Por G1


Paulo Freire — Foto: Arquivo/Instituto Paulo Freire

A Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado manteve nesta quinta-feira (14) o título de Patrono da Educação Brasileira dado a Paulo Freire, educador, pedagogo e filósofo.

A lei que conferiu o título é de 2012 e foi questionada por meio de um canal no site do Senado dedicado a receber sugestões de cidadãos. A proposta para retirar o título de Paulo Freire obteve 20 mil assinaturas e, por isso, entrou na pauta da CDH.

O método Paulo Freire de alfabetização completou 50 anos em 2013. Freire desenvolveu uma estratégia baseada nas experiências de vida das pessoas. A primeira turma teve 380 alunos de Angicos, localizada na região central do Rio Grande do Norte, dos quais 300 se formaram.

Seu livro "Pedagogia do Oprimido" é o único livro brasileiro a aparecer na lista dos 100 títulos mais pedidos pelas universidades de língua inglesa consideradas pelo projeto Open Syllabus. Lançado em 1968, o livro aparece em 99º lugar no ranking geral, com 1.021 citações em programas. No campo de educação, a obra figura em segundo lugar como a mais pedida nas universidades desses países, perdendo para "Teaching for Quality Learning in University: What the Student Does", de John Biggs.

A relatora da sugestão, senadora Fátima Bezerra (PT-RN), elaborou parecer contrário à retirada do título. Para ela, a ideia tem alto grau de "estupidez, insensatez e ignorância".

"Quanto ao mérito, percebe-se nitidamente que a sugestão é derivada do processo de fascistização de setores da sociedade brasileira marcado pela intolerância, pela falta de alteridade e variadas formas de preconceito, discriminação e opressão", - Fátima Bezerra.

Ela lembrou ainda que a comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados elaborou moção de repúdio contra a sugestão, além de diversas entidades da área de educação terem se posicionado contra o pedido.

Fátima Bezerra lê parecer contra retirar de Paulo Freire título de patrono da educação

Fátima Bezerra lê parecer contra retirar de Paulo Freire título de patrono da educação

Origem da iniciativa

O pedido tramitou com o nome de "SUG 47/2017" feita por iniciativa popular como uma Ideia Legislativa proposta no portal e-Cidadania, do Senado. Ela foi sugerida por Stefanny Papaiano, de São Paulo. Ela é integrante do Movimento Direita São Paulo e apoia iniciativas do Escola Sem Partido.

Por receber 20 mil votos favoráveis no portal do Senado, a ideia se tornou uma sugestão legislativa e seguiu para análise da CDH. Na justificativa da sugestão, a autora argumenta que Paulo Freire é "um filósofo de esquerda” e criador de um método que “é um fracasso retumbante de resultados catastróficos na educação".

Segundo a senadora Fátima, a sugestão é assinada pelo “ultraconservador” Movimento Brasil Livre (MBL).

Relatora contra retirada de título de Paulo Freire critica Escola Sem Partido

Relatora contra retirada de título de Paulo Freire critica Escola Sem Partido

Defesa de Paulo Freire

Ao longo dos debates na comissão, senadores e especialistas se posicionaram contra a retirada do título. Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, apontou que a matéria é “um ataque a todo cidadão brasileiro”. Para ele, a proposta de educação democrática e emancipadora de Freire é um trabalho único, pois é uma teoria que foi comprovada de forma prática. "Os grandes pensadores criam referências e não podemos abandonar essas referências", disse.

Para a deputada Luiza Erundina (PSOL-SP), autora da Lei 12.612/2012, que conferiu o título de Patrono a Paulo Freire, a sugestão é um atentado ao educador. "É um segundo exílio o que querem decretar a Paulo Freire", disse, se referindo ao exílio sofrido pelo educador durante o período de Ditatura Militar a partir de 1964.

A presidenta da CDH, senadora Regina Sousa (PT-PI), defendeu o portal e-Cidadania, canal utilizado para protocolar o pedido, e declarou que houve “oportunidade de debate” apesar do viés do pedido. "Há nesse pais uma onda conservadora reacionária, intolerante e fundamentalista. E essas pessoas descobriram esse instrumento [o e-Cidadania] para expressar toda a sua intolerância", declarou.

Alfabetização

O método Paulo Freire foi desenvolvido no início dos anos 1960 no Nordeste, onde havia um grande número de trabalhadores rurais analfabetos e sem acesso à escola, formando um grande contingente de excluídos da participação social. Com o golpe militar de 1964, Paulo Freire foi preso e exilado, e seu trabalho interrompido.

O método Paulo Freire é dividido em três etapas. Na etapa de Investigação, aluno e professor buscam, no universo vocabular do aluno e da sociedade onde ele vive, as palavras e temas centrais de sua biografia. Na segunda etapa, a de tematização, eles codificam e decodificam esses temas, buscando o seu significado social, tomando assim consciência do mundo vivido. E no final, a etapa de problematização, aluno e professor buscam superar uma primeira visão mágica por uma visão crítica do mundo, partindo para a transformação do contexto vivido.

Nascido no Recife, Freire ganhou 41 títulos de doutor honoris causa de universidades como Harvard, Cambridge e Oxford. Ele morreu em maio de 1997.

(Veja abaixo programa do Globo Ciência sobre o método e a influência de Paulo Freire)

Grandes nomes da ciência: Paulo Freire - íntegra

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