Política

Câmara derrota governo e tira Coaf das mãos do ministro da Justiça, Sergio Moro

Reforma administrativa de Bolsonaro ainda precisa passar pelo Senado
Em votacao no plenario da camara na noite desta quarta-feira, a maioria decidi que o COAF volte para o Ministerio da Economia. Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo
Em votacao no plenario da camara na noite desta quarta-feira, a maioria decidi que o COAF volte para o Ministerio da Economia. Foto: Daniel Marenco / Agência O Globo

BRASÍLIA — A Câmara dos Deputados derrotou novamente o governo na noite desta quarta-feira e aprovou, por 228 a 210 votos, a transferência do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Justiça para a pasta de Economia, contrariando Sergio Moro, que queria manter controle sobre o órgão. Apesar disso, ao votar a Medida Provisória (MP) 870, os deputados mantiveram a estrutura do governo, com 22 pastas.

Ao participar de um evento na embaixada de Israel após a votação, o presidente Jair Bolsonaro minimizou a derrotra sobre o governo.

— Continua com o governo — limitou-se a dizer.

Moro lamentou a votação.

ANÁLISE : Resultado da votação é copo meio cheio, meio vazio

—  Lamento o ocorrido. Faz parte do debate democrático. Agradeço aos 210 deputados que apoiaram o MJSP e o plano de fortalecimento do Coaf —  disse o ministro à colunista Bela Megale.

Após líderes do centrão alegarem que o PSL e a oposição descumpriram acordo durante a votação da reforma administrativa, o presidente da Câmara,  Rodrigo Maia (DEM-RJ), encerrou a sessão sem a análise do último destaque da matéria . A votação seria sobre a proibição da investigação de corrupção por auditores da Receita Federal. Em ambiente conturbado, o líder do DEM, Elmar Nascimento (BA), chegou a relacionar o PSL a "laranjas", se referindo ao suposta esquema de candidaturas falsas da legenda. Foi vaiado pela bancada do partido do governo, mas aplaudido pela maioria da Casa.

Antes da apertada votação do destaque do Coaf, parlamentares do PSL usaram a tribuna para discursar contra a corrupção e apoiar as manifestações a favor do governo Jair Bolsonaro, marcadas para o próximo domingo. Enquanto transmitiam ao vivo a fala do deputado Filipe Barros (PSL-PR) pelo celular, os parlamentares foram vaiados pela oposição e deputados de centro.

— As manifestações são do povo brasileiro! Não são antidemocráticas! — discursou Filipe Barros.

Na comissão que analisou o tema no início do mês, centrão e da oposição se uniram para defender a mudança no Coaf e a transferência da Funai (Fundação Nacional do Índio) para a Justiça.

Os únicos partidos que orientaram o voto a favor de Moro, além do PSL, foram Podemos, PROS, Cidadania, NOVO e PV. PSD e PSDB liberaram a bancada para votar como quisesse. Ao justificarem o voto, líderes do centrão disseram que a prática internacional recomenda a permanência do órgão na Economia.

— Em todos os países civilizados, inclusive os que fazem parte da OCDE, (órgãos como o Coaf) funcionam nos respectivos ministérios da Economia. A Alemanha, em 2018, para fazer acordo internacional, teve que modificar da Justiça para a Economia — disse o líder do PP, Arthur Lira (PP-AL).

Para Elmar Nascimento (BA), a pressão das redes sociais, personificada por deputados que fizeram "lives" durante a votação, pesou para que o placar não ficasse desequilibrado contra Moro. Ele sustenta que o argumento para manter Coaf na Economia seja técnico. Já José Nelto (GO), líder do Podemos, lamentou a derrota do governo.

— É uma derrota de quem quer combater o crime organizado e a lavagem de dinheiro. Essa casa representa a vontade popular, mas hoje ela não atendeu o povo brasileiro — disse Nelto.

Mesmo com a deterioração da relação entre Palácio do Planalto e Congresso, na terça-feira líderes do centrão e Rodrigo Maia (DEM-RJ) decidiram votar Medidas Provisórias de interesse do governo para limpar a pauta. O objetivo é que deputados possam tocar a sua agenda, sem depender da articulação do governo. Líderes já encaram a postura do Congresso como uma forma de “parlamentarismo branco”.

No início da sessão desta quarta-feira, com medo de que o centrão não permitisse a votação nominal para o destaque do Coaf, o PSL apresentou um requerimento para ter qualquer decisão de mérito votada em painel eletrônico, com indicação de como votou cada parlamentar.

O centrão entrou em obstrução e o PSL recuou, retirando o requerimento. De qualquer forma, os líderes concordaram em contar os votos em painel eletrônico na votação sobre o Coaf, ao contrário do que temia a bancada do partido.

Durante o encaminhamento da votação, o deputado tucano Célio Silveira (GO) afirmou que votaria tudo o que "necessário para o país crescer e se desenvolver, inclusive a questão do Coaf".

Rodrigo Maia respondeu:

— Mas não vai fazer o Brasil crescer, não é, Deputado? O Coaf não vai fazer o Brasil crescer. Nós temos 20% da população cozinhando com lenha ou carvão — afirmou Maia.

Em outra derrota do governo, parlamentares também votaram para transferir a Funai, hoje no Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos para a pasta da Justiça. O ministério de Moro também ficará encarregado da demarcação de terras indígenas.

Foi rejeitado, também, o desmembramento do Ministério do Desenvolvimento Regional em duas pastas, Integração Nacional e Cidades. A proposta estava prevista no relatório da MP elaborado pelo líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE).

Na última semana, após o presidente Jair Bolsonaro voltar a criticar o Congresso, a ideia foi abandonada pelos parlamentares que inicialmente a defendiam, como Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, e Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente do Senado.

A recriação dos ministérios do Trabalho e da Cultura também foi rejeitada no plenário da Câmara. Após o fim da votação dos destaques, a MP vai para o Senado. Se não for votada até até 3 de junho, a medida perde a validade. Assim, voltariam a valer os 29 ministérios do governo Michel Temer.