Exclusivo para Assinantes
Política Lava-Jato

Morando na Colômbia, Janot vira ‘embaixador’ da Lava-Jato

No exterior, ex-PGR faz palestras e publica artigos sobre a operação

Rodrigo Janot na palestra “Uma Visão Geral dos Esforços Anti-Corrupção na América Latina”
Foto: reprodução
Rodrigo Janot na palestra “Uma Visão Geral dos Esforços Anti-Corrupção na América Latina” Foto: reprodução

BRASÍLIA - “Em todos os países da América Latina por onde viajamos sempre nos fazem a mesma pergunta: ‘Como podemos construir uma Lava-Jato?”, conta o ex-procurador-geral Rodrigo Janot, num artigo publicado simultaneamente em jornais do México, Colômbia, Venezuela, Costa Rica e El Salvador no mês passado. No mesmo texto o ex-procurador fornece a receita: Ministério Público independente, acordos de delação premiada, cooperação internacional e apoio da sociedade, entre outros itens.

Quase seis meses depois de deixar a Procuradoria-Geral da República, Janot não tem mais a caneta para denunciar políticos com foro no Supremo Tribunal Federal (STF) como fez ao longo de dois mandatos, mas nem por isso deixou de disparar suas "flechas" contra o que considera as poderosas estruturas de desvio de dinheiro público. Fora do comando do Ministério Público, Janot passou a liderar um movimento para propagar a Lava-Jato pela América Latina, sobretudo nos países onde grandes empreiteiras brasileiras replicaram o modelo de corrupção adotado com sucesso no saque aos cofres da Petrobras no Brasil.

No mesmo tom que fez denúncias contra o presidente Michel Temer, Eduardo Cunha e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, entre outros, o ex-procurador-geral tem usado sua experiência para escrever artigos, fazer palestras, dar aulas e conceder entrevistas para jornais e revistas, inclusive dos Estados Unidos e Europa, interessados nos desdobramentos internacionais da Lava-Jato. Desde janeiro, ele está morando em Bogotá, na Colômbia, onde ministra um curso sobre técnicas de combate à corrupção na Universidade de Los Andes.

O curso termina em maio, quando ele volta à Brasil para conduzir um curso sobre compliance na faculdade de Direito do CEUB, a maior universidade privada de Brasília. Compliance é uma outra faceta da Lava-Jato. Depois de fisgadas nas investigações, as grandes empreiteiras decidiram fortalecer os setores de auto-fiscalização para evitar as distorções que levaram alguns dos dirigentes delas à cadeia. Ao falar de compliance, Janot falará sobre a Lava-Jato.

As andanças do ex-procurador-geral começaram ano passado. Ele deixou a Procuradoria-Geral, fez uma breve viagem de férias e, para surpresa de alguns que apostavam numa aposentadoria, ele passou a aceitar convites para falar sobre a operação que abalou os alicerces da política brasileira e pode fazer o mesmo em outros países da região. Janot já fez palestras em Lima, Santiago, Bogotá e em Washington. Na última quarta-feira, aliás, o ex-procurador-geral voltou a Washington para participar de um seminário de dois dias na sede da American Society sobre a Lava-Jato. As palestras não são remuneradas.

— Da mesma forma que empreiteiras brasileiras "exportaram" um modelo de corrupção, o Brasil está agora exportando um modelo que se mostrou eficaz no combate à corrupção — afirma o ex-secretário de Cooperação Jurídica Internacional da Procuradoria-Geral Vladimir Aras, numa referência à movimentação de Janot e outras autoridades brasileiras.

Nos últimos meses, o ex-procurador também já fez palestras em Cuiabá, Fortaleza e São Paulo. Em linhas gerias, Janot fala sobre o que fez à frente da Lava-Jato, em Brasília, e o que é possível fazer sobretudo em outros países onde as investigações estão ainda em desenvolvimento. O ex-procurador-geral discorre sobre erros e acertos mas, em geral, põe foco na independência do Ministério Público. Para ele, a autonomia dos procuradores no Brasil tem sido essencial para levar adiante investigações sobre autoridades. O que não acontece em outros países da a região, onde os ministérios públicos sofrem forte interferência dos governos.

Em entrevista ao GLOBO, o ex-procurador disse que não se arrepende de nada do que fez e defende o acordo da JBS com vigor. O acordo, provavelmente o de maior impacto da Lava-Jato, foi alvo de críticas. Para alguns analistas, Janot teria exagerado ao conceder imunidade penal aos executivos da J&F, Joesley e Wesley Batista, em troca das confissões e provas apresentadas por eles. A partir do acordo, Janot fez duas denúncias contra Temer e chegou até a pedir a prisão do senador Aécio Neves (PSDB-MG), entre outros.

— O acordo da JBS se mostrou extremamente positivo. Conseguimos fazer prova contra um presidente da República em pleno exercício do cargo. Conseguimos fazer prova contra um senador da República. Conseguimos fazer prova contra um deputado federal com direito filmagens, mala de dinheiro e corridinha nas ruas de São Paulo. Mostramos que um membro do Ministério Público cometeu perfídia contra a instituição e contra os colegas. Essa colaboração (da JBS) foi muito rica — afirmou.

Janot já deixa claro que não será candidato a nada, nem a presidente da República, como alguns adversários chegaram a espalhar no auge das investigações sobre a JBS. Mas mesmo assim pretende participar do processo. O ex-procurador-geral já disse que fará campanha para que os eleitores rejeitem candidatos que não tenham ficha limpa.

— Não tenho candidato. Só acho que a sociedade tem que estar atenta para não para não apoiar quem está envolvido ou apoia atos de corrupção — afirma.