Por Alcinete Gadelha, G1 AC — Rio Branco


União pede reintegração de posse de ponte da fronteira no Acre ocupada por imigrantes há mais de 10 dias — Foto: Raylanderson Frota/Arquivo pessoal

Uma ação ajuizada pela União pede a reintegração de posse da ponte da Integração, que liga a cidade de Assis Brasil, no interior do Acre, a Iñapari, no Peru. O local está ocupado por imigrantes que tentam sair do Brasil usando o Acre como rota desde o último dia 14.

A ação é contra os líderes da ocupação que pede, liminarmente, a desocupação da ponte. Além da determinação para que se abstenham de ocupar, obstruir ou dificultar a passagem em qualquer trecho da ponte, ou, de outra forma. O objetivo é garantir o tráfego nos dois sentidos da rodovia.

A ponte foi ocupada por pelo menos 300 imigrantes, a maioria haitianos. Até esta sexta-feira (26), cerca de 60 imigrantes continuavam acampados no local. Na petição, a União alega que a ocupação da ponte ocasionou, e permanecerá ocasionando, impacto econômico, na saúde pública e no tráfego comercial entre os países.

Com o pedido de liminar da União feito à Justiça Federal, o juiz federal Herley da Luz Brasil, por considerar a situação delicada, determinou que o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) fossem intimados para que se manifestem sobre o pedido.

A DPU e o MPF informaram que ainda não foram notificados. Segundo o despacho do juiz, o prazo é de até 48 horas para manifestação.

"Nada obstante se trate de procedimento especial, uma vez que a reintegração de posse foi ajuizada dentro de ano e dia, o que autoriza a concessão de tutela de evidência, o caso se refere a litígio coletivo que envolve situação delicada, em razão da vulnerabilidade social e econômica de imigrantes e do momento histórico da pandemia da COVID-19, revelando-se necessária a oitiva prévia tanto do MPF quanto da DPU", informou o juiz.

Ocupação

A situação dos imigrantes começou a ficar tensa desde o dia 14 deste mês, quando cerca de 300 imigrantes deixaram os abrigos que ocupavam e se concentraram na Ponte da Integração, na fronteira com o Peru. Os imigrantes tentavam deixar o país, mas foram barrados pelas autoridades peruanas.

No dia 16, os imigrantes enfrentaram a polícia peruana e invadiram a cidade de Iñapari, no lado peruano da fronteira. Depois de confronto, o grupo foi reunido pelos policiais peruanos e mandado de volta para Assis Brasil.

A crise imigratória resultou na visita do secretário Nacional de Assistência Social, do Ministério da Cidadania, Miguel Ângelo Gomes, que esteve no dia 19 deste mês em Assis Brasil para ver de perto a situação dos imigrantes que estão no município acreano e tentam atravessar a fronteira para deixar o Brasil.

O representante do governo federal se reuniu com o governador da Província de Madre De Dios, Luis Guillermo Hidalgo Okimura, e o prefeito de Iñapari, Abraão Cardoso. Na conversa, segundo a Agência do Governo do Acre, as autoridades peruanas informaram que o país avalia uma forma de abrir a fronteira para liberar a passagem dos imigrantes, mas que, por enquanto, a fronteira no lado peruano segue fechada.

A cidade ainda abriga mais de 300 imigrantes que estão divididos nos dois abrigos montados na cidade. São cerca de 104 na Escola Edilsa e outros quase de 300 na Escola Irís Célia. Além do grupo que ainda está sobre a ponte.

Cidade de Assis Brasil abriga mais de 400 imigrantes — Foto: Arquivo/Prefeitura de Assis Brasil

Testes para Covid

Com mais de 400 imigrantes retidos na cidade e sem conseguir passar para o Peru para seguir viagem, a prefeitura iniciou a testagem do grupo para Covid-19 na quarta (24) e, até essa quinta (25), 41 imigrantes que estão nos abrigos fizeram o teste rápido e nenhum deu positivo.

A informação foi confirmada ao G1 nesta sexta (26) pela secretária de Assistência Social de Assis Brasil, Johanna Oliveira. Segundo ela, o município reservou o ginásio coberto para receber os casos positivos da doença, mas não há nenhum imigrante no local.

“No primeiro momento nós tivemos um pouco de dificuldade para começar as testagens por conta da resistência deles. Mas, agora eles mesmos já estão se oferecendo, se voluntariando para testar. Como o teste de Covid tem os critérios para testagem, que é só pessoas que estão apresentando sintomas há mais de sete dias, a testagem vai ser por amostragem neste primeiro momento. A partir do momento que as pessoas forem apresentando sintomas é que são encaminhadas para testagem, que é o que o Ministério da Saúde estabelece”, disse a secretária.

