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Brasil Educação Brasília

Inep negou-se a aplicar novo teste do MEC que medirá fluência na leitura

Instituto lembra que já aplica provas ao mesmo público do novo teste; estudo custará R$ 20 milhões
Weintraub lançou programa de alfabetização Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Weintraub lançou programa de alfabetização Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

BRASÍLIA - Autarquia do Ministério da Educação (MEC) responsável pela avaliação educacional do país, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira ( Inep ) negou-se a aplicar o teste de alfabetização lançado nesta terça-feira pela pasta, que pretende analisar a fluência em leitura de estudantes do 2° ano do ensino fundamental .

Segundo o instituto, políticas elaboradas nesse sentido, com apoio de aplicativos de aferição em leitura e outros meios, podem ser conduzidas adequadamente pela Secretaria de Alfabetização (Sealf) do MEC "desde que não sejam concebidas e entendidas como avaliação educacional em larga escala". A iniciativa custará aos cofres públicos R$ 20 milhões e tem como público-alvo estimado dois milhões de alunos.

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A negativa do Inep, com o alerta de que o teste não pode ser considerado uma "avaliação educacional de larga escala", consta em nota técnica obtida pelo GLOBO. O parecer interno é da Diretoria de Avaliação da Educação Básica (Daeb) do instituto, responsável por testes importantes como o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), utilizado para calcular o Ideb, principal indicador de qualidade do ensino básico no país, e o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

O documento foi produzido em janeiro deste ano para responder a um pedido da Secretaria de Alfabetização do MEC, comandada por Carlos Nadalim, seguidor do ideólogo Olavo de Carvalho e único remanescente da equipe do ex-ministro Ricardo Vélez Rodríguez na pasta. Nadalim queria que o Inep contratasse uma empresa para aplicar a "avaliação de fluência em leitura" a alunos em fase de alfabetização. Com a negativa do órgão, o MEC assumiu a execução do teste, marcado para o fim deste ano, e o rebatizou de "Estudo Nacional de Fluência" — tirando a marca oficial de "avaliação".

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No documento em que afirma não poder fazer o novo teste, o Inep sinaliza possível sobreposição de funções, ao lembrar que "já realiza no âmbito do Saeb avaliação da alfabetização no 2º do ensino fundamental, aliada aos parâmetros da Base Nacional Comum Curricular". Destaca ainda que as provas do Saeb "atendem a uma série de etapas já implementadas e consolidadas", enumerando seis parâmetros seguidos, desde a "definição da matriz de referência da avaliação" até a "divulgação dos resultados".

O Inep conclui que a demanda da Secretaria de Alfabetização do MEC contraria as competências institucionais do órgão, que se situam nas atividades de "concepção, elaboração, validação e consolidação das avaliações sob sua responsabilidade". Diz que a tarefa, portanto, é do MEC e se coloca disponível para contribuir com documentos técnicos de avaliações realizadas pelo instituto, citando especificamente a prova de alfabetização aplicada a alunos do 2º ano do ensino fundamental no âmbito do Saeb.

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Os recursos previstos para a avaliação inicialmente totalizavam R$ 50 milhões, mas caíram para R$ 20 milhões. O Inep havia alertado, em documento anterior de análise meramente orçamentária, que não havia verba prevista no instituto para o novo teste. De volta ao âmbito do MEC, a avaliação foi redimensionada, ficando definido que se destinará às redes de ensino que aderirem ao programa federal "Tempo de Aprender", anunciado pelo governo na terça-feira para melhorar a alfabetização no país.

Segundo documentos internos, o novo teste será aplicado por meio de um aplicativo que grava a leitura. A gravação é enviada, então, para a entidade que realizará a correção da avaliação. Outros meios poderão ser usados, como prova escrita. Mas a pasta, questionada, não deu detalhes sobre os métodos que serão usados.

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Não há qualquer menção à Base Nacional Comum Curricular nas ações divulgadas pelo MEC que integram o programa "Tempo de Aprender", incluindo o teste de alfabetização. A ausência da Base como referência é uma das críticas levantadas por especialistas e gestores em educação. Nadalim afirmou reiteradamente, ao apresentar oficialmente o programa, que tudo está baseado em "evidências científicas".

Ele é mestre em educação e aparece em vídeos falando sobre método de alfabetização que aplicava em uma pequena escola de sua família, em Londrina, chamada Mundo do Balão Mágico. O colégio recebeu o prêmio Darcy Ribeiro de Educação, dado pela Câmara dos Deputados a experiências inovadoras, após uma campanha do deputado Diego Garcia (Pode-RR), defensor do "Escola sem Partido".

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Questionado sobre a análise do Inep em relação ao teste, a forma como será executado e o montante do gasto de R$ 20 milhões, o Ministério da Educação se limitou a informar, em nota, que "o Estudo Nacional de Fluência será conduzido pela pasta por meio de uma contratação específica via licitação" e que "os custos do programa são calculados de acordo com o número de matrículas".

A pasta afirmou ainda que "os objetivos do programa seguem a Base Nacional Comum Curricular e a Política Nacional de Alfabetização", ao ser perguntada sobre a ausência da BNCC na divulgação do teste e demais ações relacionadas ao "Tempo de Aprender". O ministério não respondeu sobre a utilização de aplicativo e outros meios na avaliação nem comentou a posição do Inep sobre o teste. O Inep também foi procurado, mas não se manifestou.