Economia

Nike sofre boicote por apoio ao jogador de futebol americano Colin Kaepernick

Consumidores queimam tênis e ações caem com participação do atleta em campanha

Colin Kaepernick (centro), ex-quaterback do San Francisco 49ers, se ajoelha em protesto à execução do hino nacional americano, em 2016
Foto:
THEARON W. HENDERSON
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AFP
Colin Kaepernick (centro), ex-quaterback do San Francisco 49ers, se ajoelha em protesto à execução do hino nacional americano, em 2016 Foto: THEARON W. HENDERSON / AFP

NOVA YORK — A Nike enfrentou nesta terça-feira uma onda de boicote nas redes sociais após ter lançado, na véspera, uma campanha pelos 30 anos do slogan “Just do it”. É que ela tem como garoto-propaganda o jogador de futebol americano Colin Kaepernick, que causou polêmica ao se ajoelhar durante a execução do hino dos Estados Unidos numa partida em 2016. As hashtags #BoycottNike e #JustBurnIt se tornaram trending topics do Twitter. E os reflexos chegaram ao mercado, levando as ações da Nike a uma queda de 3,16% no pregão.

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A atitude de Kaepernick há dois anos atrás foi usada como protesto contra a opressão racial nos EUA, num momento em ocorriam execuções de negros nas ruas do país. O gesto do jogador, contudo, foi interpretado por muitos como desrespeitoso.

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“Não vou me levantar e mostrar orgulho pela bandeira de um país que oprime o povo negro e as pessoas de cor”, declarou o quarterback na época. Em setembro passado, o presidente Donald Trump defendeu em tuítes que jogadores da Liga Nacional de Futebol Americano (NFL, na sigla em inglês) fossem demitidos ou suspensos caso não ficassem de pé durante o hino.

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Kaepernick não abriu mão de sua posição e está há mais de um ano fora da NFL. Ao que leva à frase de efeito da nova campanha: “Acredite em algo, mesmo que isso signifique sacrificar tudo”.

Semana passada, a Justiça americana aceitou o processo iniciado por ele acusando a liga de conluio para bani-lo dos 32 times associados.

POSIÇÃO POLÍTICA

Durante esta terça-feira, consumidores irritados postaram fotos e vídeos queimando tênis e outros produtos da Nike para protestar contra o uso do jogador na campanha. Por outro lado, cresceram também as manifestações de apoio a Kaepernick e à marca. Atletas como os astros do basquete LeBron James e Kevin Durant falaram a favor do jogador.

Em entrevista ao site conservador Daily Caller, Trump criticou a campanha. “Talvez haja uma razão para eles fazerem isso”, afirmou. “Mas eu acredito que, enquanto enviam a mensagem, é uma mensagem horrível, e uma mensagem que não deveria ser enviada. Não há razão para isso.”

Ana Paula Tozzi, da AGR Consultores, acredita que a queda nas ações da Nike, que até sexta-feira passada registravam alta de 31% no ano, é temporária.

— Nos 30 anos do “Just do it”, era preciso mostrar ousadia. A Nike assume o risco de adotar como garoto-propaganda um atleta polêmico, mas que defende uma causa do bem. A marca se recuperou de escândalos difíceis no passado e aprendeu muito com isso. É polêmica com causa e, pela primeira vez, com posição política.

A tomada de posição da Nike e as reações extremas à campanha, avalia Guilherme Borges, professor de Comunicação da ESPM-Rio, estão inseridas no cenário de polarização política atual:

— A Nike fincou pé na temática racial, que é cara para os americanos. Ao tomar uma posição política, tende a avançar em direção ao que o mercado e o consumidor esperam das marcas hoje. Ao defender que se faça aquilo em que se acredita, aproxima-se principalmente dos jovens.

PATROCÍNIO RENOVADO

Tão robustos quanto a polêmica são os negócios que estão por trás da campanha. A Nike renovou o patrocínio a Kaepernick e vai lançar uma linha de produtos com o nome do jogador. Nas prateleiras, ele já se prova um ícone. Em 2017, a camiseta oficial do jogador pelo San Francisco 49ers foi a 39ª mais vendida e a única de um atleta fora da liga a entrar no ranking das 50 mais comercializadas. Além disso, a Nike vai fazer uma doação relevante ao projeto “Conheça seus direitos”, mantido por Kaepernick.

Em março, a NFL e a Nike já tinham anunciado que o contrato atual para fornecimento do uniforme e de equipamentos aos 32 times da liga, que vence em 2020, será renovado por mais oito anos.