08/05/2016 12h42 - Atualizado em 09/05/2016 18h12

Professora e aluna desenvolvem software que auxilia surdos em MT

Projeto será apresentado por elas em Cuba no próximo mês.
Software tenta apresentar conteúdo de maneira lúdica com boneca digital.

Do G1 MT

Aluna Cássia Cristine de Souza Silva, de 17 anos, e a professora Dandara Caroline de Oliveira Lima, de 26 anos (Foto: Arquivo pessoal/ Cássia Cristine de Souza Silva)Aluna Cássia Cristine de Souza Silva, de 17 anos, e a professora Dandara Caroline de Oliveira Lima, de 26 anos (Foto: Arquivo pessoal/ Cássia Cristine de Souza Silva)

A professora Dandara Caroline de Oliveira Lima, de 26 anos, e a aluna Cássia Cristine de Souza Silva, de 17 anos, do Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT) de Cáceres, município a 220 km da capital, estão trabalhando há cerca de um ano em uma ideia que visa auxiliar a vida escolar dos deficientes auditivos. O projeto 'Sida' (Software de inclusão de pessoas com deficiência auditiva) começou há um ano e já está prestes a ser apresentado internacionalmente.

A dupla pensou em aliar o nome do software com uma questão gráfica. As informações sobre o conteúdo didático são representadas através de um site que tem vídeos falados em Libras (Língua Brasileira de Sinais) pela 'Cida', uma boneca animada por computador para deixar o conteúdo um pouco mais lúdico.

A ideia surgiu na Mostra Científica do Pantanal do ano passado e já alçou fama até fora do estado. Professora e discente participaram entre os dias 8 e 10 de abril do evento tecnológico chamado 'Computer on the beach', que foi realizado em Florianópolis. O trabalho rendeu para elas um segundo lugar entre apresentações científicas. A boneca Cida ganhou, recentemente, até uma versão física, levada pelas duas para o evento.

A professora Dandara, que leciona nas matérias de desenvolvimento de sistemas e informática, conta que o objetivo do projeto é contribuir com a formação escolar e acadêmica dos surdos.

Ela explica que o software funciona por meio de um site que consegue decodificar, através de palavras chaves, conceitos e explicações didáticas sobre várias matérias.

“O professor utiliza um microfone, conectado a um computador, fala a palavra-chave e destrava a aula em libras que é apresentada por meio de um vídeo com a nossa mascote Cida. Todo isso funciona depois da produção e cadastro da aula do professor no site”, explicou.

Projeto será apresentado em Cuiabá em junho (Foto: Arquivo pessoal/ Dandara Caroline de Oliveira Lima)Projeto será apresentado em Cuiabá em junho (Foto: Arquivo pessoal/ Dandara Caroline de Oliveira Lima)

A docente, que é natural de São Jose dos Quatro Marcos, município a 343 km de Cuiabá, explica que antes do desenvolvimento do programa, ela e um grupo de alunas pesquisaram sobre várias deficiências e as tecnologias que auxiliam essas pessoas. Após chegar em um consenso, elas decidiram trabalhar com os deficientes auditivos.

“A vida escolar deles é muito complicada. Existe pouquíssimo conteúdo voltado para eles. Por causa disso, boa parte deles não concluem nem o ensino fundamental. E quem vê de fora pensa que é porque eles não querem. Na verdade, eles não conseguem porque o material não é adaptado”, afirmou.

Por causa disso, a professora defendeu que o foco do software é o conteúdo escolar e que os alunos não ficarão dependendo de um professor porque os interessados ainda poderão acessar o todo o material de casa, após se cadastrarem e escolherem a matéria específica.

Dandara contou ainda que irá apresentar a ideia internacionalmente no próximo mês. Ela e Cássia devem participar do VII Congresso Internacional Educación y Pedagogía Especial que acontecerá em Havana, Cuba, no dia 27 de junho. “Nós estamos muito animadas com a ideia e pretendemos expandir nossas fronteiras com essa apresentação”, argumentou.

A estudante Cássia, que está no segundo ano do curso de informática no IFMT, contou que sempre pensou em produzir algo que pudesse auxiliar as pessoas com algum tipo de deficiência e a que a feira de ciências que participou foi a oportunidade perfeita.

A jovem, que é natural de Cáceres, afirmou que nunca havia saído nem da cidade natal quando, no mês passado, foi para Florianópolis apresentar a ideia. “Foi muito bom para a gente. Além dos vários contatos que fizemos e pessoas importantes da área que conhecemos, conseguimos um segundo lugar na categoria que disputamos. Foi tudo incrível”, relatou.

Ela revelou que a ideia por enquanto não tem patrocinadores e parceiros e que todo o financiamento tem sido feito com a ajuda de sua família e de Dandara. Entre as próximas missões das cientistas está conseguir a obtenção de parceiros e financiadores que queiram investir na ideia.

Cássia, que termina o curso no meio do ano que vem, relatou que pensa em fazer uma graduação em computação gráfica e que a única certeza que tem do futuro é que pretende seguir tocando o projeto Sida por um bom tempo.

“Estamos recebendo bastante reconhecimento, apesar de tudo ser tão novo. Pessoas da cidade e de fora que eu nem conheço já vieram me parabenizar pela ideia. Não passa na minha cabeça começar a me envolver de maneira séria com outro projeto, estou 100% focada nesse”, disse.

Didática
O professor Fábio Vieira de Souza Júnior, do curso de Letras/Libras da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), explicou que a principal dificuldade em relação ao aprendizado dos surdos é com o material.

“A disponibilidade do material é uma questão sempre complicada. Ele quase sempre está em língua portuguesa e às vezes é difícil para quem só fala Libras. Entre as lutas da comunidade está a tentativa de fazer com que o Enem possa ter uma edição em Libras”, afirmou.

Ele contou que no quesito tecnologia, aplicativos de vídeo chamada como o Face time e o Skype são bastante difundidos entre os surdos. Além disso, existem aplicativos para celular que realizam a tradução entre Libras e outras línguas.

Sobre o projeto Sida, Fábio lembrou que é preciso cuidar dos conceitos em relação ao conteúdo escolar, mas que a iniciativa é extremamente satisfatória. “Pode ser uma forma de criar convenções de sinais. Existindo um registro, pode ser que haja uma preferência das pessoas”, argumentou.

O docente também elucidou que apesar de certo temor social, o termo surdo é o preferido entre a comunidade. “Na verdade, deficiência auditiva nós usamos para um contexto mais clínico, médico. Surdos é um conceito mais cultural e que as pessoas que têm a condição acabaram adotando e criando uma identificação”, contou.

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