Associação dos procuradores da República reage a fala de Lula contra membros do MP

Em discurso neste sábado, ex-presidente atacou procuradores da Operação Lava Jato. Entidade diz que ele nunca foi perseguido e que não pode 'zombar' e 'menosprezar'.

Por G1 — Brasília


Associação Nacional dos Procuradores repudiou as declarações de Lula

A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) divulgou nota neste sábado (7), na qual critica declarações do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva sobre os integrantes do Ministério Público que fazem parte da força-tarefa da Operação Lava Jato.

A entidade afirmou que o petista nunca foi perseguido pelos procuradores e disse que ninguém pode "zombar e menosprezar" a Justiça (leia íntegra da nota ao final desta reportagem).

Em discurso neste sábado diante da sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo, Lula atacou procuradores da Lava Jato autores da denúncia que levou à condenação dele a 12 anos e 1 mês de prisão pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).

"Acredito na Justiça, mas na a Justiça justa, baseada nas acusações, na prova concreta. Eu não posso admitir um procurador que fez um power point dizendo que o PT é uma organização criminosa, criada para roubar o país e que o Lula é o chefe. 'Eu não preciso de provas, eu tenho convicção', disse ele [em referência a suposta frase atribuída ao procurador da República, Deltan Dallagnol]. Eu quero que ele guarde a convicção dele para os comparsas e asseclas dele. Não pra mim", disse.

Na nota, a ANPR rechaçou as falas de Lula e saiu em defesa de Dallagnol.

"O procurador da República Deltan Dallagnol, citado por Lula, é o coordenador da força-tarefa em Curitiba, e foi alvo de ofensas com o objetivo de desacreditar o trabalho de um membro do MPF que cumpriu regularmente o dever e o direito de informar a população sobre os atos relativos à operação", diz trecho da nota.

A associação também afirma que é direito de Lula demonstrar "inconformismo" com a situação e divulgar sua versão dos fatos. Mas, declara a entidade, "nenhum cidadão está acima da lei e ninguém, por mais importante líder que seja, ou maior tenha sido o cargo que ocupou, pode zombar e menosprezar a Justiça. As instituições são pilares da democracia".

No documento, a ANPR diz também que o Ministério Público trabalha com "a lei na mão", respeitando os direitos dos investigados. Segundo a associação, os procuradores atuam "sem temer poderosos" e não se deixam "impressionar" por ataques.

A entidade chama de "fantasiosa" a versão de Lula de que há uma "conspiração" contra ele.

"É nestas circunstâncias, portanto, mais do que fantasioso – entra em verdade nas raias do delírio e da ofensa irresponsável e gratuita – imaginar que o Ministério Público Federal independente e a Justiça brasileira como um todo, encimada por um Supremo Tribunal Federal, estariam mancomunados em uma trama contra o ex-presidente", afirma outra parte da nota.

Ao final do documento, assinado pelo presidente da entidade, José Robalinho Cavalcanti, a ANPR sai em defesa de Dallagnol e dos demais integrantes da força-tarefa coordenada por ele.

"A ANPR repudia os ataques e se solidariza integralmente com o Procurador da República Deltan Dallagnol e com os componentes da Força-Tarefa Lava Jato. O ataque a um membro do MPF é um ataque a todos", finaliza o documento.

Íntegra da nota

Leia abaixo a íntegra da nota da Associação Nacional dos Procuradores da República.

Nota pública: ANPR rechaça declarações de Lula sobre o MPF e desagrava os procuradores da República que atuam na Operação Lava Jato

Associação repudia ataques do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Ministério Público Federal e à Justiça brasileira

Brasília (07/04//2018) – A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) vem a público repudiar as declarações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, proferidas durante discurso, no fim da manhã deste sábado, e desagravar o procurador da República Deltan Martinazzo Dallagnol e a equipe da Lava Jato, agredidos de forma absolutamente injusta e descabida.

