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Niterói: 83% das famílias desabrigadas em 2010 continuam sem casa

Seis anos depois, Defensoria Pública tem ainda 800 ações pleiteando aluguel social

Parte das famílias desabrigadas aguardam a entrega das 1.240 unidades em construção no terreno do antigo Batalhão de Infantaria do Exército (3° BI), na Venda da Cruz; A obra era para ter sido concluída em fevereiro
Foto: Hermes de Paula / Agência O Globo
Parte das famílias desabrigadas aguardam a entrega das 1.240 unidades em construção no terreno do antigo Batalhão de Infantaria do Exército (3° BI), na Venda da Cruz; A obra era para ter sido concluída em fevereiro Foto: Hermes de Paula / Agência O Globo

NITERÓI - A bonança ainda está longe seis anos depois da tempestade. Das 3.200 famílias desalojadas na tragédia que provocou diversos deslizamentos na cidade, 2.646 continuam sem imóveis prometidos pelas autoridades na ocasião. Apenas 554 apartamentos foram entregues a moradores de bairros e comunidades carentes próximas ao Morro do Bumba. Sem as casas prometidas, centenas de vítimas que residiam em Fonseca, Caramujo, Baldeador, Morro do Estado, Morro do Céu, Morro do Castro e Cubango lotam, ainda hoje, o Núcleo Cível da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, onde correm mais de 800 ações movidas por quem deixou de receber ou sequer recebeu o aluguel social.

Dos 554 apartamentos entregues por meio do programa Minha Casa Minha Vida, da Caixa Econômica, 180 foram construídos no Viçoso Jardim, em 2012. Outras 374 famílias se mudaram para os condomínios Zilda Arns 1 e 2, no Fonseca, no ano passado. O aluguel social, no valor de R$ 400, é pago, atualmente, a 2.243 famílias, 403 a menos do que as 2.646 que ainda estão sem casas. Parte desse total ainda aguarda a entrega das 1.240 unidades em construção no terreno do antigo Batalhão de Infantaria do Exército (3º BI), em Venda da Cruz. A obra está atrasada, pois a previsão inicial de entrega era para fevereiro.

O auxiliar de serviços gerais Vanildo Silva, de 48 anos, está sob risco até hoje. Sua casa, na Travessa São Luiz, na Igrejinha, foi interditada pela Defesa Civil do município depois das chuvas, em 2010.

— Tive que sair de casa com minha mulher, minha irmã, que é especial, e minha filha de 4 anos, na época. Fui morar de favor na casa de um amigo em Rio do Ouro. Tentei me cadastrar no aluguel social, no Centro de Referência de Assistência Social do Badu, mas jamais consegui receber. Depois de dois anos, minha única opção foi retornar para minha casa interditada — conta ele, que aguarda um novo laudo da Defesa Civil, determinado há três meses pela Justiça e até hoje não realizado.

A diarista Lindomara Aparecida de Souza morava com os dois filhos no Morro do Céu, no Caramujo. Ela diz que também se cadastrou para receber o aluguel social, mas não conseguiu:

— Minha casa caiu, e só recebi, até hoje, uma parcela, em setembro do ano passado. Estou com o aluguel da casa em que moro atualmente atrasado há vários meses. Não posso pagar.

RECADASTRAMENTO AUMENTA NÚMERO DE AÇÕES

De acordo com a Defensoria Pública, o número de ações na Justiça pleiteando o pagamento do aluguel social vem crescendo em decorrência do corte do benefício verificado a partir de dezembro de 2015, depois do recadastramento feito pela prefeitura em outubro.

— Toda semana recebemos de três a quatro pessoas reclamando da suspensão do aluguel social. Algumas contam que voltaram para os imóveis danificados pelas chuvas em 2010, mesmo correndo riscos de desabamento, porque não recebem mais o benefício — alerta Christiane Byrro, defensora titular do Núcleo de Primeiro Atendimento Cível e do Consumidor de Niterói.

Cerca de metade das 800 ações foi ajuizada em Itaboraí e São Gonçalo, entre outros municípios. Segundo a Defensoria Pública, muitas famílias passaram a morar em cidades próximas depois da tragédia. Em trâmite nas 1ª e 2ª varas cíveis de Niterói, que compõem o Núcleo Cível da Defensoria Pública, há cerca de 400 dessas ações. A defensora pública Marina Oliveira, que atua nesses casos, diz que, em alguns deles, a Justiça decide em favor do corte do benefício.

— Estamos recorrendo da suspensão do aluguel social, mas alguns juízes têm entendido que o ente público não pode ser onerado eternamente. Enquanto isso, as famílias não recebem suas casas, nem o benefício para se manterem — ressalta.

Respeonsável pelo pagamento do aluguel social, a Secretaria estadual de Assistencia Social afirma que o cadastramento é responsabilidade do município. A administração municipal, por sua vez, diz que recebeu o cadastro elaborado em 2010 pela antiga gestão do município, com 3.200 famílias. Segundo a prefeitura, periodicamente, o governo do estado solicita que os beneficiários se recadastrem, para evitar pagamentos indevidos. “Quem não comparece tem o benefício cancelado. Desde 2010, muitas famílias deixaram de receber o aluguel social — por realocação, saída de situação de risco, aquisição de outro imóvel por meios próprios, aumento de renda familiar ou recebimento indevido do benefício”, diz a prefeitura em nota, ressaltando que Vanildo e Lindomara não estão cadastrados. A prefeitura acrescenta que os beneficiários que tiverem o pagamento interrompido devem procurar a Coordenadoria de Ação Social pelos telefones 2621-5140 e 2620-4770 ou comparecer à Avenida Ernani do Amaral Peixoto 171, sala 402, no Centro.