• Raquel Pinheiro (@raquelpinheiroloureiro)
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Lázaro Ramos e Taís Araújo contracenam em O Topo da Montanha (Foto: Divulgação/Jorge Bispo)

Lázaro Ramos e Taís Araújo contracenam em O Topo da Montanha (Foto: Divulgação/Jorge Bispo)

Quatro anos e 300 mil espectadores depois, Lázaro Ramos e Taís Araújo sobem ao palco para mais uma temporada de O Topo da Motanha, a partir deste sexta-feira (16) e até o dia 25 de agosto, no Oi Casa Grande, no Rio. Em cena, ele é Martin Luther King Jr., e ela, Camae uma camareira que encontra o pastor americano e ativista dos direitos civis na véspera de seu assassinato, em abril de 1968. O elogiado espetáculo, que rendeu a Taís a indicação ao Prêmio Shell de Melhor Atriz, impactou não só o publico. "A peça reforça o que eu acredito enquanto cidadã, reforça minhas escolhas, meu posicionamento, minhas atitudes. Quando eu vejo o teatro lotado eu falo ‘que esperança, tem muita gente querendo respeitar o outro também, olha que legal’", afirma Taís sobre o texto de Katori Hall.

Dirigida por Lázaro - os dois são produtores de O Topo na Montanha -, a atriz conta que nos anos trabalhando com o marido, não só no teatro, aprendeu a ter mais cuidado com o que expõe da relação. "Quando você tem intimidade com uma pessoa, o cuidado tem que ser dobrado principalmente na frente dos outros, para não expor a pessoa", contou Taís a QUEM em um papop em que lembrou ainda Ruth de Souza, morta no final de julho passado.

Em sua trajetória, o espetáculo passou por 11 estados e 15 cidades, e João Vicente, de 8 anos, e Maria Antônia, de 4, filhos do casal, acompanharam os pais."Eles sabem alguma coisa, mas sabem o que é possível para crianças da idade deles: a Maria não sabe por exemplo que ele foi assassinado, não tem essa noção", diz Taís, que avisou aos meninos que eles poderiam ver O Topo na Montanha se quisessem, mas que teriam que ficar "quietinhos". "Não tiveram curiosidade", lembra a atriz aos risos.

Taís Araújo e Lázaro Ramos na peça O Topo da Montanha (Foto: Divulgação/Juliana Hilal)

Taís Araújo e Lázaro Ramos na peça O Topo da Montanha (Foto: Divulgação/Juliana Hilal)

No velório de Ruth de Souza, você falou sobre o pioneirismo dela  e como por muito tempo Ruth carregou essa responsabilidade de representar os negros na classe artística. Você e Lázaro sentem a mesma responsabilidade hoje?
A Ruth foi uma perda mesmo e é engraçado a gente falar isso porque foram 98 anos, ela viveu muito. Só que ela estava muito lúcida, e a perda foi essa. Ela queria muito estar conosco, passar as coisas, sentíamos esse desejo nela. Mas acho que a gente conseguiu muito celebrar a Ruth. Ela aproveitou muito esses últimos anos de vida sendo celebrada e saudada por nós o tempo inteiro.  Esse lugar que a gente ocupa é de responsabilidade, sim, mas tem tanto prazer nisso... Realmente é um lugar que é importante existir. E óbvio que a minha geração hoje em dia tem muito mais atores e atrizes negros com carreiras muito prósperas e respeitadas, é outra situação que na época em que a Ruth começou. E isso dá muita alegria para a gente.

Em quatro anos o Brasil mudou muito, em todos os aspectos. Acha que o público mudou seu entendimento sobre os temas discutidos em O Topo da Montanha?
Sim, em quatro anos o Brasil mudou muito, mas eu acho que as pessoas que vão à peça já sabem sobre o que elas vão ouvir: as palavras do Dr. King, respeito ao próximo, afeto. Elas vão refletir sobre essa importância nas nossas atitudes no dia a dia para uma sociedade que seja bacana para todo mundo. Quem vai ver O Topo da Motanha está querendo falar sobre isso ou escutar falar sobre isso.

Taís Araújo e Lázaro Ramos na peça O Topo da Montanha (Foto: Divulgação/Juliana Hilal)

Taís Araújo e Lázaro Ramos na peça O Topo da Montanha (Foto: Divulgação/Juliana Hilal)

Essa mudança inclui também as discussões sobre racismo?
Eu já acho que isso não foi nos últimos quatro anos. Tem um tempo aí que tem tido uma tomada de consciência superimportante em relação a muitos temas. Eu sinto o que o mundo tem mudado em muitos sentidos, tem muita coisa que você pode dizer ‘ah piorou’, mas tem muita coisa que você pode dizer ‘ah, melhorou’. É uma tomada de consciência principalmente no que diz respeito ao outro, à dor do outro, e às questões do outro.