A prefeitura montou um centro de testagem e atendimento médico para os imigrantes, onde essas pessoas vão ser atendidas por profissional médico pelo menos duas vezes na semana e as que apresentarem sintomas de Covid-19 devem ser testadas. O centro foi instalado em um prédio público da prefeitura.

A prefeitura já havia informado que estava se preparando para fazer a testagem de todos os imigrantes. A iniciativa se deu após uma haitiana de 35 anos testar positivo para Covid-19. Ela foi levada para o hospital regional de Brasileia, e como o quadro agravou, ela foi transferida para Rio Branco, onde continua internada.

A Secretaria Estadual de Saúde (Sesacre) informou que o estado ofertou 600 testes que estão sob responsabilidade da unidade estadual mista de Assis Brasil e seriam disponibilizados ao município após a entrega do plano de testagem ao Comitê Operacional de Emergência da secretaria.

A ideia é que o imigrante novo que chegar, ao solicitar acesso ao abrigo, deverá ser direcionado ao centro de testagem e atendimento médico ao imigrante para que, de acordo com a triagem e, se houver necessidade do teste rápido, esse imigrante tenha um destino correto, sem possibilidade de contaminar os imigrantes já alojados.

Assistência

Além da testagem para Covid-19, a prefeitura vem atendendo aos imigrantes há mais de ano com alimentação, água potável, abrigo e assistência médica, mas nos últimos 10 dias o fluxo voltou a aumentar.

Diariamente são entregues cerca de 400 quentinhas de café da manhã, tanto para os que estão nos abrigos como para os que estão acampados na ponte. Além disso, mais 350 refeições no almoço e outras 350 refeições na janta.

Há cerca de dois dias, segundo a secretária, o grupo que está na ponte começou a preparar suas refeições de almoço e janta e a prefeitura passou a entregar somente o café da manhã. No entanto, aqueles que preferirem, podem ir até um dos abrigos que será disponibilizada refeição.

“Eles estão cozinhando na ponte agora. Eles mesmos improvisaram com madeiras, bem rústico, e fazem comida lá mesmo. Nós estávamos levando comida para eles no almoço e janta, mas esse grupo que está na ponte é um pouco mais agressivo e como a assistência não consegue ter toda hora um policiamento do lado para oferecer segurança, achamos melhor interromper. Mas eles podem se alimentar em qualquer um dos nossos abrigos. Muitos deles vão até os abrigos, se alimentam e depois voltam para ponte para continuar o protesto deles”, afirmou Johanna.

Imigrantes ocupam a Ponte da Integração, em Assis Brasil — Foto: Raylanderson Frota/Arquivo pessoal

Policiamento

Além dos policiais do Batalhão de Choque da Polícia Militar e do Gefron, mais de 12 militares da Força Nacional e mais de 20 policiais rodoviários federais fazem o policiamento na região de fronteira.

Uma portaria do Ministério da Justiça e Segurança Pública, publicada no dia 18, autorizou o emprego da Força Nacional no Acre, no apoio às forças policiais no estado. A autorização é válida por 60 dias e pode ser prorrogada.

A determinação estabelece que as Forças Nacionais devem auxiliar "nas atividades de bloqueio excepcional e temporário de entrada no País de estrangeiros, em caráter episódico e planejado".

Ponte fechada para passagem de imigrantes de Assis Brasil para o Peru — Foto: Arquivo/Prefeitura

Rotas

São duas situações que fazem com que o número de imigrantes cresça na cidade de Assis Brasil; a primeira, a de imigrantes que entraram no Brasil entre 2010 e 2016 em busca de uma vida melhor e, com a crise da pandemia, tentam sair do país para seguir viagem até México, Canadá, Estados Unidos e outros países.

A segunda é que o Peru, mesmo fechando a passagem para a entrada de imigrantes, libera a saída deles para o lado brasileiro, então é uma porta de entrada para venezuelanos.

Sem conseguir passar para o Peru, alguns dos imigrantes retidos no Acre também tentam uma rota alternativa para chegar na Bolívia e de lá seguir viagem. Um grupo de mais de 40 pessoas foi barrado, no final da semana passada, já na Bolívia e mandado de volta por policiais bolivianos ao Acre após tentar fazer a nova rota.

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