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Política Lava-Jato

Os 'amigos' de Funaro foram presos na Operação 'Câmbio, desligo'

Em depoimento no ano passado, o operador Lúcio Funaro contou detalhes da atuação e de sua relação com doleiros alvos da PF nesta quinta-feira
Funaro entregou aos investigadores planilhas com repasses de R$ 1 milhão, de 22 a 25 de julho de 2014: é justamente a quantia que o doleiro afirmou ter ido buscar no escritório do advogado José Yunes, amigo de Temer Foto: Ailton de Freitas/26-10-2017
Funaro entregou aos investigadores planilhas com repasses de R$ 1 milhão, de 22 a 25 de julho de 2014: é justamente a quantia que o doleiro afirmou ter ido buscar no escritório do advogado José Yunes, amigo de Temer Foto: Ailton de Freitas/26-10-2017

RIO - "Conheci todos os doleiros do Brasil, de Norte a Sul", disse o operador do PMDB Lúcio Funaro em depoimento à Procuradoria-Geral da República (PGR) em agosto do ano passado, dando detalhes do porte das operações de alguns amigos e como Vinícius Claret, o Juca , e Cláudio Barboza, o Tony , assumiram os negócios da família Messer, que era dona da maior mesa de câmbio do país.

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Agora delatores, Juca e Tony entregaram à força-tarefa da Lava-Jato no Rio documentos e arquivos que mostram como eram suas operações no país, dando origem a Operação Câmbio, desligo , que cumpriu nesta quinta 53 mandados de prisão.

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— A última informação que tive foi na Páscoa de 2016, quando fui jantar com o Tony, em Punta del Este (no Uruguai), e ele me disse que tinha desfeito a sociedade (com o Juca). Minha filha tinha acabado de nascer, tinha pouco mais de um mês. Tínhamos relacionamento de mais de 20 anos. Conheci ele quando ainda era funcionário da família Messer na mesa de câmbio... era ele que me atendia — contou Funaro.

Segundo ele, Juca e Tony assumiram os negócios da família Messer, que passou a considerar esse ramo passaria a "dar muitos problemas".

Funaro disse que continuou suas operações com a mesa dos dois porque eles lhe davam todas as condições que ele precisava para operar propinas. Durante o depoimento, explicou como eles faziam para ter dinheiro vivo e como transferia recursos para eles por meio de pagamentos de boletos e transferência eletrônicas.

— Eu tinha linha de crédito e podia ficar com conta devedora — disse Funaro.

Do jantar em Punta, Funaro lembra que Tony perguntou se a Lava-Jato ia continuar e que atendia a Odebrecht.

— Acho que ele não tinha medo da delação (da Odebrecht), acho que nem acreditava.

Questionado pelos investigadores com quais doleiros já havia operado, Funaro foi listando seus contatos nesse mercado e contando histórias.

Dos "Davies" (Jorge e Raul Davies), também alvos da operação desta quinta, lembrou que "operavam no Brasil inteiro e tiveram problemas agora com a Petrobras também". Classificou os irmãos Chebar (Renato e Marcelo), que também fizeram delação, como "doleiros pequenos".

CALOTE DO AMIGO

Os investigadores quiseram saber se ele tinha feito negócios com a doleira Nelma Kodama, delatora da Lava-Jato em Curitiba, e Funaro disse que não, mas contou como a conheceu recordando a história de outros dois alvos da Operação Câmbio, desligo: Richard Van Otterloo e Raul Srour.

— Nunca operei. Conheci ela porque ela se associou com um cara que tinha escritório no mesmo prédio que eu e que foram grandes doleiros de São Paulo. O Richard e o Raul — disse.

— Eu tinha um carinho muito grande por ele (Raul) e pelo sócio o Richard, porque sempre me ajudaram. Dei US$ 3 milhões de crédito para ele voltar a trabalhar, em dinheiro, dei o capital. Por causa do passado, sou padrinho de casamento do irmão dele (Raul) e da filha do irmão dele. A família inteira eu sou próximo — prosseguiu.

Mas essa relação deve ter reforçado a máxima "amigos, amigos. Negócios à parte". Funaro disse que já havia feito dois empréstimos — um de US$ 500 mil e outro de US$ 300 mi — para Raul e ele não tinha quitado a dívida.

— Aí, eu disse: seguinte, agora você está me pedindo mais US$ 2 milhões e pouco. Vamos fazer um contrato de compra e venda do seu apartamento, que era no melhor prédio de São Paulo. Aí ele pega e vende o apartamento e me dá o cano. Me deve e diz que não tem como pagar — contou Funaro.

O operador do PMDB também falou sobre Marco Antônio Cursini, que já foi delator na Operação do Banestado (em 2003), e depois de voltar a trabalhar no mercado de câmbio em 2010 virou alvo novamente das investigações nesta quinta.

— Ele era de São Bernardo do Campo...dizem que era doleiro do Márcio Thomas Bastos (ex-ministro da Justiça, que morreu em 2014). Não sei como ele foi indicado. Muitas vezes, quem indicava o doleiro era um agente do banco, que ganhava uma comissão do doleiro. Nem sei se ele (Cursini) trabalha ainda.

Mesmo conhecendo "todos os doleiros do país", Funaro disse que não indicava o serviço de nenhum deles para seus clientes.

— Nunca quis indicar doleiro para ninguém. Neles (Juca e Tony) eu tinha 100% de confiança, 110% de confiança. Mas quando você indica um doleiro de confiança para alguém, você fica responsável pela pessoa que você indicou. Eu não queria ter essa responsabilidade.