Como o caos na segurança foi construído

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Como o caos na segurança foi construído

Por: Aurílio Nascimento em

Durante o governo dos militares, havia segurança nas ruas. Podia-se caminhar com tranquilidade durante as madrugadas, sentar nas calçadas durante a noite sem medo. A insegurança mostrava-se apenas nos roubos a bancos, praticados por militantes da esquerda ou quadrilhas incipientes. Isso não deixa de ser uma verdade, mas tal segurança não era proveniente de uma polícia bem treinada, aparelhada. A segurança vivida naquela época era apenas o produto das circunstâncias políticas vigentes. Quem fosse se aventurar no crime teria que ter muita coragem e disposição. Sabia com antecedência que o cometimento de crimes graves, como roubos com morte, roubos a bancos, atentar contra a vida de um policial, equivalia a comprar uma passagem para o inferno, sem direito a volta.

Quando os militares voltaram para os quartéis, deixaram para trás uma polícia que foi muito eficiente como sua aliada, mas sem nenhuma estrutura para os novos tempos. A delegacia de homicídios funcionava num prédio caindo aos pedaços na Avenida Presidente Vargas. O elevador, com porta pantográfica, era centenário. Mesas de metal verde, com gavetas tortas que não fechavam, velhas máquinas datilográficas, muitas sem algumas teclas, viaturas Volkswagen, tipo Fusca, e espingardas Winchester calibre 12, sobra da guerra do Vietnã, adquiridas em liquidação. Era tudo o que havia.

O primeiro governador eleito pelo voto direito no Rio de Janeiro foi Leonel Brizola. Um político gaúcho que, de todas as formas, tentou incendiar o país, contando com ajuda de Fidel Castro e do serviço secreto da antiga Tchecoslováquia. Almejando o Palácio do Planalto e, de uma vez por todas, a instalação de um governo comunista, segurança pública não era uma prioridade. A polícia passou a ser, de acordo com seus discursos, uma instituição a serviço das elites. Uma das mais eficientes operações contra roubos a bancos, batizada de operação Apolo, foi logo desfeita. Em um ano e sete meses, apenas um roubo a banco foi praticado no Rio de Janeiro. "A polícia não vai trabalhar para banqueiros", afirmou, com todas as letras.

Na sequência, o político suspeito de apropriar-se de milhões de dólares entregues e ele por Fidel Castro, para montar uma guerrilha na serra de Caparaó, divisa de Minas Gerais com o Espírito Santo, proibiu as operações com helicópteros nos morros e favelas do Rio de Janeiro. Afirmou que voos rasantes destelhavam os barracos. Proibiu também as operações por terra. Demonstrando grande preocupação com o esforço dos presos recolhidos ao sistema penitenciário em cozinhar suas próprias refeições, terceirizou a alimentação nos presídios. O resultado foi um dos maiores escândalos de desvios de dinheiro público, conhecido como o "escândalo das quentinhas". Para vencer suas batalhas, Napoleão afirmava que era necessário dividir as tropas inimigas, e com esta manobra obteve muitas vitórias. Assim também era o sistema penitenciário. Integrantes de uma mesma quadrilha jamais poderiam permanecer juntos. Separados, tornam-se fracos. No governo Brizola este protocolo foi abolido, e os presídios entregues aos traficantes. Agora, o presidio A pertencia à facção B, a facção C escolhia o seu. Quem sabe isso não foi o cumprimento de um acordo político que beneficiava e talvez impunha o voto no partido do governador?

Os governos que sucederam ao caudilho nada fizeram para mudar aquele cenário. Todos estavam concentrados nos seus bolsos e na manutenção do poder. Vez por outra, uma ação pirotécnica: compra de centenas de viaturas refugadas nas linhas de montagem por defeitos, com valores superfaturados, e entregues sob os holofotes.

A situação política de então pode ser classificada com um termo dedicado à condessa de Provença, Joana I de Nápoles, no século XIV. Vivendo de forma desregrada, Joana também era rainha de Jerusalém, foi exilada pela igreja, indo viver na França. Lá, regulamentou os bordéis, os quais ficaram conhecidos então como "casa da mãe Joana", um lugar em que qualquer um pode mandar e fazer o que quiser. E assim o caos na segurança foi instalado.