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Fernanda Young

Carta para a escritora Fernanda Young, com perguntas

Fernanda Young

Não me conformo - isso de morrer sufocada é o quê, Fernanda Young? Você pegou aquela terça-feira horrível aí em São Paulo, quando as queimadas trouxeram a noite, às 15 horas? Aquela tarde de poluição, veneno e fogo? Queria saber para tentar fazer qualquer tipo de relação menos dolorida que esta, de morrer sufocada. Morrer sem ar, sem conseguir respirar.

Foi, assim, uma forma de rebelião? Fernanda, acabo de ler a sua coluna em “O Globo”. Sim, a sua última coluna. Foi uma tosse profunda, né? Uma daquelas que o catarro, agarrado lá atrás da garganta, não sai. Os cafonas e a vulgaridade, a deselegância, a ignorância – e mentira como tática. Todos nós sabemos a quem você se refere; a quais pessoas você se refere, a quem você detesta – porque todos nós detestamos igual. Mas assim, Fernanda, me diga (não me esculache, eu sei que você não vai dizer) – sem ar? Sem conseguir respirar? 

Agora é minha vez de respirar fundo, bem fundo, me endireitar na cadeira e lembrar das muitas vezes que nos falamos, dos muitos debates que fizemos juntos – “quando meus livros saem da prateleira e vão para a boca” – você me disse uma vez sobre o “Sempre um Papo”. Nunca esqueci isso. Nem a viagem louca para o Acre, depois Rondônia, aquela noite em Brasília (Rafael me mandou várias fotos, agora). 

E me lembro também da frase que melhor a define: “Eu não sou intelectual, escrevo com o corpo”, de Clarice Lispector. Vejo seu corpo estampado em fotos e mais fotos no Instagram. Corpo no qual as muitas tatoos eram uma forma de expressão. Artista multimídia, multitudo, a televisão, o teatro a internet, as redes sociais faziam parte da sua cosmovisão criativa, lúdica e, principalmente, bem humorada.  Mas era na literatura que você encontrava a melhor performance. Escrever era o seu maior enfrentamento – e o seu melhor diálogo com o mundo. 

Digo assim, então, em letras garrafais: morreu Fernanda Young, uma escritora. Que agora, finalmente respira, para sempre.

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