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Política Brasília

Indicado para Funai é alvo de processo na Comissão de Ética da Presidência por conflito de interesses

Franklimberg Freitas aceitou, sem cumprir quarentena, cargo em conselho consultivo de mineradora
Franklimberg Ribeiro de Freitas participa de debate na
Câmara dos Deputados Foto: Wilson Dias/Agência Brasil/27-06-2017
Franklimberg Ribeiro de Freitas participa de debate na Câmara dos Deputados Foto: Wilson Dias/Agência Brasil/27-06-2017

BRASÍLIA — Escolhido pela ministra Damares Alves para presidir a Fundação Nacional do Índio (Funai) , o general da reserva Franklimberg Ribeiro de Freitas é alvo de um processo instaurado pela Comissão de Ética Pública da Presidência da República, que apura "eventual infração ética" por parte do militar. A comissão confirmou ao GLOBO na noite desta segunda-feira que o processo está tramitando, em fase de diligências.

Franklimberg presidiu a Funai entre maio de 2017 e abril de 2018, no governo do presidente Michel Temer. Após ser demitido por pressão da bancada ruralista, o general aceitou sem cumprir quarentena o cargo de presidente do conselho consultivo para assuntos indígenas da mineradora canadense Belo Sun, que tem projetos de exploração mineratória no Brasil próximos de terras indígenas no Pará.

O militar nem chegou a consultar a Comissão de Ética Pública da Presidência sobre a necessidade de ficar afastado por seis meses de funções relacionadas às atividades na Funai, o que contraria a lei que detalha situações de conflito de interesse. Mesmo assim, a mineradora fez um anúncio ao mercado sobre a ida de Franklimberg à empresa, que tenta uma licença ambiental para uma exploração com impacto em populações indígenas.

A história foi revelada pelo GLOBO em julho do ano passado. A partir do que foi relatado na reportagem, a Comissão de Ética da Presidência abriu um processo para apurar a contratação de Franklimberg pela Belo Sun. Em setembro, o colegiado decidiu pela obrigação de o general da reserva cumprir quarentena, por ter tido acesso a informações sensíveis em relação às populações indígenas, sendo o cargo na Belo Sun relacionado à mesma área da Funai.

Além da decisão sobre a quarentena, um processo segue apurando se o general cometeu alguma infração ética no exercício do cargo de presidente da Funai. A lei do conflito de interesses prevê até a demissão do servidor. Como a infração teria ocorrido quando Franklimberg já não era presidente do órgão, a punição prevista é a censura ética. Outras penalidades ficariam a cargo de eventuais processos administrativos disciplinares ou ações de improbidade administrativa, caso sejam instaurados.

Franklimberg voltará a presidir a Funai, conforme escolha da ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves. A Funai era vinculada ao Ministério da Justiça até o final do ano passado e foi remanejada de pasta no redesenho de atribuições da Esplanada no governo de Jair Bolsonaro, sob protestos de lideranças indígenas.

Franklimberg deixou a presidência da Funai no governo Temer por pressão da bancada ruralista. Quarenta deputados e senadores da Frente Parlamentar Agropecuária chegaram a entregar uma carta ao então presidente com um pedido de afastamento imediato dele, o que foi cumprido dias depois.

O comunicado ao mercado sobre a indicação do general para a Belo Sun foi feito em junho pela mineradora. Assim, Franklimberg chegou à função na empresa menos de três meses depois de deixar a Funai, o que significaria um desrespeito à lei de conflito de interesses, em vigor desde 2013. Pela lei, configura-se conflito de interesse a aceitação de "cargo de administrador ou conselheiro ou estabelecer vínculo profissional com pessoa física ou jurídica que desempenhe atividade relacionada à área de competência do cargo ocupado", num prazo de seis meses após a exoneração do cargo.

Em nota, a Belo Sun informou que o general "assumiu uma posição como membro do conselho consultivo na Belo Sun Mineração após o cumprimento da quarentena legal" e que "ele saiu da posição, por solicitação própria, em 28 de dezembro de 2018".

Em setembro, quando a Comissão de Ética determinou a quarentena, Franklimberg disse ao GLOBO que iria retomar o contato com a Belo Sun após o fim do prazo:

— Estamos cumprindo todas as formalidades. Não há nenhum problema. Isso foi acertado nas tratativas com a empresa. Assim que terminasse a quarentena, eu poderia ser contratado. Vamos agora esperar o término para a reativação das conversas.

A mineradora decidiu criar um conselho consultivo para assuntos indígenas, comunitários e ambientais após o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) suspender a licença de instalação da empresa para explorar anualmente cinco toneladas de ouro, ao longo de pelo menos 12 anos, no sudoeste do Pará, mais especificamente na cidade de Senador José Porfírio. O motivo foi que os povos indígenas que seriam afetados com o projeto deveriam ser consultados, seguindo os protocolos internacionais existentes, em especial uma convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Entidades que atuam na área afirmam que comunidades do Xingu serão afetados pela exploração do ouro na região.