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Economia

Equipe econômica prepara estratégia para aprovar 'nova CPMF'

Ideia é apresentar dados, segundo os quais, o novo tributo pesaria menos sobre o faturamento das empresas
Governo prepara novo imposto nos moldes da CPMF Foto: Pixabay
Governo prepara novo imposto nos moldes da CPMF Foto: Pixabay

BRASÍLIA - A equipe econômica prepara uma estratégia para defender no Congresso a ideia de substituir a atual contribuição sobre folha de pagamentos por um imposto nos moldes da CPMF . O plano é apresentar dados que mostrem que o modelo em estudo traria benefícios para a economia, com o incentivo a novos postos de trabalho.

O material inclui um levantamento, ao qual o GLOBO teve acesso, que mostra que o novo tributo pesaria menos sobre o faturamento das empresas — em média, cairia de 14,2% para 3,25%.

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O alívio para o setor produtivo, no entanto, teria uma contrapartida: brasileiros passariam a pagar impostos sobre operações hoje isentas, como transferências bancárias. Para especialistas, o modelo em estudo pode causar distorções, como aumento da desigualdade, e incentivar contribuintes a fazer transações em dinheiro, fora do sistema financeiro.

Hoje, empregadores recolhem 20% sobre os salários dos funcionários para financiar a Previdência. A proposta de reforma tributária do governo prevê substituir esse imposto por uma contribuição sobre pagamentos (CP). A alíquota seria, depois de um período de transição, de 1% — 0,5% na entrada e 0,5% na saída.

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O secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra, costuma dizer que o novo sistema incentivaria a geração de empregos. A ideia é que, com menos custos, empresas contratem mais.

Pela semelhança com a antiga CPMF, no entanto, a ideia enfrenta resistência de parlamentares e até do presidente Jair Bolsonaro. No sábado, em almoço com jornalistas, o presidente voltou a dizer que já havia orientado sua equipe de que é contra a proposta.

O estudo do Ministério da Economia estima quanto a contribuição sobre folha pesa sobre o faturamento de 128 atividades e compara essa carga com o efeito que a CP teria. Em geral, atividades que dependem muito de mão de obra teriam ganhos maiores.

Na educação, por exemplo, a tributação cairia de 16,04% para 2,57%. Setores mais ligados à indústria também teriam um alívio, embora menor. No segmento de refino de petróleo, a carga passaria de 12,35% para 4,19%.

Risco de distorções

Isso não significa que haveria redução na carga tributária. O peso dos impostos só seria mais distribuído por toda a sociedade. Na prática, a conta hoje paga pelos empregadores seria dividida por toda a população. Atualmente, a tributação sobre folha de pagamentos arrecada cerca de R$ 250 bilhões por ano.

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Para especialistas, a ideia de desonerar a folha de pagamentos é positiva, mas substituir o imposto pela tributação sobre pagamentos pode causar distorções. O tributarista Ilan Gorin destaca que esse tipo de sistema tende a ser regressivo — ou seja, não considera a capacidade de pagamento de cada contribuinte.

- Quem vai pagar a conta serão as pessoas físicas, e de uma forma mais injusta. O Imposto de Renda dá isenção para os que têm renda baixa e é progressivo. Enquanto uma CPMF prevê o mesmo percentual para todo mundo, não importando a classe econômica. A ideia de acabar com o peso da contribuição ao INSS para quem dá emprego é brilhante. A questão é quem vai pagar a conta — afirma o especialista.

O advogado e economista Eduardo Fleury, sócio da área tributária de FCR Law, vê riscos de que empresas evitem alongar cadeias para, assim, pagarem menos impostos. Segundo ele, isso poderia desestimular, por exemplo, a terceirização de serviços, o que diminuiria a eficiência da economia.

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- Imagina uma empresa de e-commerce que hoje terceiriza as frotas. Para a margem deles, 1% é uma fortuna. Se ela verticalizar um pedacinho da cadeia, já está ganhando 1%. Ou seja, começa a criar ineficiência — destaca.

Na avaliação do especialista, pessoas físicas tenderiam a ter o mesmo comportamento, evitando fazer transferências bancárias, por exemplo. O resultado seria uma redução das movimentações financeiras. Ou seja, a base de tributação do novo imposto diminuiria e seria necessário aumentar a alíquota.

- Se com 0,38% (última taxa da CPMF), já havia esse incentivo (a evitar transações bancárias), imagina com uma alíquota de 1% - critica Fleury.

