Por Cristina Boeckel e Henrique Coelho, G1 Rio


Imagem da retirada de corpos das ruas do Centro do Rio após a chacina da Candelária, em 1993 — Foto: Reprodução/ TV Globo

Todos os apontados por envolvimento nas oito mortes da chacina da Candelária, que completa 25 anos nesta segunda-feira (23), estão fora da cadeia. Os três eram policiais militares. Um deles, inclusive, é considerado foragido pela Justiça.

Neste domingo (22), o G1 mostrou que sobreviventes da chacina ficaram abrigados em favela na Zona Norte do Rio. A reportagem ainda contou o que aconteceu com os jovens nos anos seguintes.

Três PMs foram considerados responsáveis pelos assassinatos de oito crianças e jovens, entre 10 e 19 anos, e estas foram as penas:

  • Nelson Oliveira dos Santos Cunha, 261 anos (1996). Está solto.
  • Marcos Aurélio de Alcântara, 204 anos (1998). Está solto.
  • Marcus Vinícius Emmanuel Borges, 300 anos (2003). Está foragido.

Todos eles, no entanto, saíram antes de completar 20 anos de pena, graças a indultos judiciais. Alcântara saiu após cumprir 14 anos de prisão, assim como Cunha. Emmanuel foi o último a sair da cadeia, em 2012, mas é procurado pela polícia.

Outro policial, Arlindo Afonso Lisboa Junior, foi condenado a dois anos de prisão por ter com ele uma das pistolas usadas no crime, um revólver Rossi, calibre 38, quando foi preso em 1994 por roubo de carro.

O ex-PM Maurício da Conceição, o Sexta-Feira Treze, foi morto em 1994, antes de ser julgado.

Foragido em vaivém penal

Decreto assinado em 2010 permite que o benefício do indulto seja concedido a condenados por crimes considerados não hediondos que tenham cumprido 15 anos ininterruptos de pena com bom comportamento. O caso de Emmanuel se encaixa nos requisitos, já que o homicídio qualificado do qual é acusado só passou a ser considerado hediondo em 1994, um ano após a chacina.

Após o indulto, o Ministério Público estadual, então, recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Após um ano, os ministros do órgão suspenderam o benefício, e um pedido de prisão preventiva foi feito pela Vara de Execuções Penais. Porém, nunca foi cumprido, e Emmanuel está foragido desde então.

Outros envolvidos

Segundo o coronel Valmir Alves Brum, que foi um dos chefes da investigação interna da Polícia Militar sobre o caso, de seis a oito pessoas participaram do crime, liderado por Emmanuel, que era do Comando de Policiamento de Trânsito (Cptrans) na região da Candelária. O carro que ele utilizava foi alvo de pedras horas antes das mortes.

Ao levar quem apedrejou seu carro para a 1ª DP (Centro), não gostou do tratamento dado ao caso pela Polícia Civil e prometeu vingança. Juntou Alcântara, do 6º BPM, e Cunha, que havia acabado de dar baixa no Batalhão de Choque, além de outros PMS, para ir à forra na Candelária.

“Algumas colaborações na época quando eu comandei o Batalhão de Choque foram importantes. No setor prisional de lá, alguns presos, indignados com a situação que ocorreu, relataram a participação de outros elementos e não aqueles que estariam presos”, contou ele.

Candelária ainda mantém homenagens às vítimas da Chacina ocorrida em 1993, há 25 anos — Foto: Marcos Serra Lima/G1

Jurema Werneck, diretora-executiva da Anistia Internacional no Brasil, acredita que a série de casos suscita questionamentos à maneira como se pensa a segurança no país.

“A chacina da Candelária é uma chacina produzida por policiais fora de serviço. Se é verdade que esses policiais foram levados à Justiça, o problema da polícia e da letalidade da ação da polícia continua sendo um grave problema de violação de direitos humanos no Rio de Janeiro e no Brasil”, destacou.

Seis menores e dois maiores mortos

Os sobreviventes contaram que os algozes chegaram à praça em frente à Igreja da Candelária chamando um nome. Seria Marco Antônio Alves da Silva, o Come-Gato, um dos líderes do grupo.

Sem resposta, já que muitos estavam dormindo, dispararam suas pistolas sobre o grupo, que naquele momento tinha cerca de 40 jovens. Porém, de acordo com ativistas sociais que trabalhavam na região, o total chegava a mais de 70.

Pelo menos 42, meses após a tragédia, ficaram abrigados em uma favela na Zona Norte do Rio, no Lins de Vasconcelos.

Come-Gato foi expulso de casa pelo pai, inconformado ao descobrir que o filho era gay. O jovem acabaria recebendo outros rapazes sem teto da Favela do Rato Molhado.

De acordo com o coronel, além dos três PMs condenados pela Justiça, outros três também foram processados em 1995. Eles, no entanto, tiveram a absolvição pedida pelo Ministério Público.

Sobreviventes da chacina da Candelária ficaram abrigados em favela na Zona Norte do Rio

Sobreviventes da chacina da Candelária ficaram abrigados em favela na Zona Norte do Rio

Um grupo foi executado na Candelária e outros dois jovens foram executados no Aterro do Flamengo. Algumas armas que foram utilizadas na Candelária foram utilizadas no Aterro, de acordo com o exame de balística.

As vítimas foram:

  1. Paulo Roberto de Oliveira, 11 anos;
  2. Anderson de Oliveira Pereira, 13 anos;
  3. Marcelo Cândido de Jesus, 14 anos;
  4. Valdevino Miguel de Almeida, 14 anos;
  5. "Gambazinho", 17 anos;
  6. Leandro Santos da Conceição, 17 anos.
  7. Paulo José da Silva, 18 anos;
  8. Marcos Antônio Alves da Silva, o Come-Gato, 19 anos.

Ano difícil

Coronel Valmir Alves Brum contou que 1993 foi um ano complicado. Além da chacina, ocorreram também as investigações de outro crime bárbaro, a chacina de Vigário Geral, na qual 21 moradores de uma comunidade na Zona Norte foram assassinados, e a existência dos nomes de oficiais da Polícia Militar e delegados da Polícia Civil nas listas de pagamento de propinas do contraventor Castor de Andrade.

“Eram três investigações emboladas com praticamente as mesmas figuras investigando. Na Candelária eu era herói; na investigação da fortaleza eu virei inimigo das autoridades, porque era uma investigação de corrupção”, destacou Brum, em entrevista ao G1.

O setor que ele chefiava, composto por policiais da PM-2 (inteligência) e do Batalhão de Operações Especiais (Bope) não tinha profissionais envolvidos no esquema.

No detalhe, as silhuetas vermelhas que representam as vítimas do massacre: oito jovens, sendo seis menores de idade, foram mortos por policiais militares — Foto: Marcos Serra Lima/G1

Linha do tempo de acontecimentos da Chacina da Candelária — Foto: Fernanda Garrafiel/Editoria de Arte G1

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