Política Lava-Jato

Lava-Jato mira em nova fase empresário ligado a ex-cônsul da Grécia e propina a funcionários da Petrobras

PF investiga áreas de trading e fretamento de navios e cumpre 11 mandados de prisão
Navio-plataforma da Petrobras na Bacia de Campos Foto: Divulgação
Navio-plataforma da Petrobras na Bacia de Campos Foto: Divulgação

SÃO PAULO - A Polícia Federal (PF) prendeu, nesta quarta-feira, sete pessoas durante a 57ª fase da Operação Lava-Jato , apelidada de "Sem Limites". Segundo a investigação, grandes empresas internacionais de trading pagaram cerca de US$ 31 milhões de propina para funcionários da Petrobras entre 2009 e 2014. Os esquemas de corrupção aconteceram em duas áreas da estatal: trading (compra e venda de petróleo e derivados) e afretamento de navios.

Ao todo, a Justiça Federal autorizou 11 mandados de prisão e 27 de busca e apreensão no Rio e no Paraná. Um dos investigados está hospitalizado e não foi detido. Outras três pessoas não foram presas porque estão no exterior - a juíza Gabriela Hardt pediu a inclusão do nome deles na lista de procurados da Interpol.

O principal foco da investigação é a área de trading (compra e venda de produtos) e envolve funcionários de nível de gerência nas áreas de Marketing e Comercialização do centro de operações da Petrobras, no Rio, e do escritório da pretrolífera em Houston, no Texas (EUA). Em documentos apreendidos pela PF, eles eram tratados por apelidos como "Batman", "Flipper", "Tiger", "Phil Collins" e "Popeye" .

A investigação mostra que esses funcionários faziam pequenas alterações nos valores de cada transação. Na prática, a Petrobras vendia produtos para as trading companies por preços abaixo do mercado e comprava dessas mesmas empresas por preços ligeiramente mais altos. Parte do dinheiro que as companhias lucravam com o esquema era devolvido em forma de propina.

Entre as empresas privadas investigadas, estão três companhias especializadas em trading, que atuam como intermediárias entre compradores e vendedores de matéria prima, sediadas na Suíça: Vitol, Trafigura e Glencore. Segundo o MPF, elas fizeram pagamentos indevidos entre US$ 4,1 milhões a US$ 6,1 milhões relacionados a mais de 160 operações de compra e venda de derivados de petróleo e aluguel de tanques para estocagem.

Para dar ideia do volume movimentado por essas empresas, só a Trafigura realizou cerca de 960 operações comerciais legais com a Petrobras entre 2004 e 2015, totalizando uma movimentação de US$ 8,7 bilhões.

Como eram muitas movimentações financeiras, que envolviam grandes quantidades de dinheiro, foram gerados "recursos vultosos de propina ao final de um determinado espaço temporal", segundo a PF. Por enquanto, não foram revelados os nomes de políticos.

- As operações da área comercial da Petrobras no mercado internacional constituem um ambiente propício para o surgimento e pulverização de esquemas de corrupção, já que o volume negociado é muito grande e poucos centavos a mais nas negociações diárias podem render milhões de dólares ao final do mês em propina - afirma a procuradora Jerusa Burmann Viecili, integrante da força-tarefa Lava Jato no MPF em Curitiba.

'Ponta do iceberg', diz delegado

Pela manhã, policiais estiveram no apartamento do empresário Omar Emir Chaves Neto, no Leblon. Diretor de uma empresa de transporte marítimo, ele é ligado ao ex-cônsul honorário da Grêcia Konstantinos Kotronakis. Em agosto do ano passado, Konstantinos foi acusado de pagar propinas para o então diretor da estatal, Paulo Roberto Costa , e foi proibido de deixar o país por Sergio Moro.

Em coletiva após a deflagração da operação, o procurador Athayde Ribeiro Costa afirmou que a operação pode ser a ponta de um iceberg de mais um esquema de corrupção na Petrobras.

- É o principal ataque da Lava-Jato na área-fim da Petrobras. São investigadas duas empresas gigantes, mundialmente conhecidas eqie  possuem um faturamento muito superior ao da propria Petrobras.Praticaram crimes em mais de 160 operações de trading, isso demonstra que as investigações do estágio inicial estão apenas revelando a ponta do iceberg e muito ainda será revelado - disse.

Costa chegou a citar que a força-tarefa já foi procurada por interessados em firmar um acordo de colaboração premiado mas que, segundo ele, não há espaço para todos conseguirem um acordo.

Os investigadores suspeitam ainda que o esquema pode continuar em curso, já que dois dos investigados ainda trabalham na Petrobras e outros dos envolvidos fizeram visitas recentes à empresa.

- O Rodrigo (Bercovitz, funcionário da estatal em Houston) continua a negociar com representantes dessas três empresas a partir de meios não convencionais. Ele está negociando milhares de quantidades de barris trocando SMS com representantes das empresas estrangeiras de que o esquema criminoso não tenha parado - disse o delegado Felipe Hille Pace.

Participantes das irregularidades se referiam à diferença entre o preço de mercado de um produto e o valor praticado pela Petrobras para incluir a propina como "delta" - quarta letra do alfabeto grego, que, na matemática, é utilizada para representar a diferença entre duas variáveis.

Até o momento, a apuração da PF e do MPF revela que as empresas investigadas pagavam propinas para obter facilidades, conseguir preços mais vantajosos e realizar contratos com maior frequência em negócios que envolviam os seguintes produtos: óleos combustíveis (utilizados para geração de energia térmica em fornos e caldeiras), gasóleo de vácuo (utilizado na produção de gasolina e diesel), bunker (combustível utilizado nos motores de navio) e asfalto.

Além dos mandados de prisão e de busca e apreensão, a juíza Gabriela Hardt, responsável pela Lava-Jato, expediu ordens de sequestros de imóveis, indisponibilidades de contas bancárias de investigados e bloqueio de valores.

A PF chegou aos esquemas de corrupção a partir da análise de documentos apreendidos na 44ª fase da Lava-Jato, deflagrada em agosto do ano passado. A investigação recebeu o nome de "Sem Limites" porque os crimes ocorrem em diversos locais no país e no exterior.

Os investigados responderão pelos crimes de corrupção, organização criminosa e lavagem de dinheiro.

O GLOBO tenta contato com as empresas citadas na investigação e com os alvos de mandados judiciais.

As empresas Glencore e Trafigura informaram que não vão comentar o assunto.

Por meio de nota, a Vitol informou que adota uma política de "tolerância zero" em relação à práticas de corrupção. A empresa disse ainda que coopera com autoridades públicas em qualquer jurisdição onde sua atuação esteja presente.