Política

Propostas do projeto Anticrime apresentado por Moro têm expressiva aprovação de juízes, mostra AMB

Investigados pelo MP podem se declarar culpados antes da instauração do processo para abrandar pena, opinam magistrados
O ministro da Justiça, Sergio Moro, apresenta projeto de lei anticrime que levará para o Congresso Foto: EVARISTO SA / AFP
O ministro da Justiça, Sergio Moro, apresenta projeto de lei anticrime que levará para o Congresso Foto: EVARISTO SA / AFP

RIO — A maioria dos juízes brasileiros está de acordo com ao menos duas das 14 propostas que fazem parte do pacote anticrime apresentado pelo ministro da Justiça, Sergio Moro , na semana passada: o “plea bargain” (um acordo que pode ser feito entre o acusado e o Ministério Público) e a utilização mais recorrente da videoconferência em interrogatórios. Os dados fazem parte de uma pesquisa da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), apresentada nesta segunda-feira, que ouviu mais de 3,3 mil dos cerca de 18 mil magistrados em atividade do Brasil, incluindo 22 ministros de tribunais superiores.

O “plea bargain” é endossado por 89% dos magistrados de primeira instância, 92,2% dos de segunda instância e 82,4% dos ministros de tribunais superiores, somando os que concordam “muito” e “pouco”. Nesse modelo, comum nos Estados Unidos, os acusados se declaram culpados e conseguem benefícios sem a necessidade de julgamento. As penas poderão ser reduzidas até a metade e aplicadas de imediato. O acordo precisa, no entanto, ser homologado por um juiz.

Em relação à videoconferência, o apoio foi exatamente igual entre juízes e desembargadores: 96,1%. O texto de Moro amplia as possibilidades de uso desse expediente em audiências envolvendo detentos. O objetivo é agilizar processos e desafogar os governos que não têm estrutura pra fazer escoltas.

O presidente da AMB, Jayme de Oliveira, destacou que a presença no relatório dos dois temas levantados por Moro no pacote de medidas que será apresentado em breve ao Congresso. O ministro espera apenas a recuperação do presidente Jair Bolsonaro para submeter o pacote aos parlamentares.

— É possível verificar que há duas questões perguntadas no relatório que foram incluídas, posteriormente, no novo pacote de mudanças anunciadas pelos governo. (As questões da vídeoconferência e da transação penal) São anseios dos magistrados — pontuou Oliveira.

Coordenador da pesquisa, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luis Felipe Salomão, destacou que o conjunto de ideias formulado pela pesquisa é uma síntese do que os magistrados julgam precisar para sentirem que o trabalho do Judiciário está funcionando plenamente.

— A eficiência do trabalho é uma das principais preocupações dos juízes. É preciso que ele seja efetivo — afirmou Salomão.

Desburocratização

Silvana Batini, procuradora da República e professora da FGV/Direito Rio, acredita que esses dois pontos do projeto apresentado pelo ministro da Justiça contribuiriam, se aprovados pelo Congresso, para a desburocratização e a eficiência da Justiça:

— As duas medidas aliviam o Judiciário e os entraves que só quem lida diretamente, entende. O “plea bargain” economiza a máquina, já que abre-se mão de todo um processo, e com a videoconferência o processo penal se abre para os avanços da tecnologia.

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, elogiou a realização da pesquisa. Sem mencionar o “plea bargain”, defendeu que nem todas as situações sejam judicializadas e que a sociedade tenha outros mecanismos para resolver litígios:

— Quando tudo vai parar no Judiciário é sinal de que os outros mecanismos de soluções para a sociedade fracassaram.

Outro tema de grande discussão nos últimos anos na área penal, as audiências de custódia — a obrigação de apresentar o preso ao juiz em até 24h depois da prisão — divide magistrados da primeira e segunda instância: 50,2% e 80,9%, respectivamente, consideram que o mecanismo é importante para garantir direitos do acusado e deve ser aperfeiçoado. O presidente Jair Bolsonaro já defendeu o fim do mecanismo.

Corregedoria do STF

A maioria dos magistrados defende ainda que os ministros do STF devem se submeter a “algum tipo de atividade correicional, como uma corregedoria interna ao STF”: o apoio é de 95,6% na primeira instância e de 91,6% na segunda instância. Nos tribunais superiores, o nível é menor: 75%. Os ministros do STF não são fiscalizados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), como o resto da magistratura.

Também há maioria para a ideia de adotar um mandato para os ministros do Supremo: 56% na primeira instância, 58% na segunda instância e 65% nos tribunais superiores. O questionário não especificou qual seria a duração desse mandato.

A alteração da competência do STF para que atue apenas como Corte Constitucional, e não como como instância revisora, está entre as medidas mais citadas para tornar os tribunais mais eficientes. Foi a mais votada entre desembargadores (255 votos), e a segunda mais votada entre juízes (com 1.764 votos, atrás apenas da limitação de recursos, que teve 1.837) e ministros (15 votos, igualmente atrás da limitação de recursos, com 17). Os magistrados podiam escolher até três opções.

Sobre as áreas mais importantes de atuação do Judiciário em uma democracia, juízes e desembargadores apontaram as mesmas alternativas: controle da probidade administrativa interna e externa, defesa da ordem pública e defesa dos direitos humanos e controle da violência estatal

O levantamento da AMB mostrou que quase todos os magistrados defendem a utilização de uma linguagem acessível durante as audiências e sessões: 97,6% entre os de primeiro grau e 96,8% nos de segundo grau. Ao mesmo tempo, 71,5% e 80,7%, respectivamente, não querem abrir mão da linguagem formal. Além disso, a esmagadora maioria (90,9% e 94,6%) considera que o uso da toga “ajuda a garantir o respeito pelo trabalho”.

Coordenador da pesquisa, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luis Felipe Salomão disse que ela é uma síntese do que os magistrados consideram necessário para que seu trabalho seja efetivo.