Em uma clara estratégia que busca inverter os papéis, Lula, no momento em que é chamado a responder e cumprir pena por crimes graves pelos quais foi condenado após ampla defesa e devido processo legal, ataca uma vez mais o Ministério Público Federal (MPF), a Justiça Federal e seus agentes, tentando vender-se como um perseguido, o que nunca foi. O ex-presidente Lula teve e tem acesso a todos os meios de defesa e de contestação, que usou e está amplamente usando, e se, ainda assim, foi considerado culpado por duas instâncias da Justiça, é porque se impuseram a força das provas contra si – provas coletadas e apresentadas pela Força-Tarefa Lava Jato de Curitiba, coordenada pelo procurador da República Deltan Dallagnol. A Justiça, em todas as instâncias que se pronunciaram até o presente momento, deu integral razão aos Procuradores da República em Curitiba.

É direito do ex-presidente, como de qualquer pessoa, demonstrar inconformismo ou difundir a versão que lhe aprouver. Nenhum cidadão está acima da lei e ninguém, por mais importante líder que seja, ou maior tenha sido o cargo que ocupou, pode zombar e menosprezar a Justiça. As instituições são pilares da democracia.

O MPF atua sempre com a lei na mão e total respeito pelos direitos dos investigados, mas também o faz sem temer poderosos ou se deixar impressionar ou coagir por ataques, venham de onde vierem.

Para que se desmascare a versão fantasiosa de uma conspiração do mundo contra o ex-presidente, basta observar, por exemplo, que, dos seis ministros da mais alta Corte da Justiça brasileira que negaram o habeas corpus preventivo a ele na última quarta-feira, quatro foram indicados pela ex-presidente Dilma Rousseff; uma – a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, também de forma lamentável vítima de ataques covardes por forças políticas que apoiam o ex-presidente – pelo próprio então presidente Lula, e um pelo presidente Michel Temer, eleito em 2014 na chapa de Dilma e do PT, sendo que este último, o ministro Alexandre de Moraes, substitui na Corte o falecido e saudoso ministro Teori Zavascki, igualmente nomeado por Dilma, relator original da Operação Lava Jato, e autor do voto que conduziu o Supremo ao retorno à jurisprudência adotada em todo o mundo de cumprimento da pena uma vez formada a culpa e encerradas as instâncias ordinárias e de análise de provas.

É nestas circunstâncias, portanto, mais do que fantasioso – entra em verdade nas raias do delírio e da ofensa irresponsável e gratuita – imaginar que o Ministério Público Federal independente e a Justiça brasileira como um todo, encimada por um Supremo Tribunal Federal, estariam mancomunados em uma trama contra o ex-presidente. As versões podem ser várias. A verdade e as provas são uma só. E elas impuseram a condenação do ex-presidente.

De outra banda, a Operação Lava Jato é a maior investigação contra a corrupção da história do país, e hoje também a maior do mundo em extensão, valores e envolvidos, premiada e reconhecida nacional e internacionalmente com as maiores honrarias, precisamente por conta da excelência e eficiência no cumprimento da lei. São centenas de investigados, de réus e de já condenados, muitos deles ligados, sim, a partidos políticos, mas de muitos partidos. A atuação da Força-Tarefa fundamenta-se em provas robustas reunidas ao longo de anos de investigações que se tornaram referência no Brasil e no mundo.

O procurador da República Deltan Dallagnol, citado por Lula, é o coordenador da força-tarefa em Curitiba, e foi alvo de ofensas com o objetivo de desacreditar o trabalho de um membro do MPF que cumpriu regularmente o dever e o direito de informar a população sobre os atos relativos à operação. Dallagnol tem o respeito e o apoio da ANPR e dos procuradores da República, por conduzir-se de forma dedicada, eficiente, profissional e competente nas investigações. Mais que isso: tem também a admiração de todo o país. Deltan sempre se portou e se manifestou de forma cortês e correta, sendo, por mais este motivo, incabível e lamentável a forma rude com que foi atacado no dia de hoje.

Na mesma linha técnica e isenta têm agido todos os procuradores da República, policiais e juízes federais na operação. A Força-Tarefa é composta por conscientes e competentes agentes do estado. E também foram indeferidas todas as representações e processos judiciais apresentados pela defesa do ex-presidente contra Deltan.

Nada nem ninguém afastará os membros do MPF do cumprimento equilibrado, impessoal e destemido de seus deveres. A ANPR repudia os ataques e se solidariza integralmente com o Procurador da República Deltan Dallagnol e com os componentes da Força-Tarefa Lava Jato. O ataque a um membro do MPF é um ataque a todos.

José Robalinho Cavalcanti

Procurador Regional da República

Presidente da ANPR