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Política Lava-Jato

MPF cobra explicações do governo sobre investigação de lavagem engavetada

PGR quer criação de equipe conjunta entre Brasil e Espanha

Sede da Procuradoria-Geral da República, em Brasília
Foto: Antonio Augusto/PGR/21-06-2017
Sede da Procuradoria-Geral da República, em Brasília Foto: Antonio Augusto/PGR/21-06-2017

BRASÍLIA — A Procuradoria-Geral da República ( PGR ) cobrou formalmente do governo do presidente Michel Temer a criação de uma equipe conjunta de investigação entre Brasil e Espanha para investigar supostos repasses da empresa espanhola Defex a políticos e empresários brasileiros, entre eles Gregório Marin Preciado, ligado ao senador José Serra (PSDB-SP). Cópia de um ofício obtido pelo GLOBO mostra que, no dia 15 deste mês, a secretária de Cooperação Internacional da Procuradoria-Geral, Cristina Romanó, pediu explicação sobre as tratativas para a formação da equipe com os espanhóis.

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Investigadores da Audiência Nacional, a magistratura da Espanha, fizeram o pedido ao governo Temer no fim de 2016. Desde então, a proposta não saiu do papel. No mesmo ofício, Cristina Romanó também cobra explicações sobre os pedidos de criação de equipes conjuntas formulados por procuradores da Suíça, Argentina, Peru e Paraguai, todas elas desdobramentos da Operação Lava-Jato.

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No domingo, o blog do colunista Lauro Jardim informou que a proposta de criação da equipe Brasil e Espanha está parada no Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), do Ministério da Justiça.

Para procuradores brasileiros, a resistência do governo Temer em autorizar a criação das equipes conjuntas está atrasando as investigações importantes investigações internacionais. "Com relação ao acordo entre Brasil e Espanha, consulto se há houve retorno das autoridades espanholas em relação a proposta enviada pelo Ministério da Justiça brasileiro em setembro de 2017", pergunta a secretaria de Cooperação Internacional no ofício endereçado a Camila Colares Bezerra, diretora do DRCI.

"Solicito ainda que seja dado conhecimento ao texto da referida proposta do Ministério Público Federal, enquanto instituição de Estado interessada na negociação do acordo", acrescenta Romanó.

A criação de equipe conjunta depende de um acordo a ser firmado entre os governos do Brasil e Espanha e, depois, ratificado pelos parlamentos dos dois países. Sem a iniciativa do governo, resta ao procuradores dos dois países fazerem investigações pontuais e pelos canais burocráticos tradicionais, um processo mais lento e de resultados nem sempre satisfatórios.

Entre os alvos da investigação da Espanha estão também a mulher de Preciado, Vicência Tala Marin, prima de Serra,  o empresário Eike Batista e os lobistas Fernando Soares, o Baiano, e Júlio Camargo, estes três últimos já fisgados pela Operação Lava-Jato. A polícia espanhola suspeita que a Defex, uma empresa estatal, pagou propina a Marin num negócio relacionado a concessão do Porto Sudeste, em Itaguaí.

O empreendimento é controlado pela MMX, de Eike Batista, em sociedade com a Impala e o Mubadala, fundo de investimento de origem árabe. A investigação surgiu na Espanha e se estendeu ao Brasil e mais cinco outros países. Ao todo, a Defex teria desembolsado 7 milhões de euros em propina para obter contratos no exterior.

Pouco depois da chegada do pedido de criação de equipe conjunta com a Espanha, Serra deixou o Ministério das Relações Exteriores, em março do ano passado, e retornou ao Senado. O ministro explicou à época que estava com problemas de saúde. No Senado ele teria uma rotina de trabalho menos pesada que no Itamaraty, onde seria obrigado a fazer frequentes viagens ao exterior.

Antes de deixar o ministério, Serra chegou a conversar com Temer sobre o assunto, numa reunião no Palácio do Planalto. O ministro teria mencionado as investigações sobre Preciado, os vínculos familiares que une os dois e dito que a imprensa estava associando o empresário ao nome dele, segundo disse ao GLOBO uma fonte do Palácio do Planalto, quando o caso veio à tona.

Procurada pelo GLOBO, a diretora do DRCI informou que já respondeu o ofício da Procuradoria-Geral. Segundo ela, o governo brasileiro "consultou Suíça, Espanha e Argentina quanto à manutenção do interesse destes países em firmar os acordos de ECI, juntamente com proposta de texto". O DRCI estaria, agora, aguardando resposta. Camila Colares afirma ainda que a demora na criação da equipe conjunta com a Espanha se deve à preocupação das duas partes com a lisura dos processos.

"Toma-se tempo pois os dois países estão preocupados em buscar uma forma de acolher a nova ferramenta sem que isto gere perdas das garantias processuais. Esta não é uma tarefa fácil, muito embora estejamos otimistas que chegaremos a um modelo responsável e útil para as investigações", afirma a diretora. Ela afirma ainda que as negociações estão "progredindo" e que a não criação das equipes conjuntas não é obstáculo às investigações. " Toda a documentação solicitada pela Espanha foi entregue satisfatoriamente", afirma.

A Suíça pediu a criação de equipes conjuntas para investigar pelo menos mil contas de brasileiros. São contas que teriam movimentação suspeita de dinheiro e, para os suíços, deveriam passar pelo crivo de investigadores brasileiros. O acordo daria mais flexibilidade as duas partes. Procuradores brasileiros poderiam fazer investigações dessas contas na Suíça e procuradores suíços poderiam auxiliares os colegas no Brasil.

Os demais pedidos de criação de equipes conjuntas dizem respeito a investigações abertas a partir das delações de ex-executivos da Odebrecht. Para investigadores da Argentina, Peru e Paraguai, a participação direta de investigadores brasileiros poderia dar impulso maior a apuração dos casos.