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No Brasil, coronavírus é mais letal entre pretos e pardos, aponta estudo da PUC

Ser negro é o segundo fator de risco mais premente depois da idade, indica outra pesquisa, da Universidade de Cambridge
Um homem usando uma máscara facial passa por um grafite do artista Marcos Costa na entrada da favela Solar de Unhao, em Salvador. Foto: ANTONELLO VENERI / AFP
Um homem usando uma máscara facial passa por um grafite do artista Marcos Costa na entrada da favela Solar de Unhao, em Salvador. Foto: ANTONELLO VENERI / AFP

RIO - A Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, tem se mostrado mais letal entre negros do que entre brancos, segundo estudo divulgado pela PUC-Rio.

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O Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde (NOIS), liderado pelo Departamento de Engenharia Industrial do Centro Técnico Científico da PUC-Rio, analisou as taxas de letalidade da doença no Brasil conforme as variáveis demográficas e socioeconômicas da população.

Com dados sobre o coronavírus atualizados até 18/05/2020, a equipe de pesquisadores avaliou cerca de 30 mil casos graves das notificações para o novo coronavírus, disponibilizados pelo Ministério da Saúde. O resultado do levantamento mostra que quase 55% dos pretos e pardos morreram de Covid-19 enquanto que, entre os brancos, esse valor ficou em 38%.

De acordo com o coordenador do NOIS, Silvio Hamacher, a progressão dos casos confirmados da Covid-19 no Brasil tem sido influenciada também pelos fatores socioeconômicos, além da dinâmica de contágio do novo coronavírus:

— A letalidade em pretos e pardos sempre é superior à dos brancos, mesmo analisando pacientes da mesma faixa etária ou do mesmo nível de escolaridade. Isso demonstra que a taxa de letalidade do Brasil é influenciada pelas desigualdades no acesso ao tratamento — conclui.

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Quanto maior a escolaridade, menor a letalidade

O núcleo reuniu todos os dados disponíveis de internação, raça e escolaridade, e as diferenças sociais acompanharam as taxas de letalidade.

As chances de morte de um paciente preto ou pardo sem escolaridade (76%) são quase quatro vezes maiores que um paciente branco com nível superior (19,6%). Quando analisados na mesma faixa de escolaridade, pretos e pardos apresentaram proporção de óbitos, em média, 37% maior do que brancos.

Entre os brancos de nível superior, 80,35% se recuperaram e 19,65% morreram. Entre os pretos e pardos sem escolaridade, 23,96% se recuperaram e 76,04% morreram.

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O levantamento mostra ainda que pessoas brancas e sem escolaridade têm uma proporção de óbitos de 48% na enfermaria e 71% na UTI. Pretos e pardos, com a mesma escolaridade, têm 69% e 87%, respectivamente.

Para pessoas com ensino superior, a diferença é ainda maior: o percentual de óbitos de pretos e pardos é maior que o dobro da de brancos na enfermaria (17% contra 7%) e quase 60% maior na UTI (63% contra 40%).

Ser negro é o segundo fator de risco mais importante depois da idade, indica estudo

Uma outra pesquisa divulgada nesta quarta pela Universidade de Cambridge compartilha resultados semelhantes. De acordo com o Departamento de Inteligência Artificial da instituição, a população mais vulnerável no Brasil “é negra e pobre”. O resultado da pesquisa mostra que as desigualdades sociais no país se refletem nos números mortos pelo vírus.

O artigo acadêmico de autoria conjunta do laboratório de pesquisa do Departamento de Medicina da Universidade de Cambridge e de um grupo de pesquisadores brasileiros mostra que o impacto da etnia como fator de risco nos casos brasileiros mostra que o Brasil se tornou um dos principais campos de batalha contra o novo coronavírus.

Para os autores, os fatores de maior risco de mortalidade entre pardos e pretos têm implicações sociais consideráveis, uma vez que esses grupos contam com menos segurança social.

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O estudo concluiu que os pacientes que se identificam como pardo e preto apresentam risco significativamente maior de mortalidade do que aqueles que se identificam como branco. Segundo os autores, ser negro é o segundo fator de risco mais importante depois da idade.

Os pesquisadores sinalizam que os brasileiros na região Norte e Nordeste são mais vulneráveis à pandemia, diferente da região Centro-Sul. No entanto, a pesquisa revela que o Rio de Janeiro é ponto fora da curva, pois a composição étnica afeta o número de mortes de maneira semelhante à dos estados do Norte, embora tenha um nível de desenvolvimento socioeconômico mais alto.