Cerca de 300 mil pessoas, ou 3,5 Maracanãs lotados, já viram O Topo na Montanha. Você se surpreende ao saber que impactou tanta gente?
Pois é, muita gente, né? Ficamos muito feliz com isso porque, nossa, é tão difícil botar pessoas no teatro! Entendemos todas as dificuldades, as dificuldades econômicas... Eu entendo absolutamente tudo. Realmente não é barato, cultura nesse país é muito difícil Mas aí quando eu penso nisso dá uma esperança. Quando vemos os teatros superlotados de pessoas que querem ouvir falar sobre o que a gente acredita deveria ser a sociedade... Quando eu penso nisso eu falo: ‘cara, essa peça ela me impacta o tempo inteiro também, por isso que a gente não para de fazê-la’.

E de que forma o espetáculo peça afeta você, Taís?
Ela reforça o que eu acredito enquanto cidadã, reforça minhas escolhas, meu posicionamento, minhas atitudes. Eu acho ela muito importante. Quando eu vejo o teatro lotado eu falo ‘que esperança, tem muita gente querendo respeitar o outro também, olha que legal’.

Taís Araújo na peça O Topo da Montanha (Foto: Divulgação/Juliana Hilal)

Taís Araújo na peça O Topo da Montanha (Foto: Divulgação/Juliana Hilal)

Em quatro anos de estrada, teve alguma história com o público que marcou vocês mais?
Ah eu adoro contar essa história, que é a que mais me emociona: é a de um casal, que estava indo comemorar 50 anos de casados vendo a peçacom os filhos e os netos. O senhor tinha sofrido um AVC, que deixou muitas sequelas e, no final, a gente chamou os dois ao palco, porque no começo do espetáculo ela contou para mim que estava comemorando bodas de ouro. E fomos cantar parabéns para ele, que tentou falar, mas não conseguia, porque estava ainda com sequelas. Mas foi lindo. Isso foi em São Paulo, onde ficamos em cartaz mais de um anos. Aí, no último dia de temporada,  foram de novo e ele estava ótimo, o senhor tinha se recuperado completamente. Ele subiu ao palco e fez um discurso, foi bem bonito. Essa peça tem dessas coisas, as pessoas vão muito em família, comemorar aniversário, é a coisa mais linda. Sei lá o que tem esse espetáculo que faz com que una as pessoas. Eu acho esse o grande mérito dele.

Como foi dividir o palco como atriz com o Lázaro, e ao mesmo tempo, ser dirigida por ele nesses quatro anos de O Topo da Montanha?
Não é o primeiro trabalho que eu faço com o Lázaro, a gente tem trabalhado junto tem um tempo. O que eu aprendi e o que eu levo para a vida é que quando você tem intimidade com uma pessoa o cuidado tem que ser dobrado. Tem que ter mais cuidado na relação, principalmente na frente dos outros, para você não expor a relação, não expor a pessoa. Tem um lugar aí de aprendizado diário.

Lázaro Ramos na peça O Topo da Montanha (Foto: Divulgação/Juliana Hilal)

Lázaro Ramos na peça O Topo da Montanha (Foto: Divulgação/Juliana Hilal)

De que forma?
Às vezes tem alguma coisa de que eu discordo e tal, quero me posicionar, e eu tenho que me posicionar com muito cuidado, para ele não ficar exposto, para a gente não ficar exposto. Tem que ter um cuidado maior, mas isso não é só com o marido. Quando trabalha com marido, com amigo, com irmão, com alguém com quem você tenha um laço afetivo. As relações devem ser olhada com mais delicadeza, pelo menos é o que eu acredito.

Vocês já conversaram com seus filhos sobre a peça? Eles entendem o significado dela, sabem quem foi Martin Luther King Jr. e o que ele fez?
Olha eles sabem que a gente faz a peça sobre o Luther King e eles sabem que foi um reverendo que lutava pelos direitos civis, que foi assassinado. Eles sabem alguma coisa, mas sabem o que é possível para crianças da idade deles: a Maria não sabe por exemplo que ele foi assassinado, não tem essa noção. Ela sabe que era o Luther King, sabe o nome.

Como é a rotina de vocês quando saem em turnê com o espetáculo?
A gente leva eles nas viagens. Isso é maravilhoso, porque temos a oportunidade de mostrar o país para os nosso filhos quando a gente viaja para fazer peça fora do Rio, então para gente é super importante.

João e Maria já viram O Topo da Montanha?
O João já assistiu um espetáculo inteiro em São Paulo. A Maria viu ensaio no outro dia com João em Porto Alegre. Agora eu falei ‘o dia que vocês quiserem assistir podem assistir, mas têm que fica quietinhos’. Não tiveram curiosidade (risos).

Lázaro Ramos e Taís Araújo contracenam em O Topo da Montanha (Foto: Divulgação/Jorge Bispo)

Lázaro Ramos e Taís Araújo contracenam em O Topo da Montanha (Foto: Divulgação/Jorge Bispo)