Por G1


A ausência do Sistema Nacional de Desenvolvimento de Ciência, Tecnologia e Inovação na proposta do programa Future-se – lançado na semana passada pelo Ministério da Educação (MEC) para aumentar a verba privada no orçamento das federais –, foi classificada como "preocupante" e um "equívoco grave" pelo conselho que reúne as fundações de apoio às instituições de ensino superior e pesquisa, o Confies.

O Confies reúne 96 fundações que atuam em mais de 130 universidades e institutos federais. O grupo movimenta mais de R$ 5 bilhões por ano em cerca de 22 mil projetos.

O Future-se pretende mudar trechos de leis atualmente em vigor para mudar a autonomia financeira das universidades e institutos federais. A adesão é voluntária. Entre os pontos apresentados pelo MEC, a universidade que aderir ao programa poderá trabalhar com uma organização social a ser contratada pelo ministério em todos os três eixos: gestão, governança e empreendedorismo; pesquisa e inovação, e internacionalização.

"Soa estranho propor um programa que visa a atrair a participação de investimentos privados complementares aos da União como algo novo e desconhecer que cerca de 35% a 40% dos recursos que passam por essas Fundações provêm de empresas; e que quase todos os programas de startups, parques e pólos tecnológicos, incubadoras, entre outras, são geridos com o apoio das nossas Fundações", afirma o Confies, em nota.

"A surpresa e espanto pela situação é justamente pelo fato de o próprio MEC, juntamente com o MCTIC [Ministério da Ciência e Tecnologia], nos avaliar e credenciar oficialmente, a cada 5 anos, como instituições de apoio na gestão dos projetos de ensino, pesquisa, extensão e inovação das IFES [Instituições Federais de Ensino Superior]", diz o texto (Leia a íntegra abaixo).

Future-se

A proposta que o MEC elaborou para mudar a autonomia financeira das universidades e institutos federais foi aberta para consulta pública nesta quarta-feira (17). Até 15 de agosto, a população poderá participar enviando comentários sobre a proposta, que foi dividida em nove partes.

Com o programa, as universidades poderão:

  • Celebrar contratos de gestão compartilhada do patrimônio imobiliário da universidade e da União. As reitorias poderão fazer PPPs, comodato ou cessão dos prédios e lotes;
  • Criar fundos patrimoniais (endowment), com doações de empresas ou ex-alunos, para financiar pesquisas ou investimentos de longo prazo;
  • Ceder os “naming rights” de campi e edifícios, assim como acontece nos estádios de futebol que levam nomes de bancos ou seguradoras;
  • Criar ações de cultura que possam se inscrever em editais da Lei Rouanet ou outros de fomento.

Veja a nota na íntegra

"Não se pode ignorar uma experiência de mais de 25 anos de atuação de nossas entidades sobre as atividades fins das IFES e nos posicionarmos de forma racional, com vistas a propor correções no que foi divulgado e se sabe do Projeto. A situação é preocupante e exige uma discussão ampla para entender, entre outros aspectos, o motivo pelo qual uma importante engrenagem do SNDCTI (Sistema Nacional de Desenvolvimento de Ciência, Tecnologia e Inovação) e em muitas oportunidades fundamentas não consta na formulação do Programa.

As fundações de apoio são entidades privadas sem fins lucrativos, possuidoras de uma lei específica (Lei nº. 8.958/94, regulamentada pelo Decreto nº. 7.423/2010), fiscalizadas pelos respectivos Ministérios Públicos dos Estados e do Distrito Federal, conforme estabelece o Código Civil, obrigadas a observar os princípios do artigo 37 da Constituição Federal em suas atividades, e são credenciadas pelos Ministérios da Educação e da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MEC e MCTIC), contidas ainda na Lei da Inovação nº. 10.973/2004, no Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação (Lei nº. 13.243/2016) e seu Decreto nº. 9.283/2018 e, ultimamente, na lei dos Fundos Patrimoniais (nº. 13.800/2019);

Somos qualificadas para participar de projeto dessa natureza visando a melhoria da gestão de nossas Ifes. Portanto, consideramos um equívoco grave essa omissão. A surpresa e espanto pela situação é justamente pelo fato de o próprio MEC, juntamente com o MCTIC, nos avaliar e credenciar oficialmente, a cada 5 anos, como instituições de apoio na gestão dos projetos de ensino, pesquisa, extensão e inovação das Ifes.