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Já o tributarista Paulo Henrique Pêgas, professor do Ibmec-RJ, lembra que a ideia de tributar movimentações financeiras não é completamente negativa. Ele defende, no entanto, que o sistema se concentre em pessoas físicas e que a alíquota seja cobrada apenas em uma via das transações, para evitar dupla tributação.

- As empresas vão buscar caminhos para reduzir o número de transações bancárias. Isso é ruim para a economia. Se isso fosse cobrado como um complemento, só na pessoa física e apenas na saída, seria uma ideia inteligente. Colocar isso nas costas da empresa não vai dar certo. O movimento bancário vai se reduzir de tal forma que vai ser um tiro pela culatra - diz o especialista.

A tributação sobre transações financeiras é um dos tripés da reforma tributária do governo, segundo Marcos Cintra. A equipe econômica deve propor ainda a unificação de três impostos federais, que dariam lugar a um imposto sobre bens e serviços.

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O outro braço da proposta do governo é uma reformulação do Imposto de Renda (IR). Cintra promete uma “faxina” no tributo, o que incluiria a eliminação de deduções de saúde e educação, assim como de isenções de títulos do mercado financeiro, como LCI e LCA. Em contrapartida, está prevista uma redução das alíquotas.

ALÍVIO PARA O SETOR PRODUTIVO
Dados serão apresentados pelo governo ao Congresso (em %)
OS 10 SETORES
Contribuição sobre folha
(20%)
QUE MAIS GANHAM
CP
(0,5%, NO DÉBITO E NO CRÉDITO)
Serviços
1
6
,
6
7
domésticos
1
,
84
1
6
,2
Serviços de vigilância,
segurança e investigação
2,29
1
5
,
9
2
Condomínios e serviços
para edifícios
2
,
54
1
6
,
04
Educação
privada
2
,
5
7
1
5
,
42
Aluguel efetivo e
serviços imobiliários
2
,
5
1
5
,
5
3
Outros serviços
2
,
5
3
administrativos
1
5
,29
Desenvolvimento de sistemas e
2
,
54
outros serviços de informação
1
5
,
77
Água, esgoto, reciclagem
2
,
6
9
e gestão de resíduos
1
5
,
71
Livros, jornais
2
,
6
9
e revistas
1
4
,
84
Serviços de arquitetura
2
,
5
7
e engenharia
OS 10 SETORES
QUE MENOS GANHAM
14,04
Diesel -
biodiesel
3,95
12,68
Petróleo, gás natural e
serviços de apoio
3,57
10,71
Resinas, elastômeros e fibras
artificiais e sintéticas
3,04
12,96
Adubos e
fertilizantes
3,69
13,84
Óleo
combustível
4,08
12,75
Combustíveis
para aviação
3,8
10,21
Produtos químicos
inorgânicos
3,12
9,62
Produtos químicos
orgânicos
3,06
12,35
Outros produtos do
refino do petróleo
4,19
12,39
Naftas para
petroquímica
4,22
Fonte: Ministério da Economia
ALÍVIO PARA O
SETOR PRODUTIVO
CP
Contribuição
(0,5%, NO DÉBITO
sobre folha
E NO CRÉDITO)
(20%)
OS 10 SETORES
QUE MAIS GANHAM
Serviços
1
6
,
6
7
domésticos
1
,
84
1
6
,2
Serviços de vigilância,
segurança e investigação
2,29
1
5
,
9
2
Condomínios e serviços
para edifícios
2
,
54
1
6
,
04
Educação
privada
2
,
5
7
1
5
,
42
Aluguel efetivo e
serviços imobiliários
2
,
5
1
5
,
5
3
Outros serviços
2
,
5
3
administrativos
1
5
,29
Desenvolvimento de sistemas e
2
,
54
outros serviços de informação
1
5
,
77
Água, esgoto, reciclagem
2
,
6
9
e gestão de resíduos
1
5
,
71
Livros, jornais
2
,
6
9
e revistas
1
4
,
84
Serviços de arquitetura
2
,
5
7
e engenharia
OS 10 SETORES
QUE MENOS GANHAM
14,04
Diesel -
biodiesel
3,95
12,68
Petróleo, gás natural e
serviços de apoio
3,57
10,71
Resinas, elastômeros e fibras
artificiais e sintéticas
3,04
12,96
Adubos e
fertilizantes
3,69
13,84
Óleo
combustível
4,08
12,75
Combustíveis
para aviação
3,8
10,21
Produtos químicos
inorgânicos
3,12
9,62
Produtos químicos
orgânicos
3,06
12,35
Outros produtos do
refino do petróleo
4,19
12,39
Naftas para
petroquímica
4,22
Fonte: Ministério da Economia