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Política Lava-Jato

MPF vai resgatar da Europa diamantes e ouro de Cabral avaliados em R$ 9,6 milhões

Sem seguro, bens estão retidos na Suíça
Diamantes da loja Diamond Rocks, de Londres: pedras são semelhantes às de Cabral, guardadas na Suíça Foto: Reprodução
Diamantes da loja Diamond Rocks, de Londres: pedras são semelhantes às de Cabral, guardadas na Suíça Foto: Reprodução

RIO - O Ministério Público Federal (MPF) vai ter de arcar com o pagamento de transporte especializado, além de um seguro, para trazer de volta ao Brasil o ouro e os diamantes atribuídos por delatores ao ex-governador Sérgio Cabral. Avaliados em R$ 9,6 milhões, os bens permanecem há mais de um ano guardados em dois cofres em Genebra, na Suíça.

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Valores em espécie desvendados pela Operação Eficiência, da Polícia Federal, já foram repatriados, mas 4,5 quilos de ouro e 27 pedras de diamantes ficaram emperrados na Suíça porque as empresas contatadas para transportar as joias ao Brasil exigem a contratação de um seguro para o caso de extravio. Essa negociação é conduzida pela Secretaria de Cooperação Internacional (SCI) e pela Secretaria-Geral da Procuradoria-Geral da República (PGR), em Brasília.

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— Estamos desenvolvendo a parte burocrática para repatriar esses bens. Não é muito simples, há um seguro a ser contratado e precisa ter a transportadora especializada. A empresa pede o seguro e tem que ver a questão aduaneira lá e aqui — disse o procurador da República Leonardo Cardoso de Freitas, que integra a força-tarefa da Lava Jato no Rio de Janeiro.

Segundo ele, os valores do traslado e do seguro obrigatório sairão dos cofres públicos, por meio da Procuradoria-Geral da República.

— Quem vai pagar somos nós. O MPF, em princípio. A procuradoria está vendo isso. A gente está cotando, mas confesso que não sei os valores. São transportadoras de renome internacional.

Sem previsão de chegada ao Brasil, o ouro e os diamantes deverão ser trazidos por um avião e armazenados em um cofre no Banco Central, à disposição do juízo da 7ª Vara Criminal Federal do Rio, segundo o procurador. Cardoso creditou à falta de precedentes a demora na repatriação dos bens.

— Encontrei uma certa dificuldade porque é muito nova essa coisa de internalizar ouro e diamantes — disse, acrescentando: — Não encontramos nenhuma rotina existente e nenhum precedente para seguir. Trazer fisicamente complica um pouco. Como ninguém tinha feito, estamos tendo que desenvolver uma rotina do começo.

O ex-governador Sérgio Cabral Foto: Domingos Peixoto / Agência O Globo 19/01/2018
O ex-governador Sérgio Cabral Foto: Domingos Peixoto / Agência O Globo 19/01/2018

A PGR não informou o valor do seguro nem a empresa que fará o serviço de entrega dos minerais preciosos. Procurada pela reportagem, a secretária-adjunta Denise Neves Abade, da Secretaria de Cooperação Internacional, disse que “não é possível adiantar nenhum dado sobre o assunto porque o procedimento é sigiloso”.

As empresas Brinks Global e Prosegur, duas líderes do ramo, não quiseram informar o valor cobrado por esse tipo de contratação. Além de farta documentação, o transporte de diamantes e pedras preciosas, de acordo com as empresas, exige descrições da carga, do tipo de embalagem em que está acondicionada e a inspeção obrigatória de gemólogo na origem.

O CAMINHO DO DINHEIRO

No início do ano passado, em delação premiada, o doleiro Renato Chebar afirmou que adquiriu 4,5 quilos de ouro e 27 pedras de diamantes — 86 quilates, o equivalente a 20 gramas — com dinheiro de propina, que saiu, em parte, de contas que operava para Cabral em paraísos fiscais.

Segundo contou aos procuradores, em novembro de 2011 recebeu US$ 250 mil de um portador enviado à Europa por Carlos Miranda, então operador de Sérgio Cabral preso na Operação Calicute. O encontro aconteceu no hotel Schweizerhof, um dos mais luxuosos de Zurique. Depois de transportar o dinheiro de trem até Genebra, o doleiro decidiu comprar o ouro no banco BNP Paribas, “pois vislumbrava dificuldade de depositar o ouro em espécie”, segundo a denúncia do MPF.

As aquisições dos diamantes seguiram o mesmo raciocínio. Parte das pedras adquiridas em maio de 2016 por 1,2 milhão de euros está armazenada em um cofre particular na esquina da Place de Chevelu com a Rua Russeau, na cidade suíça. Comprados por US$ 1 milhão em setembro do mesmo ano, o restante permanece em outro cofre na zona franca do aeroporto de Genebra. O dinheiro saiu de duas contas no banco BSI, nas Bahamas.

As delações dos irmãos Marcelo e Renato Chebar garantiram a repatriação de cerca de US$ 102 milhões — o que corresponde a R$ 354 milhões, em valores atualizados. O dinheiro foi movimentado pelos doleiros por meio de nove contas em paraísos fiscais registradas em nome de empresas offshore . Do montante, cerca de US$ 80 milhões pertenciam a Cabral, segundo os delatores.

— Ao longo do ano foram chegando mais valores que foram recuperados, que compõem aqueles 102 milhões de dólares, como cerca de R$ 100 mil que estavam em um cartão de viagens — disse, em conversa reservada, um outro integrante da força-tarefa da Lava Jato.

Atualmente em Lisboa, os irmãos Chebar vêm ao Brasil para prestar depoimentos no MPF. A última vez foi em março.