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USP, Unicamp e Unesp brigam por aumento de teto para conter saída de professores

Universidades estaduais paulistas temem perder profissionais para instituições particulares ou federais
Redução de salário de professores acima do teto chegou, em alguns casos, a R$ 5 mil Foto: Lalo de Almeida/Folhapress
Redução de salário de professores acima do teto chegou, em alguns casos, a R$ 5 mil Foto: Lalo de Almeida/Folhapress

SÃO PAULO - As três universidades estaduais de São Paulo querem rediscutir o teto salarial dos professores no estado para conter a debandada de profissionais para universidades particulares e federais. O teto de rendimento dos docentes nessas instituições segue o salário do governador, atualmente fixado em R$ 23.048,59. Nas federais e em alguns estados, chega a R$ 39 mil, equiparado a salários de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) — referência para o teto do funcionalismo público federal. Caso essa diferença de cerca de 40% não seja reduzida, os reitores de USP, Unicamp e Unesp temem que a saída de profissionais de seus quadros seja agravada.

O teto voltou a ser destaque neste semestre, quando as universidades começaram a cortar os salários que estavam acima do valor fixado em lei. Ao menos 1,2 mil professores da ativa tiveram parte de seus ganhos reduzidos nas três escolas. Na USP, houve casos em que a redução chegou a R$ 5 mil. Outros 1.427 aposentados dessas três instituições também foram afetados pelos cortes.

— É evidente que um teto de R$ 23 mil no Brasil é um salário alto, mas estamos falando de uma carreira extremamente qualificada, de 20 anos de formação do profissional que dedicou a vida ao ensino público. Precisamos atrair e manter as pessoas boas, e não incentivar uma fuga de cérebros para outros locais—afirma o reitor da Unicamp, Marcelo Knobel.

Knobel pontua que o teto paulista é o mais baixo do país. Os maiores tetos das universidades estaduais estão hoje no Espírito Santo, Pará, Paraná, Rondônia e Tocantins, proporcionais aos rendimentos dos ministros do STF. No Rio de Janeiro e em Minas Gerais, o teto é R$ 36.064, equiparado ao salário de um desembargador.

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Para o reitor da Unesp, Sandro Valentini, a tendência é que áreas mais aquecidas, como Medicina, Economia e Engenharia, percam cada vez mais profissionais interessados na vida acadêmica em São Paulo:

— Estamos comparando coisas incomparáveis, uma carreira em que é preciso demonstrar mérito com o subsídio de um governador — critica Valentini.

Promoção 'arcaica'

É o caso do professor de economia do Insper (instituição de ensino superior e de pesquisa sem fins lucrativos), Fabio Sanches, de 40 anos. Após dar aulas em tempo integral na USP por quatro anos, saiu quando recebeu propostas de escolas particulares. Ele pondera, entretanto, que o teto salarial não é o único entrave ao professor universitário estadual:

— As promoções nas universidades estaduais não dependem, por exemplo, de quantos artigos estamos publicando em revistas científicas. É necessário fazer vários concursos internos para se promover, e isso é uma coisa arcaica. É como se a publicação fosse diluída em provas.

O teto remuneratório em São Paulo está determinado na Constituição Estadual de 1989, que diz que nenhum salário, incluindo gratificações e bonificações, deve ultrapassar o do governador. As três estaduais têm autonomia financeira de gestão, e o orçamento é financiado com parte da arrecadação do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). Os salários superiores ao teto eram pagos a docentes que tinham mais tempo de casa ou recebiam bonificações, por exemplo.

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No entanto, de acordo com as reitorias, os valores passaram a ser revistos após pressão do Tribunal de Contas do Estado, além de recorrentes multas aplicadas diretamente no nome dos reitores e da não homologação no TCE-SP de aposentadorias acima do teto. Segundo Knobel, também houve receio de os professores terem de devolver, de forma retroativa, os valores recebidos além do novo limite.

Segundo Vahan Agopyan, reitor da USP, pedir demissão era algo atípico na universidade, mas está cada vez mais frequente.

— Em 44 anos que estou aqui, nem 10% pediram demissão. Recentemente, começaram a pedir mudança de dedicação, sendo que na USP ficavam até se aposentar. Teve uma debandada muito grande, e muitos foram para instituições particulares.

Em nota, o governo de SP informou que "leva em conta o equilíbrio financeiro das contas estaduais e a lei de responsabilidade fiscal" para decidir sobre o aumento do vencimento do governador. Afirmou, ainda, que o governo "compreende e valoriza" os professores universitários e que "respeita a autonomia das universidades e não interfere na gestão administrativa, pedagógica e financeira".

Entre janeiro e setembro deste ano, 39 docentes pediram demissão das três escolas. Em todo o ano passado, foram registradas 57 demissões. As aposentadorias não compulsórias, ou seja, antes dos 75 anos, somam 346 de janeiro a setembro de 2019, contra 380 em todo o ano passado.