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Rio

Polícia apura se Adriano estava formando milícia na Bahia

Ex-capitão do Bope circulava por cidades do interior do estado, e investigadores tentam descobrir a origem do dinheiro que gastava nas viagens
Adriano da Nóbrega, morto pelo Bope da Bahia Foto: Reprodução
Adriano da Nóbrega, morto pelo Bope da Bahia Foto: Reprodução

RIO — A polícia da Bahia descobriu que o ex-capitão do Batalhão de Operações Especiais (Bope) Adriano Magalhães da Nóbrega circulava pelo estado há pelo menos dois anos, e investiga a possibilidade de ele ter iniciado a formação de milícias em cidades do interior. Agentes do Departamento de Repressão ao Crime Organizado (Draco) vêm rastreando a origem do dinheiro que gastava nas viagens — todas as suas despesas eram pagas em dinheiro vivo —, e tentam levantar os bens que comprou no Nordeste.

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Morto por policiais no último domingo em Esplanada, município localizado a 170 quilômetros de Salvador, Adriano havia sido investigado pelos homicídios, em março de 2018, da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes. Acusado de chefiar um grupo de assassinos de aluguel e de integrar a milícia de Rio das Pedras, ele estava foragido desde janeiro do ano passado.

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Há duas semanas, Adriano escapou por pouco de uma equipe de agentes que o localizou na Costa do Sauípe. Ele estava numa mansão com a mulher e as duas filhas e conseguiu fugir por uma área de mangue. De lá, foi para Esplanada, onde mudou de esconderijo na véspera de sua morte — uma testemunha disse que o ex-capitão do Bope ficou nervoso enquanto trocava mensagens por celular. Investigadores suspeitam que o foragido recebia informações privilegiadas sobre as buscas.

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O Draco da Bahia vem refazendo os passos do ex-capitão do Bope especialmente numa região próxima à divisa com Sergipe, onde ele acompanhava vaquejadas e teria feito gastos que levantam a suspeita de lavagem de dinheiro do crime organizado. Informações sobre a investigação estão sendo repassadas ao Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público e à Polícia Civil do Rio.

— Expansão ( da milícia de Rio das Pedras ) é uma preocupação nossa e está sendo investigada. Normalmente fazemos ( esse tipo de apuração ) quando algum integrante de organização criminosa é localizado aqui, no estado. A gente tem a informação de que ele pagava tudo em espécie para evitar rastreamentos— disse o delegado Marcelo Sansão, diretor do Draco da Bahia.

Nova autópsia

A família de Adriano solicitou ao Tribunal de Justiça do Rio uma autorização para encomendar uma perícia independente no corpo do ex-capitão do Bope. De acordo com o advogado Paulo Emilio Catta Preta, o objetivo é saber se há sinais que indicam execução ou agressão. Parentes estariam insatisfeitos com o laudo da autópsia emitida pelo Instituto Médico-Legal da Bahia, segundo o qual a vítima sofreu “anemia aguda secundária à politraumatismo por instrumento de ação pérfuro-contundente”. Ele teria reagido à bala a uma ordem para se entregar e levou dois tiros.

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Rodolfo Laterza, professor de Direito Penal e delegado da Polícia Civil do Espírito Santo, explicou que a família pode conseguir permissão para a autópsia, mas não é assegurado o reconhecimento legal do laudo:

— Se for produzido na fase do inquérito, o delegado pode considerá-lo, caso o ache relevante. Mas não há obrigatoriedade. Se for elaborado no decorrer do processo, o juiz pode aceitar ou rejeitar o parecer, porém sua decisão deve ser fundamentada.

No último domingo, Catta Preta levantou a suspeita de Adriano ter sido morto como “queima de arquivo”. Ele disse que o ex-capitão do Bope lhe telefonou dias antes para dizer que temia ser executado. Um outro advogado afirmou na terça-feira ao GLOBO, em condição de anonimato, que foi procurado por um emissário do miliciano para negociar sua apresentação à Justiça.