De fato, não se pode desprezar o papel das Fundações, um importante ativo de gestão do sistema nacional de ciência, tecnologia e inovação. Hoje, afiliadas ao Confies são 96 (noventa e seis) fundações atuantes junto a mais de 130 (cento e trinta) Universidades e Institutos Federais, mobilizando mais de R$ 5 (cinco) bilhões por ano, em cerca de 22 (vinte e dos) mil projetos. Elas são responsáveis pela contratação de 60 (sessenta) mil pessoas, entre bolsistas, prestadores de serviços e colaboradores CLTs, além de 70% (setenta por cento) a 80% (oitenta por cento) das importações de insumos e materiais para pesquisa no país. Como exemplo desse frutífero e profícuo elo. Existem vários casos de sucesso, como os citados na própria apresentação oficial do Programa Future-se: a Coppe/UFRJ e o da Universidade Federal de Campina Grande. Ambos se baseiam na participação efetiva de suas Fundações de Apoio.

Também soa estranho propor um programa que visa a atrair a participação de investimentos privados complementares aos da União como algo novo e desconhecer que cerca de 35% a 40% dos recursos que passam por essas Fundações provem de empresas; e que quase todos os programas de startups, parques e polos tecnológicos, incubadoras, entre outras, são geridos com o apoio das nossas Fundações;

A proposta do MEC propõe que as OS criadas à luz da Lei 9373/98 sejam gestora flexível dos recursos complementares e orçamentários. Porém, nessa condição, as OS teriam de cumprir o Contrato de Gestão previsto no artigo 16º da Lei 9367/98 formado por metas anuais a serem cumpridas pela universidade, sob pena de abertura de processo administrativo e penalização dos dirigentes.

Tecnicamente as fundações poderão se transformar em OS. A questão é saber como fariam isso, se, nesse caso, estariam atuando contra a autonomia da universidade e com isso perdendo sua legitimidade de instituição que serve aos interesses da academia científica.

A imposição de metas de gestão no CG subtrairá o poder da autonomia das universidades do artigo 218 da Constituição Federal, contrariando, inclusive, o objetivo do Future-se.

Como consequência, as OS serão controladas de fora da universidade por meio do Contrato de Gestão, sob pena de não receber os recursos em contrapartida, pondo fim a toda e qualquer autonomia da universidade, princípio constitucional inscrito no artigo 218º, o que, no mínimo, implicaria na arguição de inconstitucionalidade do PL;

Sugestões:

  1. Em vez de OS, as universidades poderiam escolher suas fundações e poderão firmar convênio tripartite de cooperação com o MEC onde ficarão estabelecidas as regras de acesso aos recursos do fundo imobiliário, mencionado no PL, para desenvolvimento gerencial das Ifes, sem sacrificar a autonomia universitária, utilizando-se para tanto do regramento e exigências já existentes na legislação vigente e em acordos firmados com a Controladoria Geral da União (CGU).
  2. Para captar recursos de longo prazo, o PL manterá o acesso aos incentivos fiscais para os fundos patrimoniais (Lei 13.800/2019) de cada IFES, geridos pelas Fundações, para isso fazendo o estudo prévio de impacto no orçamento (artigo 14º da LRF – Lei de Responsabilidade Federal) para que venham funcionar a partir de 2020;
  3. O PL também aperfeiçoará outros mecanismos simplificadores da gestão articulando-os com os órgãos de controle e as concedentes para que não haja frustração nesse alcance;
  4. Não haverá interrupção do fluxo de recursos orçamentários previsto na LDO, mas a suspensão do bloqueio do orçamento realizado no primeiro semestre;
  5. Será com participação dos agentes interessados que será construído um plano de transição até o pleno funcionamento do gigantesco Fundo Imobiliário, anunciado pelo MEC;
  6. O Comitê Gestor desse fundo deverá ter uma representação das Ifes e outros agentes, como a Andifes, Conif e Confies;
  7. O prazo de Consulta Pública, dado pelo MEC, deve ser estendido para ouvir a comunidade sobre o documento básico inicial, revisto pelas entidades do setor, como Andifes, Conif e Confies;
  8. Inserção das Fundações de Apoio e todo o arcabouço jurídico vigente (ativo dos costumes e normas conquistados pela sociedade ao longo do tempo) como uma opção para as Ifes e ICTs."

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