Já não dá mais para ser floresta. Ainda assim, Marcelo Carvalho, diretor da Biovert Engenharia Ambiental e Florestal, responsável por cuidar das mudas plantadas pelos atletas do mundo inteiro na Cerimônia de Abertura dos Jogos do Rio, em 2016, quer evitar vexame internacional. Isso porque a promessa do Comitê Rio-2016 de plantar a Floresta Bosque dos Atletas, no Parque Radical, dentro do Completo Esportivo de Deodoro, não avançou mesmo com o compromisso assumido para 2,5 bilhões de pessoas, ao vivo, durante a transmissão da festa.
LEIA TAMBÉM: Medalhistas no Rio enfrentam oscilação rumo a Tóquio-2020
Dois anos após Rio-2016, gastos com manutenção chegam a R$ 44 milhões
A ideia era plantá-la há um ano, em agosto de 2017, e mostrá-la desenvolvida, com flores e frutos na Cerimônia de Abertura dos Jogos de Tóquio, em julho de 2020, ao custo de R$ 3,1 milhões. São cerca de 13.500 mudas, de 207 espécies da Mata Atlântica, algumas ameaçadas de extinção, como pau-brasil, cedro e palmito-jussara.
LEIA MAIS: A dois anos dos Jogos de Tóquio, COB não faz projeção de medalha
Raia brasileira tem novas atrações no Pan-Pacífico de Tóquio
— Nem calculo mais o prejuízo ou o gasto para mantê-la. Já saí desta seara. Quero apenas plantá-la — lamenta Carvalho, que não recebeu nenhum tostão pelo trabalho iniciado antes mesmo dos Jogos, quando elaborou a pesquisa das sementes, colheita dos frutos e retirada das mesmas. — Não posso largar as mudas. Lá na frente vão dizer que a culpa é minha. Tenho de ir até o fim.
Por isso e mesmo sem perspectiva de plantio, Carvalho vai trocando as mudas de vasos para acompanhar o crescimento lento, em viveiro em Silva Jardim, no Estado do Rio de Janeiro. Ele diz que tem mudas com 1,80 metro.
— Daqui a pouco vou levar uma árvore para replantar.
Jogo de empurra
O Tribunal de Contas da União chegou a abrir processo há um ano e determinou que o Comitê Rio-2016 apresentasse um plano de ação, com a ciência da Prefeitura. O acórdão, porém, foi objeto de recurso, e está suspenso. Na última quarta-feira, em reunião na sede do TCU no Rio, o secretário Márcio Pacheco, da Secretaria de Controle Externo no Estado do Rio de Janeiro, sugeriu que a floresta fosse incluída no plano de legado de Deodoro que até hoje não está concluído (assim como o da Barra da Tijuca). Esta proposta será analisada pelo Ministério do Esporte, que esteve neste encontro e tratou, com outros agentes, sobre legado a longo prazo. O custo, neste caso seria da pasta.
O problema é que a Biovert não tem contrato assinado com o Rio-2016. E por isso Ricardo Trade, diretor executivo do órgão desde junho de 2018, alega que este projeto não foi um compromisso assumido pelo comitê e não irá realizá-lo.
Como o “início” da floresta fez parte da Abertura do Jogos, festa do Rio-2016, mas trata-se de um legado para a cidade, o TCU entende que também é de responsabilidade da Prefeitura e da União. Foi iniciativa do TCU discutir este tema que estava numa espécie de limbo, sem que nenhum agente tivesse o assumido.
— Não temos nada assinado e, mais do isso, não tenho recurso para implementar legado. Legados são compromissos de governo e do COI (Comitê Olímpico Internacional) — afirma Trade, que conta que o órgão tem dinheiro para sobreviver até outubro mas que os compromissos assumidos em contratos serão levantados e honrados. — Tem coisa líquida e certa, como limpar o Parque Olímpico e entregar o terreno, ajustes em arenas, mas plantar árvore, não! Se tivesse contrato seria obrigado a incluir no cálculo da dívida. Tenho de ser frio e escolher minhas batalhas.
O órgão, que hoje se resume a 12 pessoas, ainda contrata empresa de auditoria externa para levantar o valor da dívida (deve chegar a R$ 200 milhões). Trade afirma que não sabe qual o valor mas que “tem ideia de orelhada”.
— Este foi meu erro, não ter contrato. Mas este é um compromisso moral. A ideia da floresta fez parte do show, estava no material de divulgação do comitê — diz Carvalho.
Já a Prefeitura esclareceu que não poderia arcar com este custo e que seus técnicos não encontraram solução para executar a obra (precisaria de licitação). A opção, segundo a Subsecretaria de Meio Ambiente, é via Medida Compensatória. Explica que esta possibilidade “está sendo analisada”.
Neste caso, o custo seria das empresas que tivessem de seguir a medida obrigatória de compensação ambiental. Quando não são passíveis de serem cumpridas no próprio local de determinados empreendimentos, normalmente envolvem intervenção em áreas públicas. As empresas teriam de contratar a Biovert:
— Esta é uma questão em que alguém tem de abraçar a causa, assim como eu abracei — encerra Carvalho.