboa passou boa parte da noite com Marielle. Ela contou que o encontro com jovens negras terminou por volta das 21h, elas se despediram e, pouco tempo depois, chegou a notícia do crime.

— Ela sempre termina os eventos até as 21h para garantir a segurança das pessoas, muitas vão para a Zona Oeste, lugares mais distantes. Hoje mesmo ela falou isso — disse a escritora, que é colunista do GLOBO.

Segundo Ana Paula, as duas se conheceram há anos no Complexo da Maré e, desde a campanha de Marielle para a Câmara, as duas se aproximaram ainda mais:

— Ela sempre disse que o mandato não seria dela, seria coletivo. E era o que fazia. Hoje estávamos num evento dentro da programação dos 21 dias de ativismo contra o racismo.

Um dia antes de ser morta, Marielle  postou em seu perfil do Twitter um protesto contra o assassinato de mais um jovem no Rio de Janeiro.

Após ser liberado pelo Instituto Médico Legal (IML), os corpos da vereadora e do motorista foram levados para a Câmara Municipal do Rio , onde foi realizado o velório, fechado ao público. Na rua, milhares de pessoas aguardavam o caixão. Depois, o corpo de Marielle foi enterrado  no Cemitério do Caju e  o de Anderson, em Inhaúma, em clima de comoção .

Em nota, o PSOL que exigiu a apuração imediata e rigorosa "desse crime hediondo".

"O Partido Socialismo e Liberdade vem a público manifestar seu pesar diante do assassinato da vereadora Marielle Franco. Estamos ao lado dos familiares, amigos, assessores e dirigentes partidários do PSOL/RJ nesse momento de dor e indignação. A atuação de Marielle como vereadora e ativista dos direitos humanos orgulha toda a militância do PSOL e será honrada na continuidade de sua luta. Exigimos apuração imediata e rigorosa desse crime hediondo. Não nos calaremos!"

O Escritório de Direitos Humanos das Nações Unidas também divulgou na tarde desta quinta-feira uma nota em que cobra rapidez, transparência e credibilidade nas investigações .

Mestrado sobre UPP

O carro da vereadora Marielle Franco (PSOL) Foto: Uanderson Fernandes / Agência O Globo
O carro da vereadora Marielle Franco (PSOL) Foto: Uanderson Fernandes / Agência O Globo

A vereadora se formou pela PUC-Rio, e fez um mestrado em Administração Pública pela Universidade Federal Fluminense (UFF), com o tema: “UPP: a redução da favela a três letras”. Marielle trabalhou em organizões como a Brasil Foundation e o Centro de Ações Solidárias da Maré (Ceasm). Coordenou a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), ao lado de Marcelo Freixo.

Em 2005, uma de suas amigas mais próximas morreu, vítima de bala perdida, durante um tiroteio entre policiais e traficantes na Maré. O episódio impulsionou seu engajamento na defesa dos direitos humanos e contra ações violentas nas favelas.

Um ano depois, ela fez campanha para Marcelo Freixo se tornar deputado estadual e, desde então, é sua assessora parlamentar. Na Zona Sul, Marielle esteve entre os cinco candidatos mais votados em quase todos os bairros (no Jardim Botânico, foi a segunda). Na zona eleitoral da Maré, foi a quinta.